*Artigo do Padre António Rego,
Missionário Comboniano
‘Do futuro tudo se pode dizer. O tempo esconde sinuosidades,
surpresas, acontecimentos festivos e tragédias. Mas também desgastes,
desperdícios, arranha-céus e barracas, prémios Nobel, criminosos e heróis
desconhecidos. E nós, no escalão social e eclesial em que nos encontramos,
seguimos, segundo a nossa capacidade de rejuvenescer ou de nos conformarmos com
a mediocridade que nos pode oferecer um caminho com menos custos dentro daquele
que já nos custa percorrer.
Mas não vamos sós. Mesmo nos nossos cansaços temos quem vai ao
nosso lado, suba, recomece, crie, ressurja das cinzas, vença a fragilidade e o
pecado. E, por sermos cristãos e não deixarmos arrefecer a nossa entrega, temos
tempo e espaço para a invenção, a conversão e para escrevermos e dizermos sempre
algo de novo, para redescobrirmos o Evangelho cada dia, para nos levantarmos de
cada queda e olharmos para o lado oferecendo amparo, dando esperança, ajudando
a levantar tantos caídos que também nos ajudam nas nossas quedas. A ascese
cristã sempre nos estimula a mais um passo, a prosseguir a subida, sentir a luz
que vem de cima, fixar os olhos no Mestre que nos chama e deixar estrelas sobre
a estrada. Os nossos passos, as nossas palavras, o nosso exemplo, não caem em
terra seca, acordaram outros para subir, prosseguir, purificar, amparar,
anunciar.
Que bom seria se cada dia fosse o cumprimento simples deste
programa que parece complexo, mas reveste a nossa pele a ponto de já o
cumprirmos com naturalidade que faz parte da nossa essência.
Apetece-nos sempre perguntar : como se encaixa esta crônica
quase angélica na realidade que somos, na dualidade das palavras que usamos,
nos tempos mortos da nossa oração, nas quezílias que tantas vezes temperam as
nossas relações com os outros, nos tronos e altares que erguemos ao nosso ego,
no desprezo ou esquecimento que alimentamos pelos outros?
É nesta dualidade que vivemos, de santos e pecadores, apóstolos
e indiferentes, com momentos fortes de interioridade e tempos vazios e
inoperantes, gestos destemidos de dádiva e cobardias de egoísmo acumulado.
A tudo isto acresce que não estamos sós. Nem somos apenas dois
ou três. As nossas vidas passam-se em comunidade, comunidades múltiplas onde as
nossas subidas e quedas são gestos de multidão que professa a mesma fé, parte
do mesmo baptismo e está a caminho da mesma Luz, inspirada e animada pelo nosso
Mestre, que é a nossa referência constante. É nossa missão acolher e potenciar
as energias que ele nos concede e a comunidade que nos estimula e confirma. É
nesta direção que todos somos enviados, movendo, ensinando e aprendendo o
caminho sempre novo que o Mestre nos indica. Sem nunca perder de vista os
sinais dos tempos, a originalidade de cada época, os novos caminhos que sempre
se abrem, as surpresas que nos deixam aqueles que não fazem parte do nosso
itinerário, nem proclamam a vida com as nossas palavras, nem manifestam sinais
de fé. E, todavia, muito têm para nos ensinar por uma escrita única que Deus
deixou em cada ser humano. Para O anunciar, urge procurá-lo nestes circuitos tortuosos
e desconcertantes em que Deus se encontra onde menos se espera. É nossa missão
não apenas proclamá-lo, mas procurá-lo aí, insuspeitamente escondido no manto
espesso de cada tempo.’
Fonte :
* Artigo na íntegra http://www.alem-mar.org/cgi-bin/quickregister/scripts/redirect.cgi?redirect=EVEVuEkuyyhYCWqOHy
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