sábado, 10 de agosto de 2013

Tornar-se monge na sociedade secular de hoje (Capítulo 1 de 2)

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB) 

Artigo de *Dom Abade Bernardo Bonowitz, OCSO
Prólogo da **Revista Pedras Vivas
            No momento que a conferência aqui reproduzida foi realizada, Dom Abade Bernardo Bonowitz era Prior do mosteiro Nossa Senhora do Novo Mundo, o único mosteiro trapista do Brasil, localizado em Campo do Tenente, no Paraná. Ele proferiu essa palestra sobre a vida monástica no século XXI, no auditório da Faculdade de Administração e Economia (FAE) no dia 12 de setembro de 2001, dentro do VII Ciclo de Palestras e Conferências do Instituto Ciência e Fé. Apesar da distância, a argumentação da mesma continua atual e merece ser conhecida. Para Dom Bernardo, os jovens candidatos que querem se tornar monges precisam de uma formação humana mais ampla. Para um auditório lotado ele disse que, no mosteiro do qual é superior, apenas três entre 50 candidatos conseguem, de fato, entrar. Agradecemos ao autor a permissão para publicação do seu texto aqui. 
O jovem discípulo brasileiro e o Pai espiritual :
Tornar-se monge na sociedade secular de hoje
Introdução : Uma Nova Paternidade – de João Batista a Jesus
O monge é sempre discípulo. Ele deseja tornar-se o herdeiro autêntico de um mestre, de viver e transmitir dignamente a santidade dos seus modelos. Ele vê no mestre a tradição viva e encarnada, e espera tornar-se o próximo elo desta tradição. Seus ombros ardem, por assim dizer, para receber o manto daquele que o formava. Quando monges lêem que na hora da sua morte, Santo Antão, primeiro monge, mandou seu manto para Atanásio, todo mundo entende o que isto significa.
Os monges do século IV, o século da explosão do fenômeno monástico, buscavam não somente pais contemporâneos, mas pais arquetípicos, patriarcas. Ocupados como estavam muitas horas por dia na leitura, meditação e proclamação pública dos textos bíblicos, sentiam a necessidade de descobrir na página sagrada os antepassados espirituais. Uma vez chegado o tempo de Cassiano (século IV), a escolha foi feita. O primeiro ‘monge’, o progenitor da raça monástica, ia ser Elias – Elias na beira do riacho Querith, alimentado pelo corvo, Elias no cume do monte Horeb, percebendo a voz de Deus como a brisa mansa que segue o tumulto de furacão, ventania e fogo. Junto com ele, como seu espelho neotestamentário, os monges escolheram a João Batista – não certamente, o neném das festas juninas de cachos loiros, acompanhado pelo cordeirinho, mas aquele que vivia escondido no deserto, que abriu a boca só para pregar a única coisa necessária: arrependimento. Misteriosamente, os monges não falavam muito a respeito de ser discípulos de Jesus, nem viam seu próprio rosto espiritual refletido na fisionomia de seguidores de Jesus como Pedro, Tiago e João. Isto não quer dizer de maneira alguma que os monges primitivos não adoravam a Jesus, não percebiam nele o princípio e o fim de tudo. Pode até ser que evitavam esta comparação por motivos de respeito : sabemos que a cristologia dos monges era uma cristologia chamada ‘alta’, isto é, que enfatiza a divindade de Jesus. Mesmo assim, esta ‘paternidade mais próxima’ de Elias e João Batista necessariamente implica em certas conseguências.
Porque Elias e João Batista, pelo menos como compreendidos pelos monges egípcios, eram ascetas. Sua austeridade manifestava a santidade do Deus inefável; suas austeridades formavam os graus da escada que levava à experiência do Deus inacessível. A Bíblia chama os dois de ‘terríveis’ – título de admiração, de certo, e não de condenação. Sua fidelidade radical ao Deus transcendente os incendiava, e fazia com que eles queimassem a quem quer que seja que eles tocassem. Ninguém nunca imaginou bater um papo com nenhum dos dois.
Ora, o tema da palestra a mim pedido é ‘Ser monge na sociedade de hoje’. Eu interpreto este título da seguinte maneira : Como tornar-se monge, viver como monge, vindo da sociedade de hoje, e especificamente da sociedade atual brasileira? Por um lado, meus pobres cinco anos no país não me providenciam uma intuição muito aguda nesta questão. Por outro lado, tenho a vantagem de pessoalmente viver esta situação como um ‘desafio existencial’. Superior de uma comunidade monástica brasileira, para mim é questão de vida e de morte chegar a discernir a interação exigida entre a sociedade local contemporânea e a tradição milenar monástica, para chegar àquela síntese que a gente chama de ‘inculturação’. Evidentemente, seria absolutamente ilícito falsificar as exigências do monaquismo para agradar aos ‘fregueses’, seria um tipo de morte. Igualmente, porém, seria morte cegar-me ao retrato vivo da sociedade brasileira jovem que eu contemplo em cada um de nossos vocacionados, sociedade que vive à uma imensa distância do Egito do século IV.
Esta sociedade – aqueles que vêm desta sociedade e aspiram ser monges – precisam de outros pais que Elias e João Batista. Precisam realmente chamar Jesus de pai. Uma longa tradição patrística, iniciando-se na própria carta aos Hebreus, pensa em Jesus como o pai de seus seguidores, e esta tradição persiste e se manifesta até na regra monástica mais difundida, a Regra de São Bento. Vamos considerar brevemente a paternidade de Jesus para aplica-la à formação monástica.
Para mim, é de grande interesse que o brado de João Batista, ‘Convertei-vos’ – foi assumido por Jesus no começo de seu ministério. Lemos no Evangelho de Mateus que quando Jesus voltou da sua prova no deserto e ficou sabendo da prisão de João, iniciou a sua própria atividade de pregação, dizendo exatamente o que João dizia : ‘Convertei-vos, porque o reino de Deus está próximo’. Parece que Jesus mesmo ia tomar João por seu pai. Só que esta palavra de conversão, ou pelo menos, esta maneira de abordar o tema de conversão, terminou com este primeiro anúncio. Certamente não porque Jesus decidiu que a transformação da vida não o interessava mais. Trasnformação da vida, novidade da vida, constituía o núcleo da missão de Jesus. Contudo, em vez de exigí-la como João fazia, Jesus aprendeu que ele estava em condições de comunicá-la. Comunicava-a por meio de curas, de ensinamentos (particularmente as parábolas), e sobretudo de perdão o: ‘Teus pecados estão perdoados’.
Será que foi mais fácil para o pessoal do tempo de Jesus receber a vida renovada do que serem chamados a transformar-se? Acho que não : acho que a nova vida doía dentro daqueles que a aceitavam, que sentiam muitas saudades pela vida velha. Acho que finalmente Jesus não pedia menos do que João Batista. Mas ele criava, gerava naqueles que o seguiam a nova vida que ia depois pedir em prol do seu Reino. Mais ainda, ele implantava esta vida neles da sua própria vida. Cada vez que ele curava, uma força saia dele, e ele sentia a diminuição; cada vez que ele perdoava, assumia o pecado em si mesmo e sentia o aumento. Quer dizer, Jesus vivia todo o seu ministério eucaristicamente, infundindo nova vida nos outros, ou melhor, fazendo como que a transfusão de sua vida para os outros. E assim prostitutas, cobradores de impostos, leprosos e soldados chegaram a uma auto-doação que João Batista nunca poderia ter provocado neles.
Podemos afirmar, então, que Jesus antecipava durante o ministério a intuição fundamental de Paulo na Carta aos Romanos : a humanidade não se salva através das chamadas da atenção. Uma humanidade desfigurada pelo pecado, alienada do Deus que fala nas profundezas da consciência, só se entristece e se endurece ao ouvir mais um apelo de ser diferente do que é – ou, em termos da teologia paulina, de enfrentar a Lei. Somente perdão gratuito, amor abundantemente derramado da própria fonte de amor – quer dizer, Graça, - tem a possibilidade de restaurar o homem. Garantia não tem nenhuma – é possível que o amor divino caia às vezes, muitas vezes até, num solo pedregoso, para morrer lá e apodrecer lá. Mesmo assim, é a única chance. 

I – Os Jovens de Hoje 
Os jovens que vêm buscando a vida monástica hoje em dia são pessoas admiráveis. Além de um grande idealismo que les quase sempre trazem para o mosteiro, chegam com uma generosiadade transbordante, um desejo de experimentar a Deus e uma esperança de viver numa comunhão de amor fraterno. Mas também chegam carregando um jugo pesado de sofrimento e de potencialidades ainda adormecidas ou despertadas apenas para tornar-se frustradas novamente. Vêm com grande frequência de situações de casa marcadas por todo tipo de abuso, negligência e fracasso. Vêm de lares pobres que não permitem o desenvolvimento normal de suas capacidades intelectuais, sociais ou artísticas. Vêm de famílias onde não há livros ou instrumentos musicais. Vêm de ambientes onde experimentavam muito e sentiam muito, mas nunca aprendiam refletir sobre a própria experiência e ainda menos dialogar sobre ela. Vêm de pequenos mundos de criança onde as figuras de autoridade com as quais viviam – o professor, o patrão – nem sempre mostravam para eles a paciência e a bondade que faziam parte do seu cargo, que deveriam ter feito parte do seu repertório como adultos. E por tudo isso, os jovens chegam ao mosteiro muito, muito inseguros.

Que sentido faria, portanto, de assumir o tom de um São João Batista com este moços? Há um trabalho enorme a ser feito, sem dúvida, tanto por eles quanto por aqueles que têm o privilégio de atuar como mestre de noviços ou superior. Mas este trabalho começa muito quietamente, e por sua natureza progride muito devagar. 
II – A Vida da Mente
Vamos olhar primeiro para um tema relativamente simples : a formação intelectual do novato. Existe toda uma tradição a ser assimilada, uma tradição riquíssima, aliás : a Bíblia, os padres da Igreja, os padres primitivos monásticos, os padres cistercienses de nossa ordem (século XII), a teologia sistemática, sacramental, moral, etc. Houve um momento em que eu achava que a dificuldade da assimilação baseava-se na grande sofisticação e abrangência desta tradição. Agora sei que isto é o de menos. Em certas condições – disto sou testemunha repetidas vezes –, uma pessoa com pouca formação intelectual é totalmente capaz de entrar no mundo dos padres com compreensão, delicadeza e sim, prazer (ser testemunha deste encontro é ao meu ver uma das grandes alegrias da minha vida). É trágico, sim, que o brasileiro comum receba uma formação que pouco corresponde com sua inteligência inata. Mas dá para dar uma consertada nisso no mosteiro; afinal, temos livros e temos professores. Então, não é este o problema. O problema é que por falta da experiência ou por experiências negativas, o livro, a aula, a biblioteca, o professor incutem medo. O jovem não sabe que ele tem gosto de ler; ao contrário, tem provas que não. Além disso, se ele lia antes, era sempre assunto de utilidade (ganhar o pão) ou diversão. O que fazer com uma leitura poética ou filosófica, cujo valor reside na própria beleza ou simplesmente numa aproximação maior da verdade?
Vemos assim que trata-se aqui de algo bastante básico e precioso : a descoberta do intelecto. Na minha última palestra para esta assembléia augusta, falei sobre a experiência exuberante do monge cair no mundo bíblico, de sonhar e depois acordar como um personagem a mais na história da salvação, tendo como companheiros Davi, Ester, Daniel, Pedro. Imaginen, portanto, o que pode significar acordar dentro da própria mente! É uma experiência mais cartesiana do que aquela de Descartes. Seu ‘Cogito, ergo sum’ representava uma tentativa de estabelecer inabalavelmente sua existência por meio de sua consciência reflexiva. Aqui, porém, estas mesmas palavras exprimem um estalo, ao mesmo tempo de espanto e alegria. Penso, reflito, leio, entendo e então sou, sou outro e mais do que jamais imaginava.
Será que uma tal descoberta vai acontecer somente pela leitura programada dos padres e dos teólogos? Duvido. Cabe ao formador pôr mais ingredientes na sopa, imitar a Jesus que sempre encontrava um vinho novo para botar nos odres novos. No caso ao qual estou me referindo, os odres seriam as mentes dos jovens. E o vinho novo? Um livro de poesias, um romance histórico de Alencar, uma sonata literária de Érico Veríssimo, as cebolas e pimentas de Machado. Inseparável desta tarefa é a de acompanhar o jovem em sua leitura. Além de comunicar ao noviço seu verdadeiro entusiasmo para as obras primas da espiritualidade monástica, reler com ele os livros que faziam a glória de sua própria juventude, sentir novamente o que sentia quando viajava sentado no lombo do burro ao lado de Dom Quixote, combatendo contra os moinhos de vento. O livro é o companheiro certo para a mente; mas a mente jovem tem necessidade de companheiro vivo para compartilhar com ele o seu alvoroço. E se o mestre questiona-se sobre este procedimento de dar espaço à leitura ‘profana’, que ele pense no escriba sábio do Evangelho que sabia tirar de seu armazém coisas velhas e novas. Minha experiência me ensina que uma preocupação excessiva neste assunto atrapalha mais do que protege. O jovem, com o tempo, vai sentir-se atraído à beleza da literatura mística e patrística da Igreja, e seu contato com a literatura nacional e universal vai formar nele uma sensitividade ao enredo, caracterização, imagem e tema que só pode enriquecer sua lectio da Bíblia e dos escritos dos santos padres e madres.

III – O Encontro com os Sentimentos
Tenho falado, então sobre a bem-aventurança de conhecer o mundo de livros. Segundo Orígenes, fundador da corrente da teologia mística cristã (século III), a suma bem-aventurança reside no conhecimento de si mesmo. Com isto ele quer afirmar que o ‘self’ é o sacramento primordial de Deus que cada um de nós recebe. Simplesmente existindo, possuímos em nós mesmos uma reflexão perfeita da Divindade, em cuja imagem nós fomos feitos. Aquele que consegue ver fundo em si, vê além de si, vê o Deus trino cuja força e sabedoria forma a base do próprio ser. De um certo modo, cada homem e mulher tem direito de aplicar a si mesmo as palavras de Jesus, ‘Quem me vê, vê o Pai’.
Esta visão à qual o monge é chamado (junto com todos os outros seres humanos) não é automática. Necessita um longo processo paralelo ao despertar do intelecto, isto é, o despertar da afetividade. E aí encontramos mais um desafio particularmente puxado para os nossos jovens.
Aqueles jovens brasileiros que vêm ao mosteiro levando nas costas o peso de seu passado sofrido não tem muito interesse em viver o primeiro passo desta subida/descida para a descoberta da sua identidade radical de filho de Deus. Qual é este primeiro passo ‘impulável’?
A apropriação da própria história de dor, fracasso e insegurança, uma apropriação que faz se sentir à flor da pele. Sem falar em fuga, o qual seria um termo injusto, o jovem pobre, ou subdesenvolvido de uma ou outra maneira, ou negligenciado, olha com desejo para o mosteiro como um lugar de felicidade. Se ele quisesse ficar mergulhado em seus problemas, poderia ter permanecido no mundo. Ele busca a Deus, isto sim, mas ainda não busca a cruz de Cristo. Aquele que já carrega a cruz da sua vida não precisa da cruz de outrem.
Em pouco tempo porém, dá para ver que para a pessoa sofrida todo lugar, mesmo o mosteiro, é um lugar de sofrimento. De fato, para tal pessoa, só tem duas possibilidades : consciência – a qual por enquanto vai ser necessariamente dolorosa – e distração, na tentativa de não conhecer a si mesmo à medida que este conhecimento implica dor. O maior desafio de todos, portanto, nos primeiros anos da vida monástica, é deixar-se experimentar conscientemente a carga da dor que a gente levava inconscientemente fora. E ‘experimentar’ no sentido mais forte da palavra : receber de novo os socos, os traumas que a vida ia distribuindo, sentir de novo o choque, a decepção, a culpa, o ódio que eles causavam, e reconhecer uma vez por todas que estes acontecimentos nunca vão ser apagados do livro da vida. Por isto, eu costumo dizer a respeito da questão de ‘fuga para o mosteiro’ : pode ser que cada um de nós fugiu para o mosteiro. Que seja assim. Não importa. O importante é não fugir dentro do mosteiro, não fugir desta responsabilidade fundamentalmente humana de sentir.
É tempo de refletir novamente sobre o papel do mestre, do pai, como alguém que comunica a vida, em memória de Jesus. Ele não pode simplesmente exigir do jovem vivendo este horror (realmente este trecho da vida monástica é um horror) de aguentar, fazer pé firme, e quaisquer outros conselhos que constituem um afastamento afetivo do ‘assaltado’. Esta seria a fuga do mestre, e uma fuga imperdoável. O mestre tem que assistir, por meses...anos, à tribulação do seu filho. Tem que sentir algo da mesma raiva, chorar as mesmas lágrimas, sofrer a mesma incompreensão diante das injustiças e sujeiras jogadas em cima do jovem às vezes por muitos anos. E não pode neste momento assumir a linguagem da razão para dizer, ‘Mas sabe, rapaz, todo mundo passa por tais pedaços’. O problema com todos os amigos de Jó é que todos tinham doutorado em filosofia. Falavam demais. Faltava alguém que só ficava junto com Jó não tentando nem compreender nem comentar, alguém que superava seu medo de enfrentar em Já a irracionalidade do sofrimento, alguém que sabia calar-se. No Novo Testamento encontramos este silêncio absolutamente necessário em Jesus ao túmulo de Lázaro, e em Maria, ao pé da cruz de Jesus. Como é que o mestre vai poder viver isto, talvez com cinco, seis, sete jovens de uma vez? Tem que ser ele mesmo um homem das dores. Vai precisar muito da consciência de suas próprias dores como base de seu silêncio.
Ao mesmo tempo, o jovem não pode ser vítima. Não foi por isso que Deus o trouxe para o mosteiro, simplesmente para chegar a medir o mar de sua dor. Ele tem vocação de ressuscitado, de passar por todos os quartos da sua interioridade e finalmente dar-se com o espelho na parede onde ele contempla-se a si mesmo como imagem de Deus. O novo mandamento de Jesus, pelo menos o mandamento mais frequentemente enunciado por ele, é ‘Levantata-te’. Este ‘levantamento’ faz-se por uma experiência muito paradoxal, mas de valor ilimitado. É uma experiência de compreensão, de percepção espiritual tímida, através da qual o jovem começa a conhecer-se como radicalmente fundado e seguro em Deus. Se a gente pudesse imaginar o significado último da frase ‘são e salvo’, a gente teria uma idéia desta graça. Muitas vezes esta iluminação realiza-se num momento de oração depois de um período de grande tensão interior; outras vezes parece que o jovem ouve seu nome pronunciado (por quem? Não sabe direito.) carinhosamente – como se o seu nome fosse uma carícia. De qualquer modo que seja, representa o primeiro instante da verdadeira contemplação. Pela primeira vez, a pessoa humana reconhece em si, unido a si, não diferente de si Aquele de quem ele é o sacramento.
Não é o mestre que comunica esta intuição, que não é sugestão de fora, mas certeza brotando de dentro, aquela certeza que somente Deus é capaz de produzir. Mas o mestre tem a tarefa de confirmar o que o jovem vê passageiramente, num triz de densidade ontológica enorme. Se é possível falar de uma certeza fraca, é isto que o jovem conhece a respeito daquilo que viu ou ouviu no momento inesquecível de descobrir a própria identidade em Deus. O mestre tem que testemunhar por suas palavras, seu sorriso, o respeito com o qual ele presta atenção às reflexões do jovem, que este jovem é uma nova criatura em Deus, e que tudo aquilo que ele passou não o destruiu, não podia destruí-lo, porque em Deus ele é imortal. Pode ser que o próprio mestre esteja passando por uma época difícil. Neste caos, que ele libere-se de si mesmo. Seu chamado agora é de ser testemunha da ressurreição. Segundo os evangelhos, de nada mais se duvida do que da realidade da ressurreição. Deste acontecimento inesperado e totalmente ímpar na vida do jovem, o mestre tem que ser o pregador infatigável : ‘Vi o Senhor!...em ti’.
 
Fonte :
*Dom Abade Bernardo Bonowitz, OCSO, do mosteiro trapista Nossa Senhora do Novo Mundo, em Campo do Tenente, Paraná (http://www.mosteirotrapista.org.br/)
**Revista Pedras Vivas – Ano XVI – nrº 72 – Janeiro/Fevereiro de 2013, editada pelos oblatos seculares do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro/RJ
Contato : osrio@osb.org.br

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