sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Vaticano tira 'véu' sobre o arquivo de Pio XII

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 Papa Pio XII conduziu a Igreja Católica entre os anos 1939 e 1958
Papa Pio XII conduziu a Igreja Católica entre os anos 1939 e 1958

*Artigo de Mirticeli Dias de Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa da Santa Sé


‘O papa Pio XII volta para o centro das atenções. Desta vez, sem as especulações que caracterizaram o seu pontificado até agora. Para alguns, um pontífice que foi difamado. Para outros, um líder religioso que se omitiu diante das atrocidades de Adolf Hitler. Pio XII e seu famoso silêncio. Por que ele não disse nada? E se ele tivesse dito, quais consequências isso acarretaria? Se quisermos ser honestos o suficiente, os dois questionamentos são válidos. Sobretudo em um período no qual até as perguntas são condicionadas pelas ideologias.

Um papado que não é observado levando em conta o contexto, certamente ficará à mercê de interpretações apaixonadas, como acontece hoje. Uma prova disso são as várias instrumentalizações relativas aos decretos de Pio XII contra o comunismo feitas atualmente. Para quem tem o mínimo de bom senso, sabe que a condenação à esquerda, em se tratando de espectro político, e pensando na conjuntura atual, jamais foi feita.

O problema está em interpretar um documento com o olhar do presente. E em se tratando de catolicismo, isso é extremamente perigoso. É como pegar a bula Unam Sanctam, de Bonifácio VIII, e aplicá-la no presente. Analisar um sumo pontífice, quer dizer adentrar na sua trajetória e na de seus antecessores e sucessores, justamente porque o papado denota essa hermenêutica da continuidade. Se quebramos esse ciclo, faremos as análises mais surreais possíveis.

Não podemos nos esquecer que, à época, o ateísmo comunista e as várias outras atrocidades cometidas pelo regime colocaram a Santa Sé em estado de alerta. Pio XI - que anos antes havia condenado o fascismo, foi muito mais brando, justamente porque Benito Mussolini permitiu uma série de concessões à Igreja Católica e autorizou que ela exercesse, quase que livremente, a sua pastoral.

Além disso, os papas que sucederam Pacelli, atualizando essa condenação ‘aos vermelhos’, souberam exprimir essa diferença. João XXIII que o diga. Ao falar da ‘liberdade de associação’, na sua encíclica Pacem in terris, era consciente que, numa democracia - a qual se reerguia a duras penas no período em que ele viveu -, os dois pólos são importantes.

Pio XII foi declarado servo de Deus por Bento XVI em 2009. O reconhecimento causou indignação entre os judeus. À altura, os jesuítas começavam a desempoeirar os 20 mil documentos relativos ao pontificado de Eugenio Pacelli, nome de batismo do papa de origem romana. Na época, os pesquisadores tinham a esperança de que todo o acervo de atas, cartas e escritos pessoais desse papa finalmente seriam colocados à disposição dos estudiosos.

Portanto, há muito tempo se preparam para essa abertura, que se concretizará com a autorização de Francisco no próximo dia 2 de março. Para a Santa Sé, um modo de mostrar o trabalho feito por Pio XII em prol dos judeus que, de acordo com relatos da própria comunidade judaica, abrigou muitos daqueles que escapavam das tropas nazistas nos palácios vaticanos.’


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