*Artigo
de Evaldo D´Assumpção,
médico
e escritor
‘Quando se conversa com um jovem sobre seus projetos para o
futuro, é comum ouvir dele que seu sonho é ter uma profissão bem rentável,
proporcionando-lhe recursos que lhe dê vida farta e confortável. Bem, é verdade
que nem sempre a resposta é tão direta assim, todavia nas linhas e entrelinhas
o que, com facilidade se deduz, é esta obviedade de seus anseios. Ter dinheiro,
muito dinheiro, é a síntese dos sonhos de muitos jovens e adultos.
Permitindo-me um pequeno deslize para lugar comum, nos dias
atuais os ocupantes de cargos políticos são, talvez com raríssimas exceções,
exemplos típicos dos caçadores de tesouros, cujo objetivo máxime é exatamente
este : grandes fortunas. Disputam cargos eletivos sem qualquer motivação
altruística, pouco se importando com a fome e a miséria dos que os cercam,
muitos deles seus futuros eleitores. Estão com os olhos dilatados em busca de
polpudos ganhos, não importando a forma, a origem, nem as retribuições que por
eles terão de dar. Há muito ouvi de um familiar, já falecido, e na época
bastante envolvido com a política, que a única coisa importante na vida é o
dinheiro. Afirmava, com insistência e convicção, que o dinheiro é a força única
que move o mundo. E por dinheiro, muitos fazem qualquer coisa, sem qualquer
escrúpulo. Vendem seu corpo, sua alma, sua dignidade, sua família e, se preciso
for, matam pessoas, mesmo sendo pais, irmãos, parentes e amigos, bastando para
isso que eles obstaculizem os seus ambicionados projetos de polpudos ganhos. Na
verdade, o fazem até mesmo por modestos estipêndios...
Contudo, hoje tenho absoluta convicção de que o dinheiro não é o
objetivo final dessas pessoas. Se assim fosse, ao chegar a um certo teto –
digamos, bastante elevado – certamente parariam com sua fúria conquistadora
para poder desfrutar, da melhor maneira possível, dos milhões arrecadados, sem
outras preocupações. Mas, observando bem, elas não se contentam com teto algum.
Algumas, nem sequer usufruem das benesses proporcionadas pelas grandes fortunas
amealhadas. Querem mais, sempre mais, muito mais do que lhes será possível
gastar, por mais perdulários que sejam, por mais longa que imaginem suas vidas.
Basta observar as cifras levantadas por esta avalanche moralista que está sendo
a ‘Operação Lava jato’. Montantes de
dinheiro que nem sequer ousávamos pensar existir em qualquer corporação, são
abocanhadas insaciavelmente por deputados, senadores, seus asseclas e outros
ocupantes de cargos públicos. Tudo à custa de manobras sujas, das quais sequer
se envergonham quando desveladas as suas safadezas, e são conduzidos
coercivamente por policiais federais fortemente armados. Basta observar o
cinismo com que os seguem. Como explicar então essa ganância? Respondo que é
pelo verdadeiro objetivo final de sua fome insaciável : o poder. O que
realmente almejam é o poder, e este não tem limites. Para conseguir todo o
poder que desejam, em níveis insanamente sonhados, somente através do dinheiro,
muito dinheiro. Daí a sua necessidade, sempre crescente, de arrecadar mais e
mais, permitindo-lhes comprar pessoas, cargos, e tudo o mais que representa ou
que lhes possa proporcionar o poder com que sonham.
Vem então uma pergunta crucial : para que se quer, ou se precisa
de tanto poder? Pesquisando a história descobrimos que nenhuma pessoa, mesmo
conquistando poderes em níveis inimagináveis, logrou alcançar a felicidade,
esta sim o desejo oculto no fundo dos corações e mentes de todos os humanos.
Para quem goza de poder extremo, extremos também são os riscos que corre. Sua
vida é uma constante caminhada em corda bamba, equilibrando-se no tênue fio da
navalha, sem poder nem conseguir viver plenamente a vida. Seus prazeres são
fugazes, sempre com o sabor amargo da insegurança que os cerca e que fingem
ignorar. Vaidosos e arrogantes, vivem enquistados num mundo de iguais, com os
quais compete e por vezes são por eles traídos. Afinal, a luta pelo pódio não
tem quartel nem condescendência. Tudo é válido para sobrepujar o outro, ou para
se livrar das perdas que lhes acontecem. Exemplos evidentes eram as lutas de
gângsteres nos anos 30, e são as dos grupos de traficantes nos dias atuais;
entre os coronéis da política no passado e a larga safra de políticos
desnudados pela ‘Lava jato’ na
atualidade. A delação premiada é hoje a arma de dois gumes para tentar se
safar, ao mesmo tempo em que destroem os concorrentes. Cabeças raspadas,
tornozeleiras eletrônicas, escolta da Federal, apontam os poderosos em
declínio.
Curiosamente, o símbolo do poder total é Deus. Não é sem razão o
que dizem dos poderosos : ‘Eles se julgam
deuses!’ Mas poucos têm a consciência de que Deus, aquele que É, não tem,
não precisa, nem quer poder algum. Se assim fosse, seríamos todos marionetes
sem vontade própria, manipulados por um ser todo poderoso. Quem tem poder
sempre quer dominar os mais fracos, exercendo sobre eles a força que acreditam
possuir, ampliando seus próprios benefícios, espoliando os dominados,
insensíveis às suas penúrias e aos seus sofrimentos.
Deus, na sua imensidade infinita, jamais precisou nem buscou
dominar ninguém, pois se assim fosse ele não seria amado, e sim temido.
Condição incompatível com a perfeição de um Ser supremo. Nós é que distorcemos
o que desconhecemos, como o frequentemente referido ‘temor de Deus’, usado para amedrontar e ameaçar os crentes mais
ingênuos. O sentido real dessa expressão é o profundo respeito que devemos ter
à Deus, resultado do máximo amor que lhe temos, em retribuição ao amor infinito
que Ele nos dedica. Assim como o temor dos pais e mestres, hoje tão fora de
moda, nunca deve ser o medo, mas o respeito indispensável a quem devemos tanto,
se não tudo. Onde existe verdadeiro amor, certamente o poder jamais encontra
lugar ou guarita.’
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