quarta-feira, 14 de maio de 2025

O cemitério do mosteiro beneditino de Thiên Binh aberto à vida

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

*Artigo de Nathalie Raymond


‘Original, em relação à tradição beneditina, sem o ter premeditado, o cemitério do mosteiro de Thiên Binh formou sua configuração atual ao longo dos anos, em resposta a necessidades concretas. É aberto a outras congregações religiosas masculinas e femininas e até a leigos católicos, e esteve no coração de uma reflexão comunitária sobre sua função espiritual. 

Um monaquismo missionário…

O mosteiro foi fundado em 1970 pelo P. Thadée, vindo de Thiên An, mosteiro que tinha sido fundado pelo mosteiro Pierre-qui- Vire no final de 1930. Desde o começo, a ideia de um monaquismo missionário esteve sempre presente, sobretudo no contexto político muito difícil de guerra. Tratava-se de responder às necessidades das populações desfavorecidas e desenraizadas, vindas das regiões rurais, por causa do conflito, e ao mesmo tempo, dar uma formação aos jovens de origem modesta, graças a uma escola técnica.

Hoje a situação econômica e política é muito diferente, mas continuam a existir populações desfavorecidas e desenraizadas, vindas das áreas rurais à procura de uma vida melhor na grade cidade de Saigon. O mosteiro continua a esforçar-se para responder a suas necessidades urgentes, não mais no setor da educação, mas no da saúde. O mosteiro tem um dispensário, aonde os pobres são tratados pela medicina tradicional e aonde é distribuída gratuitamente água potável, de uma fonte que graças a Deus, nunca secou.

Esta preocupação pela saúde física caminha junto com a da saúde espiritual. Os monges beneditinos acolhem e acompanham os que precisam, rezam por eles, celebram missas por eles; e são igualmente muito agradecidos para com seus benfeitores, graças aos quais podem manter essas atividades.

Sem que a vida beneditina seja afetada, o mosteiro tem trocas muito dinâmicas com o exterior, em dons múltiplos e recíprocos, geradores de vida. Mas os defuntos não estão excluídos desse processo. 

… que inclui igualmente os defuntos.

Devido à relativa pouca idade do mosteiro, até agora morreram poucos monges, somente três, entre os quais o fundador, o P. Thadée, que morreu no dia 31 de Janeiro de 1995. No entanto, a questão da função espiritual do cemitério, colocou-se a partir de fatos concretos que se impuseram ao P. Thadée : os primeiros a ser enterrados no cemitério foram membros de uma família pobre, vítimas de uma bomba que explodiu no fim dos anos 70. Esta situação não podia deixar insensível o P. Thadée, sempre muito preocupado em responder às urgências dos mais necessitados. Depois, as irmãs de uma congregação vietnamita (As amantes da Cruz) pediram autorização para enterrar ali suas irmãs defuntas, e depois outras congregações de religiosos e religiosas fizeram o mesmo pedido. E seguiu-se o acolhimento de leigos católicos defuntos. Houve um motivo muito prático para estes pedidos vindos do exterior, a falta de espaço na metrópole de Hô-Chi-Minh-Cidade. É impossível aumentar, ou até manter cemitérios, além de que isso não entra nas prioridades do governo comunista. A cremação é muito espalhada no país e a única solução diante da falta de espaço, mas é difícil de ser aceita por certos católicos, daí a procura de cemitérios.

A alegria de poder repousar em paz, ao lado de um lugar de oração, foi outro motivo muito compreensível para católicos fervorosos, religiosos, ou não. Isto dá ao cemitério de Thiên Binh uma fisionomia muito original no mundo beneditino (tanto mais que o cemitério está fora da clausura) : um cemitério inter-congregacional, masculino e feminino, aberto igualmente a leigos. Isto levou a comunidade a esclarecer, progressivamente, a função espiritual do cemitério. Esta reflexão foi feita ao longo de vários anos, à luz do Espírito Santo, e levou a descobrir nessa situação particular, uma espécie de prolongamento dos contatos múltiplos que o mosteiro mantem com o exterior. Um prolongamento inscrito na comunhão dos santos, celebrada pela Igreja e ao mesmo tempo na memória dos antepassados, tão cara aos Vietnamitas. De fato, é muito importante para os vivos, na cultura vietnamita, ter consciência de tudo o que devem àqueles que os precederam, e honrá-los.

A diversidade de ‘ocupantes’ do cemitério reflete também a diversidade da Igreja, e é bom imaginar que esses encontros com o exterior, começados quando estavam vivos, continuam depois da morte. É bom ver nisso a continuação da atividade missionária, tão cara ao fundador, e aos seus sucessores. Além disso, quem sabe o que o mosteiro deve a esses antepassados, que agora estão na luz de Deus? Em troca de um pedaço de chão, quantas graças obtidas pela intercessão desses santos para a continuação das atividades realizadas por meio deles e em favor dos vivos?

A celebração do ciclo vida-morte-vida

Em ação de graças por esta comunhão entre vivos e defuntos, é celebrada uma missa, cedinho, no cemitério sempre a 2 de Novembro, quando a Igreja comemora os fiéis defuntos. Nesta ocasião, as famílias religiosas e biológicas das pessoas enterradas no cemitério, juntam-se à comunidade dos monges para prestar homenagem aos seus antepassados na oração e na celebração da Eucaristia. A fumaça do incenso acompanha estas orações e os pauzinhos continuam a queimar em cada túmulo. É um momento muito importante de comunhão e de recolhimento, que torna palpável o mistério da vida e da morte inscritas no mesmo ciclo.

Este ciclo vida-morte-vida materializa-se de um outro modo no cemitério. O visitador de fora verá, com surpresa, que aí crescem muitas plantas : flores, ou plantas decorativas, em cima dos túmulos, nos vasos de terra, mas igualmente arbustos, pequenas palmeiras, e numa parte do cemitério açafrão, com cujas raízes os monges fazem medicamentos. Esta vegetação faz também do cemitério um lugar de refúgio para muitos pássaros. Trata-se de um espaço que materializa o fato que a vida continua e que é mais forte que a morte, o que está no coração da nossa fé.

Este cemitério ao longo das circunstâncias (nas quais se pode ver a mão de Deus) impôs-se uma espécie de prolongamento da atividade missionária e do acolhimento do mosteiro no coração da vocação monástica beneditina. Inscrevendo-se de modo particular e aberta ao mesmo tempo na Igreja e no ciclo vida-morte-vida, é igualmente um lugar que reflete a comunhão dos santos. Demos graças a Deus por todos os frutos que esse lugar produz nos corações.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.aimintl.org/pt/communication/report/118


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