*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo
Metropolitano de Belo Horizonte, MG
‘A credibilidade
perde espaço no mundo contemporâneo em razão do enfraquecimento da palavra.
Este é um tempo de ‘palavra fraca’ e
os impactos negativos dessa situação têm incidência nos diferentes âmbitos.
Diz-se que é, mas não é. Promete-se e não se cumpre. Definem-se prazos que não
são respeitados. Garante-se que foi e não foi. Afirma-se desconhecer, mas
conhece intimamente. Compromete-se em ir e não vai. Ensina e não se abre à
aprendizagem. Elogia com falsidade. Passa a ideia de convicção sem, de fato, ter
certeza. Fala uma coisa e é outra. Refere-se a preceitos morais e não os
cumpre. Jura que não fez, mas continua fazendo. Usa a palavra para camuflar o
que deve ser revelado. E assim, constata-se uma interminável ladainha que
fragiliza a palavra. Desconsidera-se que
a palavra é, por si, uma força que cria e recria.
É inconsistente o
dito popular : ‘palavras são apenas
palavras e nada mais’. Recorde-se o Salmo 33 que sublinha a força da
palavra, quando se canta que pela palavra de Deus foram feitos os céus, pelo
sopro de sua boca todos os seus exércitos.
E em Jesus Cristo, o filho de Deus Pai, a Palavra se fez carne e veio
morar entre nós. Vale ler e reler as
narrativas iniciais dos primeiros capítulos do Livro do Gênesis, 1-3, e
compreender o sentido, o alcance e a força da palavra : ‘Faça-se!’.
Pela palavra, até mesmo no silêncio,
Deus fala e vem ao encontro de cada pessoa. A palavra tece os diálogos,
fazendo-os autênticos e construtivos quando a sua força se manifesta, não pela
imposição, mas a partir da transparência e da verdade. Há de se constatar que o
falar não é qualquer coisa. A palavra é essencial na construção da vida
pessoal, na edificação da sociedade e na busca por novos horizontes. Assim, a palavra, para edificar vínculos
duradouros na verdade e no amor, em vista da justiça e da paz, não dispensa
sinceridade, transparência, honestidade e o compromisso com o bem comum. É
incontestável que a sociedade contemporânea precisa avançar na recuperação do
sentido da palavra, para que por sua força possam ser sanadas as consequências
das incompreensões, distorções, equívocos que têm como parâmetro a mesquinhez.
Esses males conduzem o mundo rumo a fracassos, incompetências institucionais,
familiares, governamentais e religiosas.
Embora a
contemporaneidade seja tão marcada por grandes avanços tecnológicos, que
incluem as redes intermináveis para a transmissão das palavras, em velocidades
surpreendentes, ainda é tempo de se aprender a falar. Esse é um investimento
indispensável no alicerce básico da consciência humana, que abrange a
individualidade e a clareza de pertencimento comunitário e familiar. Deus, em diálogo com cada pessoa – porque Ele
fala – estabelece uma dinâmica que leva a esse necessário aprendizado, cultivando
nos corações o gosto de ser sincero, bom, lúcido e capaz de agir como
instrumento da paz.
O segredo,
portanto, é dar centralidade e primado à Palavra de Deus. Ao escutar a Palavra, cada pessoa abre-se à
verdade, aprende as lições do amor, capacita-se para ser justo. Mais que outras escutas, é essencial ouvir a
Palavra de Deus que também revela, inevitavelmente, a dramática possibilidade
de o homem subtrair-se a esse diálogo de aliança com Deus. O resultado nefasto
é a expansão de domínios perversos no coração.
Proclamar a
Palavra é investir no cumprimento da tarefa dada pelo Mestre Jesus, a Palavra
encarnada. Cristo quer o Povo de Deus congregado em uma ‘Igreja em saída’,
missionária, próxima de todos, presente especialmente nos lugares mais pobres e
sofridos, em diálogo com a sociedade. Uma Igreja que ajude a confeccionar o
tecido da cultura solidária e da vida.
Nenhuma outra
palavra tem a força da Palavra de Deus, capaz de renovar a Igreja, as pessoas e
reconstruir a sociedade contemporânea tão marcada pelo cansaço, fracasso e pelas
banalizações. Proclamar a Palavra é o compromisso primeiro, entre muitos
outros, assumido pela Arquidiocese de Belo Horizonte, como Igreja no mundo e a
serviço do Povo. É seu Projeto de Evangelização, para que surja o novo pela
força da Palavra de Deus, iluminando as palavras de cada cidadão.’
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