Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
A Catedral Santa Sofia (dedicada à Sabedoria de Deus) na moderna Istambul. As antigas fundações da catedral parecem datar do século IV.
*Artigo da Irmã Christine Schenk, CSJ
‘O
século IV começou com uma dura perseguição contra os cristãos,
sobretudo no Oriente. Depois de ter abraçado o Deus cristão e após uma longa
luta pelo poder, Constantino tornou-se imperador em 324 D.C.. Nessa época a
Igreja ascendeu a níveis de poder e influência terrena sem precedentes, graças
ao favor imperial de Constantino, dos seus filhos e da sua mãe, Helena. Os
homens da Igreja recebem generosos benefícios de mulheres cristãs
aristocráticas, como Olímpia, Melânia a Velha, Melânia a Jovem e Paula. As
comunidades cristãs que até então se reuniam em grandes casas passam a
encontrar-se em luxuosos locais públicos. Estas mudanças exacerbam as tensões
sobre o ministério público das mulheres cristãs.
Como
o papel das mulheres na Igreja está mudando
O
século IV viu também surgir uma perigosa tendência para assimilar,
ainda que simbolicamente, o gênero feminino à heresia, apesar de tanto os
homens como as mulheres cristãos estarem envolvidos nas mais diversas
interpretações do cristianismo, chegando até a ser definidas como hereges.
Mas sobretudo as mulheres correm o risco de serem qualificadas de hereges e
suspeitas de impudência quando assumem o papel de mestras. É neste
contexto eclesial que as ‘Madres da Igreja’ do século IV vivem e dão
testemunho da sua fé. Segue-se uma breve mas significativa cronologia das suas
vidas e do modo como elas — e as suas comunidades — exerceram a autoridade
eclesial na Igreja primitiva.
Textos
escritos por mulheres
A
informação literária sobre mulheres do século IV, como Marcela, Paula,
Macrina, Melânia a Velha e Olímpia, chega-nos sobretudo através de homens de
Igreja eruditos como Jerónimo, Gregório de Nissa, Paládio e João Crisóstomo.
Temos dois textos escritos por mulheres : Proba e Egéria. Proba adapta em prosa
um centão de Virgílio, muito apreciado em Roma, para contar a história do
cristianismo com o objetivo de evangelizar jovens aristocráticas, criando um
instrumento culturalmente transversal que influenciará homens e mulheres
cristãos durante gerações. Egéria, por seu lado, escreve um diário de viagem
para as suas irmãs, ilustrando o seu itinerário pelos lugares santos do
Oriente. Durante esta viagem, escreve Egéria, numa certa altura encontra a sua ‘querida
amiga, a santa diaconisa Marthana’, que governa um mosteiro duplo perto do
santuário de Santa Tecla (na Turquia). Marthana é um exemplo raro de diácono-mulher
que exerce autoridade sobre homens e mulheres cristãos.
Embora
o nascimento do monaquismo seja frequentemente atribuído a Basílio no Oriente,
e a Jeronimo no Ocidente, duas mulheres — Macrina e Marcela — começaram a
praticar este estilo de vida cristão muito antes dos homens.
Macrina (327-379)
fundou um mosteiro em Anisa, na Ásia Menor, que se tornou o protótipo da regra
monástica escrita pelo seu irmão Basílio. Se Basílio é mais tarde chamado o ‘pai
do monaquismo’, Macrina é certamente a sua mãe. A sua autoridade como guia
espiritual influenciou profundamente os seus irmãos Basílio e Gregório, ambos
teólogos, que viriam a elaborar a doutrina da Trindade.
Marcela (325-410) reúne
mulheres que estudam as Escrituras e rezam na sua vivenda aristocrática do
monte Aventino, 40 anos antes da chegada de Jeronimo a Roma. Quando Jeronimo
regressa a Jerusalém, os sacerdotes de Roma consultam Marcela para esclarecer
certas passagens dos textos bíblicos. Marcela intervém também nos debates públicos
sobre a controvérsia origenista.
Paula Romana (347-404) funda dois
mosteiros em Belém : um feminino e outro masculino. Confiou o mosteiro
masculino aos monges e foi aí que, graças ao seu apoio, Jeronimo completou a
tradução da Bíblia do grego para o latim. Jeronimo diz-nos que os conhecimentos
de Paula sobre a língua hebraica excediam os seus.
Melânia a Velha (350-410),
consegue que um importante homem da Igreja (Evágrio) retome o seu voto de
celibato; ensina e converte muitos homens. É fundamental na resolução de um
cisma que envolve 400 monges em Antioquia, ‘conquistando todos os hereges que
negam o Espírito Santo’. Financia e cofunda um mosteiro duplo no Monte das
Oliveiras, onde as suas comunidades se dedicam ao estudo das Escrituras, à
oração e a obras de caridade.
Olímpia (368-408).
Ordenada diaconisa em Constantinopla pelo bispo Nectário, Olímpia utilizou a
imensa fortuna da sua família para apoiar a Igreja e servir os pobres. Fundou
um grande mosteiro perto da Basílica de Santa Sofia, onde três das suas
familiares foram também ordenadas diaconisas. Em breve, as mulheres das
famílias do Senado romano também se uniram a ela, e o número de monjas aumentou
para 250.
Estes
são apenas alguns exemplos de mulheres do século IV cujas comunidades
são precursoras da vida religiosa atual. O seu testemunho e a sua autoridade
eclesial influenciaram fortemente as comunidades cristãs do seu tempo, mas
também dos tempos que se seguiram. Numa época em que alguns homens da Igreja
proibiam as mulheres de falar ou ensinar publicamente e preferiam que elas
ficassem em casa, há provas de que, no século IV , algumas mulheres
cristãs exerciam autoridade, falavam sobre questões eclesiais importantes,
ensinavam mulheres e homens e davam livremente testemunho do Cristo ao qual
tinham escolhido unir-se.’
Fonte : *Artigo na íntegra
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