Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
teólogo protestante
‘Ainda
é muito comum em nossos dias as pessoas que se dizem cristãs estarem em busca
de certezas a respeito da fé. Desejam, a todo custo, terem chancelado o caminho
que estão percorrendo para, assim, garantir que a salvação os aguarda ao final
da jornada.
Essa
busca de segurança, todavia, não deve ser motivo de condenação. Afinal, quem de
nós não deseja essa confirmação de que aquilo que fazemos é bem-visto aos olhos
de alguém? Ainda mais quando o assunto é tão sério, como a questão da salvação.
Contudo,
ao observarmos o texto bíblico, tal garantia só se mostra nos textos do Antigo
Testamento, principalmente no período em que Deus era visto como Aquele que
fazia uma aliança com seu povo, do tipo contratual. Em outras palavras, se ao
povo era solicitado que se cumprissem os mandamentos de Javé, da parte de Javé
provinha a segurança, as vitórias nos tempos de guerra e a prosperidade em
todos os empreendimentos do povo.
Um
exemplo muito claro dessa dinâmica se encontra no texto de Deuteronômio 28, que
se inicia com uma condicional : ‘se escutares verdadeiramente a voz do
Senhor teu Deus, cuidando de pôr em prática todos estes mandamentos que hoje eu
te dou, então...’ Esse versículo deixa claro o tipo de relação estabelecida
nesse contrato. Agora, uma vez que o povo obedecesse podia, de alguma maneira,
requerer tal proteção divina e vitórias, afinal, estariam cumprindo sua parte.
Em outras palavras, tanto Deus quanto o povo se tornavam responsáveis por
cumprir aquilo que havia sido firmado.
Esse
tipo de teologia retribucionista é marcante em todo texto bíblico. Até mesmo no
Novo Testamento é possível perceber traços dessa teologia, sendo um exemplo
disso o texto do Apocalipse joanino.
Que
tal teologia tenha sido questionada já antes de Jesus, os livros de Jó e
Eclesiastes deixam isso muito claro. Contudo, como é possível perceber, tal
teologia ainda se faz presente hoje, sendo tanto consequência, como geradora
dessa busca de certeza sobre a qual iniciamos nosso texto.
No
entanto, a compreensão do conceito de fé nos leva em outra direção. Afinal, a
fé é o contrário da certeza, uma vez que se se tem certeza de alguma coisa, a
fé se torna sem sentido. Não precisamos de fé para dizer que se jogarmos um
lápis para o alto ele cairá. A força da gravidade garante isso e, portanto,
falar em uma ‘fé na gravidade’ se torna algo sem sentido.
Ter
fé em Deus, em perspectiva cristã, implica abrir mão dessa busca de certeza de
que se está no ‘caminho da salvação’, até mesmo porque, na perspectiva
dos Evangelhos, a salvação é dada gratuitamente, independentemente das obras,
sendo aceita, diga-se de passagem, por meio da fé. Ninguém em nossos dias viu a
salvação para garantir que ela seja verdadeira, e possivelmente, não conhecemos
alguém que tenha visto Jesus ressuscitado para garantir com certeza de que Ele
está vivo.
Todas
essas realidades são aceitas pela fé, de maneira que buscar a certeza dessas
coisas se mostra contrário àquilo que, como cristãos, compreendemos sobre o que
é a fé.
A
busca de certezas a respeito da salvação se revela como fruto de um
relacionamento infantil com Deus, tal como uma criança pequena que chora quando
a mãe ou o pai saem de sua vista, por achar que eles não estão mais ali.
Insistir nisso é pernicioso para o amadurecimento cristão.
Longe
das certezas, a fé cristã nos convida a nos lançarmos em confiança de que
Aquele que fez a promessa é fiel para a cumprir. Um ‘salto’, como diria
Kierkegaard. E nada mais que isso.’
Fonte : *Artigo na íntegra
https://domtotal.com/noticia/1581401/2022/06/a-frenetica-busca-de-uma-certeza-da-salvacao/
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