Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
‘Original, em relação à tradição
beneditina, sem o ter premeditado, o cemitério do mosteiro de Thiên Binh formou
sua configuração atual ao longo dos anos, em resposta a necessidades concretas.
É aberto a outras congregações religiosas masculinas e femininas e até a leigos
católicos, e esteve no coração de uma reflexão comunitária sobre sua função
espiritual.
Um monaquismo missionário…
O mosteiro foi fundado em 1970 pelo P.
Thadée, vindo de Thiên An, mosteiro que tinha sido fundado pelo mosteiro
Pierre-qui- Vire no final de 1930. Desde o começo, a ideia de um monaquismo
missionário esteve sempre presente, sobretudo no contexto político muito
difícil de guerra. Tratava-se de responder às necessidades das populações
desfavorecidas e desenraizadas, vindas das regiões rurais, por causa do
conflito, e ao mesmo tempo, dar uma formação aos jovens de origem modesta,
graças a uma escola técnica.
Hoje a situação econômica e política é
muito diferente, mas continuam a existir populações desfavorecidas e
desenraizadas, vindas das áreas rurais à procura de uma vida melhor na grade
cidade de Saigon. O mosteiro continua a esforçar-se para responder a suas
necessidades urgentes, não mais no setor da educação, mas no da saúde. O
mosteiro tem um dispensário, aonde os pobres são tratados pela medicina
tradicional e aonde é distribuída gratuitamente água potável, de uma fonte que
graças a Deus, nunca secou.
Esta preocupação pela saúde física caminha
junto com a da saúde espiritual. Os monges beneditinos acolhem e acompanham os
que precisam, rezam por eles, celebram missas por eles; e são igualmente muito
agradecidos para com seus benfeitores, graças aos quais podem manter essas
atividades.
Sem que a vida beneditina seja afetada, o
mosteiro tem trocas muito dinâmicas com o exterior, em dons múltiplos e
recíprocos, geradores de vida. Mas os defuntos não estão excluídos desse
processo.
… que inclui igualmente os defuntos.
Devido à relativa pouca idade do mosteiro,
até agora morreram poucos monges, somente três, entre os quais o fundador, o P.
Thadée, que morreu no dia 31 de Janeiro de 1995. No entanto, a questão da
função espiritual do cemitério, colocou-se a partir de fatos concretos que se
impuseram ao P. Thadée : os primeiros a ser enterrados no cemitério foram
membros de uma família pobre, vítimas de uma bomba que explodiu no fim dos anos
70. Esta situação não podia deixar insensível o P. Thadée, sempre muito
preocupado em responder às urgências dos mais necessitados. Depois, as irmãs de
uma congregação vietnamita (As amantes da Cruz) pediram autorização para
enterrar ali suas irmãs defuntas, e depois outras congregações de religiosos e
religiosas fizeram o mesmo pedido. E seguiu-se o acolhimento de leigos
católicos defuntos. Houve um motivo muito prático para estes pedidos vindos do
exterior, a falta de espaço na metrópole de Hô-Chi-Minh-Cidade. É impossível
aumentar, ou até manter cemitérios, além de que isso não entra nas prioridades
do governo comunista. A cremação é muito espalhada no país e a única solução
diante da falta de espaço, mas é difícil de ser aceita por certos católicos,
daí a procura de cemitérios.
A alegria de poder repousar em paz, ao
lado de um lugar de oração, foi outro motivo muito compreensível para católicos
fervorosos, religiosos, ou não. Isto dá ao cemitério de Thiên Binh uma
fisionomia muito original no mundo beneditino (tanto mais que o cemitério está
fora da clausura) : um cemitério inter-congregacional, masculino e feminino,
aberto igualmente a leigos. Isto levou a comunidade a esclarecer,
progressivamente, a função espiritual do cemitério. Esta reflexão foi feita ao
longo de vários anos, à luz do Espírito Santo, e levou a descobrir nessa
situação particular, uma espécie de prolongamento dos contatos múltiplos que o
mosteiro mantem com o exterior. Um prolongamento inscrito na comunhão dos
santos, celebrada pela Igreja e ao mesmo tempo na memória dos antepassados, tão
cara aos Vietnamitas. De fato, é muito importante para os vivos, na cultura
vietnamita, ter consciência de tudo o que devem àqueles que os precederam, e
honrá-los.
A diversidade de ‘ocupantes’ do cemitério
reflete também a diversidade da Igreja, e é bom imaginar que esses encontros
com o exterior, começados quando estavam vivos, continuam depois da morte. É
bom ver nisso a continuação da atividade missionária, tão cara ao fundador, e
aos seus sucessores. Além disso, quem sabe o que o mosteiro deve a esses
antepassados, que agora estão na luz de Deus? Em troca de um pedaço de chão,
quantas graças obtidas pela intercessão desses santos para a continuação das
atividades realizadas por meio deles e em favor dos vivos?
A celebração do ciclo vida-morte-vida
Em ação de graças por esta comunhão entre
vivos e defuntos, é celebrada uma missa, cedinho, no cemitério sempre a 2 de
Novembro, quando a Igreja comemora os fiéis defuntos. Nesta ocasião, as
famílias religiosas e biológicas das pessoas enterradas no cemitério, juntam-se
à comunidade dos monges para prestar homenagem aos seus antepassados na oração
e na celebração da Eucaristia. A fumaça do incenso acompanha estas orações e os
pauzinhos continuam a queimar em cada túmulo. É um momento muito importante de
comunhão e de recolhimento, que torna palpável o mistério da vida e da morte
inscritas no mesmo ciclo.
Este ciclo vida-morte-vida materializa-se
de um outro modo no cemitério. O visitador de fora verá, com surpresa, que aí
crescem muitas plantas : flores, ou plantas decorativas, em cima dos túmulos,
nos vasos de terra, mas igualmente arbustos, pequenas palmeiras, e numa parte
do cemitério açafrão, com cujas raízes os monges fazem medicamentos. Esta
vegetação faz também do cemitério um lugar de refúgio para muitos pássaros.
Trata-se de um espaço que materializa o fato que a vida continua e que é mais
forte que a morte, o que está no coração da nossa fé.
Este cemitério ao longo das circunstâncias
(nas quais se pode ver a mão de Deus) impôs-se uma espécie de prolongamento da
atividade missionária e do acolhimento do mosteiro no coração da vocação
monástica beneditina. Inscrevendo-se de modo particular e aberta ao mesmo tempo
na Igreja e no ciclo vida-morte-vida, é igualmente um lugar que reflete a
comunhão dos santos. Demos graças a Deus por todos os frutos que esse lugar
produz nos corações.’
Fonte : *Artigo na íntegra
https://www.aimintl.org/pt/communication/report/118
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