Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo do Padre
Alfredo J. Gonçalves, CS
‘Migrar é um direito, direto de ir e vir?
Teoricamente, sim, na verdade não! Pelo contrário, para milhões e milhões de
pessoas, migrar é uma obrigação. Migração forçada, compulsória. Sair não por
decisão própria, mas por uma série de circunstâncias adversas. Alguns autores
falam de fatores de expulsão. Fatores que pressionam as pessoas a
deixarem sua terra natal, às vezes a família, amigos e parentes. A terra natal
tem subjetivamente um caráter sagrado : nela estão sepultados os restos mortais
dos antepassados. Os principais ‘fatores de expulsão’ estão ligados, em
primeiro lugar, às condições socioeconômicas em que vive a população de origem.
Faltam oportunidades reais de sobrevivência, o que leva a buscá-las em outra
parte. Evidente que os países de origem coincidem com o subdesenvolvimento, a
pobreza, a miséria e a fome.
Em segundo lugar, as tensões, conflitos e guerras
formam um segundo bloco de expulsão. Diferenças e turbulências de ordem étnica,
religiosa, política ou ideológica tendem a produzir refugiados em série. O
refugiado é aquele que não pode voltar atrás, sob pena de perseguição,
encarceramento ou morte. Daí a fuga em massa dos países conflagrados, com a
intenção de encontrar um lugar de refúgio. Segundo o ACNUR, o número de
refugiados e deslocados internos forçados em todo planeta já ultrapassa a casa
dos 120 milhões de indivíduos.
Muitos migrantes estão sendo expulsos, em terceiro
lugar, devido aos efeitos nocivos, e cada vez mais extremos, das mudanças
climáticas. Estiagens, inundações, tornados, furacões, etc. afetam em geral os
setores mais vulneráveis da população. Na verdade, não poucos destes migrantes
já viviam em situação precária no país de origem, forçadas a ocupar os lugares
mais perigosos e sujeitos a tragédias. Poder-se-ia dizer que essas catástrofes
climáticas apenas marcam a hora da partida. Alguns falam de ‘refugiados
climáticos’, expressão que o ACNUR ainda não reconhece. Claro, outras
motivações levam as pessoas a migrar. Saúde, educação, moradia, turismo são
algumas delas. Também vivem em constante migração aqueles que trabalham com os
meios de transporte, tais como motoristas, marítimos, aeroviários… Sem ignorar,
ainda, os missionários, peregrinos, soldados, técnicos de empresas
transnacionais, entre outros.
Por outro lado, no processo de migração, os autores
falam também em fatores de atração. Um dos mais batidos são as
luzes, atrativos e oportunidades proporcionadas de modo particular pelo
universo urbano. O termo ‘luzes’, neste caso, poderia servir de metáfora para
os direitos humanos mais elementares : acesso mais fácil ao trabalho, à
moradia, à escola, aos serviços de saúde, transportes, e assim por diante. Em
outras palavras, os ‘fatores de atração’ pressupõem, em geral, os ‘fatores de
expulsão’. A carência extrema alimenta o sonho de vida melhor, impondo a
necessidade de migrar. O que significa que ‘fatores de expulsão’ e ‘fatores de
atração’ comportam duas faces da mesma moeda.
O fenômeno migratório, cada vez mais intenso,
diversificado e complexo inclui, via de regra, três aspectos : polo de origem,
polo de destino e lugares de passagem. Alguns países são predominantemente
pontos de saída, outros de chegada e outros ainda de trânsito. Mas não é
incomum que algumas nações reúnam, ao mesmo tempo, duas ou três dessas
circunstâncias, tais como Turquia e Grécia, México e Portugal, Espanha e Líbia,
para citar casos específicos. O certo é que origem, destino e trânsito, apesar
de existirem enquanto predominância, se cruzam e se misturam, se interpelam e
se entrelaçam. O que levanta a dificuldade de trabalhar com o esquema estreito
de ‘fatores de expulsão’ e ‘fatores de atração’.
Se é certo que os migrantes contemporâneos sabem
evidentemente de onde partiram, poucos sabem onde replantar as próprias raízes.
Tal como nas migrações históricas da Europa para as Américas, os migrantes de
hoje nunca esquecem a terra onde nasceram e criaram raízes. Diferentemente
daqueles, porém, grande parte dos atuais desconhece o lugar de chegada. Batem
de fronteira em fronteira, até encontrarem acolhida. Em outros tempos, o lugar
de origem e o lugar de destino estavam mais ou menos determinados. Não é o que
ocorre atualmente. Aos milhares e milhões, os migrantes passam a errar de um
lugar a outro, como aves de arribação, sem um galho onde repousar. Tudo na ‘aventura’
da migração se tornou mais incerto, mais inseguro e mais inquietante. Em
conclusão, não custa lembrar que o direito de migrar (ir-e-vir) corresponde ao
direito de permanecer em sua pátria. Tudo depende de oferecer a cada cidadão
oportunidades iguais de desenvolvimento. Aqui, se fazem necessárias políticas
públicas estruturais, no sentido de evitar a todo custo a migração forçada.
Então, sim, migrar ou ficar será um direito de todos’.
Fonte : *Artigo na íntegra
https://migramundo.com/uma-reflexao-sobre-os-caminhos-tortuosos-da-migracao/
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