Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
Papa Francisco cogita ida à China em visita ao Cazaquistão | ANSA
*Artigo
de Mirticeli Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das
poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa
da Santa Sé
‘Não foi a primeira vez que um papa colocou os pés no
Cazaquistão. João Paulo II foi para lá em 2011, dias após os atentados de 11 de
setembro. Coincidência ou não, os pontífices visitaram o país em momentos
cruciais.
Francisco, que concluiu sua visita apostólica a
Nur-Sultan na última quinta-feira (15), proferiu mensagens importantes sobre o
papel da religião na gestão de conflitos, além de renovar o apelo contra toda
forma de fundamentalismo religioso e instrumentalização política da fé.
A ida do santo padre à terra dos cazaques foi
articulada por causa do congresso dos chefes das religiões mundiais e
tradicionais, que foi sediado na capital do país. O evento quase se tornou
palco de mais um encontro histórico entre o pontífice e o patriarca Krill,
chefe da Igreja Ortodoxa Russa. Mas o religioso de Moscou cancelou sua ida de
última hora. Mesmo assim, a visita, por si só, foi estratégica para a Santa Sé.
O território faz fronteira tanto com a Rússia quanto
com a China, dois países que estão na mira do Estado Pontifício por razões
óbvias.
Francisco já expressou o desejo de visitar a Rússia
para mediar o fim da guerra. E também nutre a esperança de ir à Terra do Dragão
para atuar como promotor da liberdade religiosa, haja vista que milhões de
católicos (bem como protestantes e outras minorias religiosas), mesmo após as
tentativas de reaproximação entre Santa Sé e Pequim, continuam sendo
perseguidos. Caso isso se concretize, será o primeiro líder da Igreja Católica
a fazê-lo. Os dois Estados cortaram relações em 1951, logo após a expulsão do
embaixador vaticano do país, que aconteceu após a ascensão de Mao Tse-Tung.
Francisco, que é jesuíta, se obtiver sucesso nessa
empreitada, evocará um episódio que marcou a história da sua congregação. Foram
eles, os membros da ordem fundada por Santo Inácio de Loyola, que conseguiram,
a duras penas, penetrar no território chinês no século XVI, após tentativas
fracassadas de outros missionários católicos em épocas anteriores.
O governo do Papa Francisco, nesta questão, já acumula
avanços discretos. O acordo com a China para a nomeação conjunta de bispos, por
exemplo, é tido como uma vitória pela diplomacia vaticana.
Desde o pontificado de João Paulo II já se ensaiava
uma tratativa desse porte. Sem contar que Francisco foi o primeiro Papa da
história a conseguir autorização para sobrevoar o espaço aéreo chinês quando se
deslocou de Roma para a Coréia do Sul em 2014. João Paulo II, quando fez o
mesmo trajeto, em 1989, teve que fazer um desvio. Uma demonstração de que o ‘estilo
franciscano’ tem conseguido quebrar o gelo de alguma forma. Escalar essa ‘grande
muralha’ é para poucos. Mas o líder religioso que conseguir, certamente não
beneficiará somente os católicos.
A brecha que se abriu, embora pareça contraditória aos
olhos do público leigo, é vista com entusiasmo pelo Vaticano porque o regime
comunista considera a interferência pontifícia uma ameaça à soberania nacional.
Lembrando que, nesse sistema de governo, a religião também se submete ao
Estado. A grosso modo, dar autonomia jurídica à Igreja Católica, a única
religião cristã do mundo que é amparada por um estado independente, significa
conceder a um chefe de Estado estrangeiro (no caso, o Papa) a autonomia para ‘mandar’
naqueles que estão sob sua jurisdição, ainda que isso aconteça só no campo
religioso.
É agora em setembro que Santa Sé e China decidirão se
o acordo, que está em fase de experimentação (ad experimentum), se mantém ou
não. Já imaginou se formos surpreendidos com o ‘combo’ da ampliação do acordo e
um anúncio de uma viagem apostólica do Papa à China? Seria sonhar demais. Ou
não, principalmente em tempos de Francisco...’
Fonte : *Artigo na íntegra
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