quarta-feira, 25 de março de 2020

O teólogo em tempos de crise

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 Lee Man-hee, líder de igreja coreana, curvou-se no chão e pediu desculpas por causar a disseminação
Lee Man-hee, líder de igreja coreana, curvou-se no chão e pediu desculpas por causar a disseminação 'não intencional' do Covid-19

*Artigo de Fabrício Veliq,
teólogo protestante

‘Recentemente, o líder da igreja sul-coreana Shincheonji, Man-hee, pediu desculpas pela disseminação do novo coronavírus atribuída à sua congregação, que estima-se ser responsável pela metade das infecções no país. Ele é acusado de não revelar os nomes dos fiéis que estavam contaminados, dificultando o rastreamento da doença.

Já em terras brasileiras, o pastor Silas Malafaia se recusou a interromper os cultos de sua igreja, vencendo uma batalha judicial contra o Ministério Público do Rio de Janeiro. Contudo, o líder da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo alterou seu posicionamento, mas manteve os templos abertos. ‘Tem uma coisa : eu vou ampliar a hora de igreja aberta, que igreja aqui não vai ficar fechada, não’, disse.

Embora distantes um do outro, esses casos revelam o quão irresponsáveis as lideranças religiosas podem ser ao considerar que estão fazendo a vontade de Deus. No caso da Coreia do Sul, a irresponsabilidade acarretou em contaminação maciça; no Rio de Janeiro, ainda não temos dados suficientes para avaliar o impacto dessas grandes reuniões, que só foram encerradas há alguns dias. Tendo em vista o histórico sul-coreano, não se esperam boas notícias.

Diante disso, é importante lembrar o papel fundamental que uma teologia pública de qualidade tem. Infelizmente, por falta de conhecimento teológico e bíblico, milhares de pessoas acreditam que deixar de ir a um culto ou a uma determinada celebração no templo lhes afastaria de Deus ou lhes tornaria pessoas de pouca fé. Muitas delas têm o coração sincero, desejoso de servir a Deus com todo empenho. Porém, dada a ausência de instrução, acabam se colocando em lugares que não deveriam estar, dando o que não deveriam dar e fazendo o que não deveriam fazer em momentos de crise como o que estamos passando.

Faz-se necessário, neste tempo, uma teologia cristã bem fundamentada, séria, e que consiga chegar a essas pessoas. Necessita-se de teologia comprometida com o Evangelho, que saia dos gabinetes e alcance as camadas da população que jamais terá acesso aos dicionários críticos teológicos, aos textos comparativos dos manuscritos de Mateus etc. Urge-se uma teologia que as impeça de serem levadas ao abismo por líderes religiosos que, aproveitando-se da ignorância de muitos, enriquecem seus bolsos enquanto matam os fiéis. Propor essa teologia, não obstante, é papel do teólogo que se reconhece chamado ao seu exercício junto da sociedade, a fim de que ela se torne mais consciente, justa e livre.’


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