sexta-feira, 8 de maio de 2020

Comissão Covid-19: o papado se prepara para outra crise


Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Mirticeli Dias de Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa da Santa Sé


Papa Francisco tem pressa. E são os seus mais estreitos colaboradores a confirmarem isso. ‘Precisamos agir imediatamente’, disse o pontífice ao cardeal Peter Turkson que cuida do departamento de ‘desenvolvimento humano e integral’ do Vaticano. A verdade é que, mesmo em modalidade home office, Bergoglio trabalha a todo vapor. Nesta semana, por exemplo, ele se reuniu com os chefes de todos os órgãos vaticanos – os chamados dicastérios – para tratar do plano pós-pandemia. Se a Igreja é um hospital de campo, como ele gosta de dizer, é hora de fazer valer esse título.

Em todas as crises mundiais dos séculos 19 e 20, é importante ressaltar que a Igreja Católica assumiu um papel fundamental. Em várias épocas, não foram poucas as pessoas que se destacaram na promoção da dignidade humana em meio a um cenário de destruição. Papa Bento XV, que considerou a Primeira Guerra Mundial uma ‘tragédia inútil’, não só ampliou o trabalho das obras caritativas da Igreja no período – cujos beneficiários eram de todas as raças e religiões –, como também ajudou a reencontrar os desaparecidos da guerra, a pedido das famílias. Só o episcopado alemão, à época, atendeu cerca de 800 mil solicitações de ajuda.

Entre os anos de 2014 a 2018, estima-se que a instituição tenha doado mais de U$ 1 milhão para socorrer os mais vulneráveis na Síria e no Iraque, só para citar um exemplo. Recentemente, também foi criado o fundo para o Oriente Médio, que atuará no enfrentamento da pandemia em países atingidos pela guerra.

Agora, o pontífice cria uma força-tarefa que, em termos de estrutura, é uma das mais audaciosas já criados pela Igreja na era contemporânea. O órgão contará com o trabalho articulado de vários departamentos da cúria romana, os quais, desde já, começam a refletir sobre a ‘crise gerada pela crise’, em referência ao impacto econômico que toda essa situação irá causar. Destaque para o plano de auxílio aos mais vulneráveis, já que, na visão do santo padre, os mais pobres tendem a ser os mais esquecidos num eventual plano de retomada. Dividido em 5 grandes campos de trabalho, essa task force, como comumente é chamada no Vaticano, traçará uma espécie de plano de reconstrução em parceria com as conferências episcopais do mundo. Além disso, o projeto pretende contar com ampla adesão por parte dos governos, através da secretaria de estado da Santa Sé.

Um apelo às pessoas de fé

Mas muito além do protagonismo da Igreja em várias obras de assistencialismo ao longo da história, é hora de dar um passo além, na visão do papado atual. Francisco chegou a dizer que ‘as medidas paliativas não resolvem’, pensando desde já numa linha de ação conjunta que envolva os cristãos do mundo inteiro. ‘Nem assistencialismo nem pietismo, mas sim a compaixão que vem do coração’, disse ele no mês passado.

Assim como Francisco conseguiu criar uma frente ecumênica capaz de pensar no numa ecologia integral, ele também faz um apelo para que os homens de fé se unam nessa mobilização global de reconstrução. E prontamente atendeu ao apelo do Alto Comitê para a Fraternidade Humana, que convocou as pessoas de fé de todas a religiões a rezarem pela humanidade, no próximo dia 14 de maio.

Talvez seja cedo pensar  que uma revolução cristã com forte apelo social comece a se estruturar, mas é bem verdade que Francisco, como nenhum outro que ocupou o trono de Pedro até hoje, tem total capacidade de levá-la adiante. Muito se fala do mundo pós-coronavírus, sem se dar conta que, no caso do cristianismo, grandes crises sempre o redimensionaram para sua própria essência. Quais respostas os bispos, os padres e os leigos darão frente aos tempos difíceis que virão? Até quando o que mais distingue o cristianismo das outras religiões –, tais como a esperança, a caridade e a compaixão –, dará lugar às discussões infrutíferas de grupos que instrumentalizam a fé para corresponder às cartilhas partidárias?


Fonte :
*Artigo na íntegra

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