*Artigo
do Padre Dr. José Eduardo
A comunhão nunca foi tão acessível… e tão banalizada
‘Até
o século XIX, os critérios para comungar eram doutrinalmente tão exigentes que,
na prática, poucas pessoas comungavam.
Considerava-se
que, para além de uma preparação que eu chamaria de negativa — o fiel não
deveria ter consciência de nenhum pecado grave –, era necessária uma cuidadosa
preparação positiva : jejum eucarístico desde a meia noite, asseio e modéstia
pessoais muito mais salientados que o normal, oração fervorosa com a repetição
de inúmeros atos de fé, esperança, adoração, humildade, caridade etc. No
dia-a-dia, as pessoas comungavam raramente, somente depois de se confessarem e
fora da Santa Missa.
Essa
prática era tão consagrada, que Santa Teresa foi considerada suspeita de
heresia porque desejava comungar todos os domingos.
A
propósito, o Concílio de Trento deixou muito clara a distinção entre o rito da
Santa Missa (com a comunhão do sacerdote) e o rito da Santa Comunhão dos fiéis,
para salvar a Igreja do erro protestante de se considerar a Missa como somente
uma Ceia e, portanto, a Comunhão como o momento essencial da ação litúrgica (e
não a consagração).
Os
santos sempre sofreram com essa dificuldade em receber o Santíssimo Sacramento,
a tal ponto que a própria Santa Teresinha do Menino Jesus chegou a dizer que,
quando chegasse ao céu, a primeira coisa que pediria a Deus seria a ‘comunhão
diária’ para toda a Igreja.
De
fato, ela morreu em 1897 e, em 1903, foi eleito o grande São Pio X, que, em
1905, escreveu o Decreto ‘Sacra Tridentina Synodos’, oferecendo a todos
os fiéis a possibilidade de comungarem diariamente.
Isso
foi uma grande graça! Um tremendo prodígio!
Contudo,
a recepção diária não servia para afrouxar as exigências de uma preparação
negativa e positiva para comungar. Antes, era instrumento para difusão de maior
santidade na Igreja.
Aconteceu,
porém, que, com o passar do tempo, a disciplina se foi afrouxando e, de uma
condição em que o fiel se sentia ‘PROIBIDO DE COMUNGAR’, passou-se a uma
condição em que os fiéis passaram a se sentir no ‘DIREITO DE COMUNGAR’ :
bastaria não ter um pecado grave na consciência que já se sentiriam aptos para
aceder ao ‘sacrum convivium’, sem maiores exigências.
Foi
uma mudança de 180 graus, já foi uma queda!, mas ainda num quadro em que as
pessoas se viam obrigadas a confessar, caso houvesse consciência de pecado
mortal.
A
situação foi se alterando, porém.
E,
há algumas décadas, chegamos ao estado em que os fieis se sentem no ‘DEVER
DE COMUNGAR’, como se a não recepção da comunhão fosse em si mesma um
pecado. Esse dever, aliás, não é imputado apenas ao leigo, mas também à Igreja :
parece que a única forma de inclusão é dar a comunhão, e ninguém possa ser
privado desse sacramento, inclusive pelo próprio bem de sua alma. Não só o fiel
teria o dever de comungar, mas o padre teria o dever de dar a comunhão a quem
quer que seja!
Hoje,
as pessoas se confessam de terem ido à Missa e não terem comungado; ou de não
terem ido à Missa por não poderem comungar; ou de terem comungado em pecado
grave com a intenção de depois se confessarem, porque se sentiam no dever de
fazê-lo ou tinham ‘necessidade’… QUANTA CONFUSÃO DOUTRINAL E QUANTO
SACRILÉGIO!
A
doutrina da Igreja é clara, e não preciso aqui explicá-la. Para comungar, é
preciso ter a consciência livre de qualquer pecado grave e estar fervorosamente
em pelo menos uma hora de jejum e oração, aguardando a chegada do Senhor na
alma!
Na
práxis pastoral hodierna, não é que mudamos 180 graus, isso já é coisa do
passado! Conseguimos a ‘proeza’ de ainda dar uma cambalhota para outros
180 graus, e parece-me que perdemos o caminho de volta.
Viva
a Sagrada Comunhão diária!, mas recebida com as devidas disposições, com aquele
espírito sintetizado pelo Apóstolo das Gentes : ‘aquele que comunga sem
distinguir o corpo do Senhor, comunga a sua própria condenação. Esta é a razão
por que entre vós há muitos adoentados e fracos, e muitos mortos’ (1Cor
11,29-30).
Não
seria essa banalidade com que tratamos a Sacratíssima Eucaristia a razão de
tanta falta de firmeza na fé, de tanta apostasia, de tanta irreligião, de tanto
abandono de Deus e de sua Lei?…’
Fonte
:
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