quarta-feira, 29 de novembro de 2017

'O inferno na Terra'

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Lev Chaim
jornalista e colunista


‘Nunca me esqueço o dia em que entrei abruptamente no escritório do meu pai, em casa, quando ele fazia a contabilidade dos pagamentos da fazenda. De um só fôlego, eu disse : - ‘Papai, não poder ir à matinê das 10 horas, dois domingos seguidos, fez da minha vida um inferno!’. Meu pai me olhou calmamente e disse : ‘O castigo aumenta para três domingos seguidos e exijo que vá fazer uma pesquisa na enciclopédia Britânica sobre a Segunda Guerra Mundial; talvez ai aprenda o que seja mesmo um inferno’. Tinha 10 anos de idade e fiquei curioso.
Hoje, lembrei-me do meu pai com saudades. Estava lendo vários artigos da imprensa europeia sobre a situação atual no Iêmen e quase todos eles classificaram a vida naquele país como ‘o inferno na Terra’. Dois anos de guerra, fome e uma epidemia de cólera. E segundo muitos, a situação ali é ainda pior do que na Síria e poucos notam a precária situação daquele país que já foi considerado pelo romanos ‘A Arábia Feliz’. Isto devido a suas terras férteis, em contraste com o resto da península Arábica. E foi ali, no século XI, que o famoso cafezinho foi inventado, pois este era um pais rico em plantações de café do tipo arábica.
A situação ali é vista pelos peritos como a mais dramática e miserável em todo o mundo. Ali, impera a fome e uma forte epidemia de cólera, cujas vítimas principais são as crianças, onde milhões delas estão desnutridas e não podem ir à escola porque elas fecharam. A total infraestrutura do país entrou em colapso. Da população de 28 milhões de iemenitas, 17 milhões não estão em estado de cuidarem de suas próprias famílias. E sete milhões de pessoas estão em situação de fome extrema. No momento, eles recebem a cada três semanas um caixa de alimentos das Nações Unidas.
Talvez vocês se perguntem : como tudo isto começou? Tudo teve inicio após ter falhado a famosa ‘Primavera Árabe’, em 2011. Como em outros países árabes, a população foi às ruas para pedir mais democracia. Eles obrigaram o presidente Ali Abdullah Saleh a deixar o poder após 21 anos no cargo. Depois de muito custo e influência externa, o Iêmen empossa o novo presidente, Abed Rabbu Mansour Hadi, com o apoio da Arábia Saudita e dos Estados Unidos. A população local xiita, não contente com o novo presidente, começou uma luta para derrubá-lo. O novo presidente tinha o apoio da minoria sunita do país e dos Estados Unidos e da Arábia Saudita. Com medo de que os xiitas pudessem retomar o poder no Iêmen e serem influenciados pelo Irã, país de maioria xiita, a Arábia Saudita iniciou um bombardeio do país que dura até hoje. E o mundo fecha os olhos, pois a Arábia Saudita é amiga do Ocidente e o Irã não.
Com tudo isto em jogo, sem contar a total falta de sensibilidade para com a situação do povo iemenita, a guerra no país segue em frente mas são poucas as manchetes nos jornais em todo o mundo. E como eu disse, com a infraestrutura do país toda desmantelada, a corrupção correndo solta, a fome matando, principalmente as crianças, e, agora, a epidemia de cólera se alastrando por todo o território iemenita, está longe daquela de imagem que um dia os romanos denominaram o Iêmen como a ‘A Arábia feliz’.  
Hoje, mais do que nunca, senti saudades do meu pai que me deu aquele castigo de 3 domingos seguidos sem a matinê das 10 horas da manhã, no Cine São Luís. A partir daquele dia, raivoso e curioso, fui pesquisar sobre a Segunda Guerra Mundial e  encontrei as notícias dos campos de concentração nazistas e de suas câmaras de gás, onde foram mortos 6 milhões de judeus, apenas porque eram judeus, e mais homossexuais e ciganos. Anos depois, li com mais cuidado sobre o assunto através de testemunhas vivas do ‘holocausto’, tal qual Elie Wiesel, Nobel da Paz, que descreveu em seus romances as atrocidades que ele presenciou nos campos de concentração nazistas.
Em seu romance ‘Noite’, Elie Wiesel, que faleceu há pouco tempo, conta que foi testemunha da morte de sua mãe e sua irmã nas câmaras de gás, assim que eles chegaram no campo de concentração. Mais tarde, transferidos de um local para outro, ele, o pai e muitos outros tiveram que caminhar e fazer todo o percurso a pé. Nesta caminhada, ele presenciou a morte do pai por total exaustão e fadiga. E no seu livro, ‘Todos os rios correm para o mar’, ele conta o seu casamento em Jerusalém e muito mais. Sua frase inicial foi esta : ‘Ontem à noite, em sonho, vi o meu pai.’
Por esta e por outras meus amigos, temos que tomar nossas posições na vida o mais cedo possível. Agradeço de coração ao meu pai que me deu aquele castigo e me obrigou a pesquisar sobre a Segunda Guerra Mundial. Desde então, sou contra os extremos, sejam eles de direita ou de esquerda. Sou contra as armas e contra a indústria armamentista que fomenta e financia guerras no mundo. Armas para mim são apenas para os profissionais : polícia e exército. ’

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