sábado, 4 de junho de 2022

Início da missão profética

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre Johan Konings, SJ

 

1ª leitura : (At 2,1-11) O milagre das línguas –  Pentecostes é interpretado como acontecimento escatológico a partir da  profecia de Jl 3 (cf. At 2,16-21). Mas, sobretudo, é o cumprimento da  palavra do Cristo (Lc 24,49; At 1,4; cf. Jo 14,16-17.26). Passa como um vendaval ao ouvido, como fogo aos olhos; mas permanece como transformação do ‘pequeno rebanho’ em Igreja missionária. Também  hoje. A Igreja do Cristo se reconhece pelo espaço que ela dá ao Espírito  e pela capacidade de proclamar sua mensagem. * 2,1-4 cf. Mt 3,11; Lc  3,16; Jo 20,22; At 4,31.

2ª leitura : (1Cor 12,3b-7.12-13) Unidade do Espírito na diversidade dos dons –  ‘Jesus é o Senhor’ é a confissão que une a Igreja primeva (cf. Fl  2,9-11). E esta confissão só se consegue manter na força do Espírito.  Como a unidade da confissão, o Espírito dá também a multiformidade dos  serviços na Igreja. Todos que pertencem a Cristo são membros diversos do  mesmo Corpo. * 12,3 cf. Rm 10,9; Fl 2,11 * 12,7 cf. At 1,8; 1Cor  12,28-30; Rm 12,6-8; Ef 4,11-13 * 12,12-13 cf. Rm 12,4-5; Ef 4,4-6.

Evangelho : (Jo 20,19-23) Dom do Espírito pelo Cristo ressuscitado –  Celebramos a 6ª-feira Santa, Páscoa e Pentecostes em três dias  diferentes, mas a realidade é uma só : a ‘Exaltação’ de Cristo na Cruz e  na Glória, fonte do Espírito que ele nos dá. No próprio dia da Páscoa,  diz Jo, Jesus vem entregar este dom aos seus, com a sua paz e a missão  de tirar o pecado do mundo, missão de Jesus mesmo (cf. 1,29.35). O mundo  ressuscita com Cristo pelo Espírito dado à Igreja. * 20,19-20 cf. Lc  24,36-43; Jo 14,27; 15,11; 16,22 * 20,21-23 cf. Jo 17,18; Mt 28,19;  16,19; 18,18. 

Pentecostes  é a plenificação do Mistério pascal : a comunhão com o Ressuscitado só é  completa pelo dom do Espírito, que continua em nós a obra do Cristo e  sua presença gloriosa. A liturgia de hoje acentua a manifestação  histórica do Espírito no milagre de Pentecostes (1ª leitura) e nos carismas da Igreja (2ª leitura),  sinais da unidade e paz que o Cristo veio trazer. Isto, porque a  pregação dos apóstolos, anunciando o Ressuscitado, supera a divisão de  raças e línguas, e porque a diversidade de dons na Igreja serve para a  edificação do povo unido, o Corpo do qual Cristo é a cabeça. Ambos estes  temas podem alimentar a reflexão de hoje.

No antigo Israel,  Pentecostes era uma festa agrícola (primícias da safra, no hemisfério  setentrional). Mais tarde, foi relacionada com o evento salvífico  central da Aliança mosaica : ganhou o sentido de comemoração da  proclamação da Lei no monte Sinai. Tornou-se uma das três grandes festas  em que os judeus subiam em romaria a Jerusalém (as outras são Páscoa e  Tabernáculos). Foi nesta festa que aconteceu a ‘explosão’ do Espírito  Santo, a força que levou os apóstolos a tomarem a palavra e a  proclamarem, diante da multidão reunida de todos os cantos do judaísmo, o  anúncio (‘querigma’) de Jesus Cristo. Seria errado pensar que o  Espírito tivesse sido dado naquele momento pela primeira vez. O evangelho (de  João) nos ensina que Jesus comunicou o Espírito no próprio dia da  Páscoa. O Espírito está sempre aí. Mas foi no dia de Pentecostes que  esta realidade se manifestou ao mundo. Por isso, ele aparece em forma de línguas, operando o milagre das línguas e reparando a ‘confusão babilônica’.

O Espírito leva a proclamar os magnalia Dei em todas as línguas. O conteúdo desta proclamação, já o conhecemos dos  domingos anteriores : é o querigma da ressurreição de Jesus Cristo.  Novamente, o Sl 104[103] comenta este fato (salmo responsorial).

A 2ª leitura mostra, por assim dizer, a obra ‘intra-eclesial’ do Espírito : a  multiformidade dos dons, dentro do mesmo Espírito, como as múltiplas  funções em um mesmo corpo. Paulo chama isto de ‘carismas’, dons da graça  de Deus; pois sabemos muito bem que tal unidade na diversidade não é  algo que vem de nossa ambição pessoal (que, normalmente, só produz  divisão). É o Espírito do amor de Deus que tudo une.

No evangelho encontramos  a visão joanina da ‘exaltação’ de Jesus : é a realidade única de sua  morte, ressurreição e dom do Espírito, pois sua morte é a obra em que  Deus é glorificado, e seu lado aberto é a fonte do Espírito para os  fiéis (Jo 7,37-39; 19,31-37; cf. vigília). Assim, no próprio dia da  ressurreição, Jesus aparece aos seus para lhes comunicar a sua paz (cf.  14,27) e conceder o dom do Espírito, para tirar o pecado do mundo, ou  seja, para que eles continuem sua obra salvadora (cf. 1,29.35).

Este  Espírito do Senhor exaltado é o laço do amor divino que nos une, que  transforma o mundo em nova criação, sem mancha nem pecado, na qual todos  entendem a voz de Deus. É essa a mensagem da liturgia de hoje. O mundo é  renovado conforme a obra de Cristo, que nós, no seu Espírito, levamos  adiante. Neste sentido, é a festa da Igreja que nasceu do lado aberto do  Salvador e manifestou sua missão no dia de Pentecostes. Igreja que  nasce, não de organizações e instituições, mas da força graciosa  (‘carisma’) que Deus infunde no coração e nos lábios. A festa de hoje  nos ajuda a entender o que é renovação carismática : não uma avalanche de  fenômenos estranhos, mas o espírito do perdão e da unidade que ganha  força decisiva na Igreja. O Espírito Santo é a ‘alma’ da Igreja, o calor  de nossa fé e de nossa comunhão eclesial. A antiga sequênciaVeni Sancte Spiritus expressa isso maravilhosamente, e seria  bom pôr os fiéis, mediante canto ou recitação, novamente em contato com  esse rico texto.

A Igreja, por sua unidade no Espírito, no vínculo  da paz (Ef 4,3), torna-se sacramento (sinal operante), do perdão, da  unidade, da paz no mundo, na medida em que ela o coloca em contato com o  senhorio do Cristo pascal, no querigma e na práxis. 

Início da missão profética 

Pentecostes é o aniversário da Igreja?  Sob certo aspecto, sim. A primeira comunidade tinha sido reunida por  Jesus durante a sua vida. Mas o que foi tão decisivo na data de  Pentecostes, depois de sua morte e ressurreição, é que aí começou a  proclamação ao mundo inteiro da Salvação em Jesus Cristo, morto e  ressuscitado. Para os antigos judeus, Pentecostes era o aniversário da  proclamação da lei no monte Sinai : esta proclamação constituiu, por  assim dizer, Israel como povo, deu-lhe uma ‘constituição’. De modo  semelhante, quando os apóstolos proclamam no dia  de Pentecostes a salvação em Jesus Cristo, é constituído o novo povo de  Deus. Não só Israel, mas todos os povos são agora alcançados, cada um em  sua própria língua (1ª leitura).

Até hoje, a  Igreja continua procurando alcançar todos os povos, grupos, classes e  raças, numa linguagem que os atinja. Não necessariamente na linguagem  que lhes agrade! Aos pobres, terá que falar uma linguagem de carinho e  animação; aos ricos, uma linguagem provocadora, para descongelar seu  coração. Mas, de qualquer modo, a todos ela deverá explicar – na  linguagem adequada – que na conversão a Cristo se encontra a salvação.

O  verdadeiro milagre das línguas não consiste em dizer ‘Aleluia’ em todas  as línguas, mas em falar com clareza para todos os povos, raças e  classes. Os diversos dons do Espírito Santo, de que fala a 2ª leitura,  servem exatamente para isto : para atingir as pessoas de todas as  maneiras, para sermos profetas da Nova Aliança, selada por Cristo em seu  próprio sangue e, agora, publicada para o mundo sob o impulso de seu  Espírito. Como Moisés e os setenta anciãos no Sinai se tornaram  porta-vozes de Deus e da antiga Aliança, assim agora, a partir de  Pentecostes, a Igreja deve tornar-se toda profética, denunciando o que  está errado e anunciando a salvação que está na fraternidade e na  comunhão que Jesus veio instaurar. Assim, o Espírito de Deus renovará,  pela Igreja, a face da terra (cf. salmo responsorial).’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://domtotal.com/noticia/1580318/2022/06/inicio-da-missao-profetica/

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