4. OS EFEITOS DO CONCÍLIO VATICANO II
NA LITURGIA DA IGREJA CATÓLICA
Paulo VI |
A Reforma Litúrgica (de 1963 a 1990 )
A reforma litúrgica, decorrente do movimento litúrgico, foi o resultado mais notório deste Concílio.
Com a promulgação da constituição ‘Sacrosanctum concilium’, que reproduz e amplia a ‘Mediator Dei’, exatamente 400 anos após o fim do Concílio de Trento (04.12.1563 – 04.12.1963), testemunhamos um colegiado ocupando-se do tópico liturgia pela primeira vez na caminhada histórica da Igreja perante uma assembléia ecumênica.
O propósito do Concílio Vaticano II era:
W ‘Fomentar a vida cristã entre os fiéis’
W ‘Adaptar melhor às necessidades do nosso tempo as instituições susceptíveis de mudança’
W ‘Promover tudo o que pode ajudar à união de todos os crentes em Cristo’ e
W ‘Fortalecer o que pode contribuir para chamar a todos ao seio da Igreja’
E a finalidade da reforma era avivar a fé, proporcionar a justa medida entre tradição e adequações necessárias na liturgia – sem limitar-se a ritos, cerimônias e textos – e incentivar a participação ativa do fiel leigo. Sua importância foi inexorável para distinguirmos a liturgia como a luz primordial do ser cristão e o povo de Deus como o indivíduo da ação litúrgica. Impulsionou, ainda, a centralização da Palavra de Deus na liturgia e o reconhecimento das Igrejas locais.
Embora a reforma tenha sido relativamente bem aceita na Igreja de Rito Romano, ela não foi de todo compreendida, expondo atitudes equivocadas e contraditórias.
Vale destacar que a reforma litúrgica não ocorreu sozinha, apartada de outros grupos. Na verdade, a atuação foi de maneira integrada ao movimento bíblico, ao ecumênico, às frentes missionárias, à pesquisa das várias religiões e à averiguação do elo entre a religião e as necessidades humanas antes e após o Concílio. Acima de tudo, a reforma litúrgica estabeleceu um legado vigoroso :
W Ampliou a vivência cristã ao incentivar a participação deliberada e ativa do fiel na liturgia
W Aumentou o sentido comunitário da vida litúrgica
W Sancionou o uso da língua vernácula
W Prestigiou o enriquecimento doutrinal e catequético
W Incentivou a leitura bíblica
W Adequou as instituições eclesiais ao contemporâneo
W Estimulou o ecumenismo pela união dos cristãos
W Recomendou a participação de todos na missão da Igreja
W Simplificou e permitiu a transparência na brevidade dos ritos
Contudo, passados os primeiros anos da promulgação conciliar, era nítido que a liturgia atravessava momentos difíceis. Da exaltação inicial, ávidos por granjear resultados apressadamente, migrou-se para a desilusão.
Alguns problemas não estavam previstos com clareza no Concílio. Por exemplo : as atenções estiveram focadas na liturgia em si e não no sacerdote; priorizaram a renovação de livros litúrgicos e não a reciclagem das assembléias celebrantes; assim como o problema da inculturação ou adaptação da liturgia às diversas culturas.
Diferentes fases permearam estes anos:
Fase do Entusiasmo
A década de 60, num geral, foi assinalada pela expectativa de aplicação da reforma :
ü liturgia elaborada na língua pátria (ou vernácula)
ü maior relevância às Conferências Episcopais
ü reabilitação da concelebração e da comunhão sob as duas espécies
ü sintetização do Ofício Divino
ü impulso às frentes missionárias
ü ênfase no mistério pascal, isto é, na paixão, morte, ressurreição e ascensão de Cristo
ü fiel participativo
ü exaltação do culto
Fase do Desencanto
Na década de 70, o desapontamento era reflexo de uma renovação de cunho raso e que, talvez, não estivesse preparada para imersões mais profundas. A partir daí, a preocupação pastoral recorreu à evangelização ao entender que a liturgia não solucionava todas as questões de base :
ü surgem novos livros litúrgicos
ü a consolidação das celebrações
ü a abertura da Igreja para a dimensão social reflete-se na liturgia
ü propagação veloz da secularização na sociedade
ü a deficiente formação litúrgica nos seminários
ü a insuficiente reciclagem oferecida ao clero e
ü sacerdotes em conflito
Fase da Recuperação
A reorientação litúrgica, na década de 80, reacendeu pesquisas e proporciou um novo estilo de celebração:
ü pesquisa sobre a situação da vida litúrgica no Brasil (1983) e ampla avaliação das Diretrizes Gerais da Ação Pastoral da CNBB (1987)
ü a reciprocidade celebração-evangelização tornou-se mais dinâmica e conciliatória
Fase da Pastorial Litúrgica
Na década de 90, notabiliza-se a pastoral litúrgica e um renovado empenho pela Palavra de Deus:
ü edição de novos Lecionários
ü reconhecimento e uma certa apreciação da Liturgia das Horas e
ü a prática do silêncio na oração
A Espiritualidade Litúrgica (de 1990 em diante)
Espiritualidade é ‘a vida do cristão movida pelo Espírito’ e Espiritualidade litúrgica ‘faz da liturgia (Eucaristia, Sacramentos e Ofício Divino) o grande referencial da vida do cristão’, conforme Dom Estevão Bettencourt, do mosteiro do Rio de Janeiro. A espiritualidade litúrgica não elimina ‘as respostas pessoais do cristão à graça de Deus ou às devoções particulares’. Porém, inexiste para muitos fiéis pela falta de uma formação ou catequese adequada.
Características :
ü Sentir (pulsar) com a Igreja
o O lema ‘Sentire cum Ecclesia’, isto é, pensar e viver com a Igreja, divulgado no princípio da restauração litúrgica, conscientiza o fiel de que, para ser Igreja, tem que se alimentar da Palavra de Deus.
ü A leitura eclesial da Bíblia
o ‘Para entende-la é preciso interpretá-la sob o impulso do Espírito que a inspirou’ (Cons. Dei Verbum nr. 12).
ü Formação doutrinária
o Através da Bíblia e da tradição oral, a liturgia e a fé relacionam-se de acordo com a máxima dos antigos: lex orandi lex credendi (‘o conteúdo da oração deve condizer ao conteúdo da fé’)
ü A Eucaristia e os sacramentos
o Ser cristão é pertencer a um Corpo cuja Cabeça é Cristo e o tronco é Jesus. O embasamento no Corpo ou no tronco se faz primeiro pelo Batismo, é confirmado pela Crisma e nutrido periodicamente pela Eucaristia.
ü Sacramentais
o São os ritos (bênçãos) ou objetos (rosário, crucifixos, etc...) pelos quais Deus difunde suas graças. Por exemplo : a Liturgia das Horas, ou Ofício Divino, expressa a oração da Igreja para as várias fases do dia e a santificação do tempo.
ü As devoções ou a piedade particular
o Piedade objetiva (litúrgica) e piedade subjetiva (particular) não se opõem; mas a Igreja interpela para que o cristão tenha um elo doutrinário entre a liturgia e a oração individual.
ü Sacerdócio comum dos fiéis
o Segundo a doutrina da Igreja, todos os batizados participam do sacerdócio de Cristo, sem confundir com o sacerdócio ministerial, que é um sacramento da Ordem.
ü Arte Litúrgica
o Sendo um dos modos de representar o inefável ou invisível, está vinculada à liturgia, porém, a arte na Igreja ‘é um meio e não um fim e que o artista entenda o porquê e o para quê de cada objeto de arte, no contexto do templo sagrado’.
5. CONCLUSÃO
Da liturgia para a vida cotidiana
O Vaticano II sumarizou todas as ânsias do movimento litúrgico, ultrapassando preconceitos sem fundamento e o fiel transcendeu da liturgia para a vida, propagando no mundo essa transformação, que é obra do Espírito Santo.
A liturgia é o meio que Deus nos concede para falar com Ele, por isto, ela não se esgota na celebração, mas existe um antes e um depois que devem ser cuidados ponderadamente : ‘a celebração litúrgica incorpora-nos na igreja de hoje e projeta-nos para o amanhã, num progresso contínuo, porque o Espírito que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos está presente na Igreja e acompanha-a através dos séculos’.
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