* Artigo
de A. Torres Neiva
‘Foi num Capítulo Geral. O Capítulo Geral das
estrelas. Num primeiro momento, como mandam os métodos mais modernos, cada uma
foi contando a sua própria experiência, ou como se diz hoje, partilhando suas
experiências mais significativas. O bem que fazia à humanidade, a sua contribuição
para o desenvolvimento da ciência, seu papel na vida das pessoas...
Quem começou a falar foi o Sol. Nem
precisava falar, pois todos conheciam a importância que a luz tem na sucessão
dos dias e das noite, o calor no verão, o frio no inverno. Mas mesmo assim, o
Sol não deixou por menos e lembrou a todas as estrelas o que elas já sabiam.
Depois foi a vez da estrela Polar. Também
ela não foi modesta ao explicar como ajudava os navegantes a encontrar o norte
e não se cansava de ensinar o caminho certo a quem tinha dúvidas.
Cruzeiro do Sul aproveitando a deixa,
logo pediu a palavra e, se a estrela Polar era perita em ensinar os caminhos do
norte, com os do sul era com ela. Não havia explorador austral, nem viajante do
sul que não lhe apreciasse os préstimos. Uma estrela pouco conhecida, mas nem
por isso mais discreta, contou como fora dela que Einstein se servira para confirmar
a sua teoria da gravidade, quando ela passara por trás do sol, durante um
eclipse.
E
assim, todas as outras estrelas falaram de seus méritos e das suas glórias,
pois num Capítulo Geral, todas podem falar e contar o que quiserem. De resto,
cada uma elogiava tanto a si própria que nem era fácil saber qual delas seria a
melhor.
Todas não, pois havia uma, meio
envergonhada e quase escondida, que se mantinha calada e sem nenhuma vontade de
falar. É que não se lembrava realmente de nada para dizer. Não sabia de nenhum
cientista que a tivesse descoberto ou de algum serviço prestado à humanidade. E
foi isso mesmo que confessou, quando só faltava ela para falar e o seu nome
estava ainda em aberto. Com franqueza disse não saber para que servia nem isso
lhe preocupava.
Isto era uma vergonha! As outras
olharam-se umas para as outras, escandalizadas com essa parasita que ocupava um
posto inútil no firmamento e...puseram-se a rir. E depois das zombarias vieram
as censuras e cobranças : se ela não servia para nada que é que estava fazendo ali? Lugares como
aquele eram só para quem tinha alguma luz para dar.
Mas ela, enquanto ouvia as reprimendas,
começou a pensar : Não, até que sirvo para alguma coisa. Enquanto os homens não
me descobrem, eles continuam à minha procura, têm consciencia de que ainda não
sabem tudo e continuam a investigar. Eles não sabem para que eu sirvo, mas
talvez já se tenham dado conta que há no firmamento algo que com a sua força de
gravidade afeta a rota das outras estrelas. E isso faz com que eles se
mantenham despertos e continuem a pesquisar.
As outras estrelas foram-se calando e
ouvindo. E a estrela concluiu : será que a minha missão não é dizer aos homens
que ainda não sabem tudo e que lhes falta ainda algo por descobrir?’
********************
Quantas estrelas não haverá por
descobrir entre nós, em nossas comunidades e famílias! Jean Vanier diz que o
que constrói a comunidade é o dom de cada um. E este dom não é tanto o serviço
que se presta, a competência ou habilidade com que se desempenha um cargo, mas
a luz que cada um tem. Há luzes que iluminam a partir de dentro e ninguém sabe
de onde se origina. Às vezes é a delicadeza de um porteiro, a humildade de uma
velhinha, o sorriso do jardineiro...
Não lhes perguntem o que fazem ou para
que serve o que eles fazem, pois não saberiam responder. Mas, sem eles,
ficaríamos às escuras.
Fonte :
* Artigo publicado em Vida
Consagrada, 198 – Janeiro 1998. Adaptado de Padre Adélio Torres Neiva, C. S. Sp. (missionário espiritano
(+2010)).
Revista
Beneditina nrº 30, Novembro/Dezembro de 2008, editado pelas monjas beneditinas
do Mosteiro da Santa Cruz – Juiz de Fora/Minas Gerais.
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