*Artigo
de Padre José Rebelo,
Missionário Comboniano
‘Tive a
oportunidade de ir aos montes Nuba, no Sudão. Trata-se de um território um
pouco maior do que metade de Portugal, em grande parte controlado pela ala
nortista do Movimento de Libertação do Povo do Sudão (SPLA-N). Desde o
reatamento da guerra, em Junho de 2011, que as escolas funcionam com
professores voluntários. São apoiados apenas pelas famílias das crianças, que
com eles partilham um pouco do produto das suas colheitas. As estruturas estão
degradadas, muitos professores não têm a preparação adequada e faltam livros e
material escolar. Autoridades locais e professores repetiram um sem-número de
vezes que a sua grande prioridade é a educação das crianças.
Entramos e saímos
da região por Yida, no Sul do Sudão, onde se encontra o maior campo de
refugiados núbios, com mais de 75 mil pessoas registadas e mais alguns milhares
não registados. Não fossem os oleados fornecidos pelo Alto Comissariado para os
Refugiados (ACNUR), qualquer visitante seria levado a pensar tratar-se apenas
de uma grande aldeia. A queixa mais ouvida no campo é a de que a ACNUR lhes
está a negar o direito básico à educação, uma vez que recusam, tal como o Alto
Comissariado desejaria, serem transferidos para o campo de Ajoung Thok. As
razões que invocam : situa-se num lamaçal e não é seguro, devido à proximidade
de uma guarnição militar sudanesa – o campo fica perto de uma parte da
fronteira controlada pelo Governo de Cartum.
A situação da educação
é, em síntese, a seguinte : as escolas que existem no campo foram feitas pela
comunidade e funcionam em estruturas rudimentares (são cobertas por oleados e
para sentar-se, além do chão, os alunos usam troncos de árvore e latas da ajuda
alimentar); os professores são voluntários, em muitos casos com poucas
habilitações, apoiados apenas pela comunidade; tal como nas montanhas, seguem o
currículo queniano, mas faltam livros e outro material escolar (ou destinado à
prática desportiva, necessária para manter a saúde física e mental das
crianças, sujeitas a um quotidiano difícil).
Segundo os dados
fornecidos pelos coordenadores escolares, estão a funcionar as seguintes
escolas : oito primárias com 151 professores, de ambos os sexos, que têm a seu
cargo 13 954 alunos; estimam que 9178 crianças não frequentem a escola; uma
secundária, com 15 professores e 320 estudantes (102 meninas e 218 rapazes); 32
pré-primárias, com 202 orientadoras e 8751 crianças.
Os Nubas são um
povo determinado, com uma forte identidade cultural e os esforços que tem vindo
a fazer para proporcionar alguma educação são admiráveis. O objectivo é evitar
que uma geração inteira de crianças cresça quase iletrada e os jovens se tornem
adultos sem qualquer formação profissional. Há professores a regressarem do
estrangeiro, onde poderiam ter um futuro melhor, para darem o seu contributo à
comunidade a troco de comida.
Recordo esta
situação cada vez que ouço falar de decisões para facilitar a vida dos
estudantes – reduzir ao mínimo a avaliação «para
não os discriminar» ou para os «passar
ao colo», baixar as propinas ou dar de borla manuais escolares mesmo a quem
tem mais posses (talvez para não comprometer a sua participação nos inúmeros
festivais de Verão que estão à porta). Diz-se que esta geração é a mais bem
preparada academicamente. Pode perguntar-se se é a mais bem preparada para
enfrentar as dificuldades da vida. Porque em geral não há aprendizagem – nem
saber de experiência feito – sem esforço e sem luta.’
Fonte :
* Artigo na íntegra
Nenhum comentário:
Postar um comentário