domingo, 26 de maio de 2019

Freira franciscana resgata crianças afetadas pelo HIV/Aids no Quênia

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 Ir. Lilly Manavalan, da congregação franciscana, na clínica St. Clare, no norte do Quênia, em 1º de maio
*Artigo de Doreen Ajiambo
Tradução : Ramón Lara


‘Quando o sol nasce nessa remota região do norte do Quênia às 6 da manhã, é um novo amanhecer para a missionária irmã Lilly Manavalan. Seu dia começa com uma caminhada de mais de uma hora através de um vale profundo para chegar às ruas onde encontra crianças vulneráveis vivendo com HIV.

Em um dia normal, ela leva duas crianças, filhos que perderam seus pais e estão infectados com o vírus para o Centro Santa Clara para Meninas em Nchiru, no Quênia, onde a religiosa oferece um lar com amor e um futuro promissor enquanto vivem o convite para um novo começo em Cristo.

Esta é minha paixão e realmente gosto de estar com os pobres’, disse a freira franciscana. ‘Sinto-me muito feliz e satisfeita quando ajudo os pobres, especialmente aqueles que sofrem de HIV/AIDS’.

Manavalan, que é do estado de Kerala, no sudoeste da costa de Malabar, na Índia, é enfermeira no Centro Santa Clara. Com muita paixão e resiliência, ela ajuda as pessoas pobres, muitas vivendo com o HIV. Também desenvolveu o desejo de trabalhar no norte do Quênia, depois que sua colega informou que muitas pessoas nesta parte do mundo não tinham conhecimento sobre HIV, AIDS ou saúde sexual, disse ela.

O Índice de Estigma e Discriminação para o HIV e a AIDS em 2014, do Nordeste da África, mostra que 98% das pessoas vivendo com HIV nessa região não têm laços estreitos com suas famílias. O relatório também indica que 83% dos moradores acreditam que as pessoas que são soropositivas são punidas por Deus por mau comportamento, enquanto 72% acreditam que o vírus é disseminado por profissionais do sexo.

Manavalan veio a Samburu em 2009 especificamente para ajudar aqueles que sofrem de preconceito relacionado ao HIV/AIDS.

Eu me comprometi a lutar para superar o estigma e a discriminação’, disse Manavalan. ‘Percebi que muitos não sabem como o HIV é disseminado e não acreditam que estão em risco. Outros não querem nem conviver com qualquer pessoa que viva com o vírus’.

Moradores da tribo Samburu - geralmente vivendo em grupos de cinco a 10 famílias, acreditam que o HIV não pertence a eles, mas a comunidades externas. Os moradores consideram pessoas com HIV/AIDS amaldiçoadas, pecadoras e entre os mortos-vivos.

Recentemente, um grupo de homens e mulheres bem-vestidos nas ruas empoeiradas foi ouvido usando frases ásperas para se referir às pessoas que vivem com o vírus, afastando-se deles.

O HIV não é a nossa doença, é a doença do povo urbano’, disse John Lepariyo, 60 anos, com voz baixa e profunda. ‘As pessoas que sofrem de tal tipo de doença são consideradas amaldiçoadas e tentamos separá-las de outros membros da comunidade porque tememos que elas possam disseminar o vírus.’

O povo samburu é pastoralista e seminômade, cujas vidas se centram no gado, cabras, ovelhas e camelos. As pessoas desta região estão fortemente enraizadas em sua cultura, normas, crenças e valores. Como resultado, algumas pessoas infectadas, especialmente crianças, foram abandonadas por suas famílias e comunidades nas ruas e deixadas para morrer. Outros temem ir para o atendimento médico nos postos de saúde próximos devido à discriminação.

Manavalan disse que oferece às crianças uma dieta nutritiva para impulsionar seu sistema imunológico, educação e os medicamentos necessários para combater o vírus.

Damos a eles o melhor alojamento, remédios e tratamento gratuito’, disse Manavalan. ‘Também aconselhamos e ensinamos essas crianças o catecismo. Queremos que saibam que Deus pertence a todos nós, ainda nessa condição’.

A abordagem mudou a vida de muitas crianças que foram falsamente acusadas de espalhar o vírus mortal para quem tentar ajudá-las, disse ela.

Joyce, de dezesseis anos de idade (nome fictício) é uma das garotas resgatadas por Manavalan das ruas. Ela foi expulsa em sua aldeia depois que os idosos descobriram que ela era HIV positiva. A razão da sua expulsão da aldeia foi, segundo eles, por medo de infectar outras pessoas com o vírus.

Deprimida e sem ter para onde ir, procurou refúgio nas ruas antes de ser resgatada e levada para o centro dirigido pelas irmãs da Índia. O centro atende mais de 500 crianças.

Eu me senti tão deprimida, tão de coração partido e fora deste mundo’, disse Joyce, que foi resgatada em Wamba, uma aldeia na região de Samburu. ‘Minha mãe e todos me deixaram porque eu era HIV positivo. Um amigo começou a contar a minha história para os meus colegas e eu comecei a me sentir solitária e isolada. As pessoas pararam de estar comigo’.

Hoje, três anos depois que Joyce foi resgatada, as lembranças de seu tempo na aldeia e nas ruas ainda estão frescas em sua mente. No entanto, graças a Manavalan, Joyce é feliz, encontra-se saudável e está indo muito bem na escola.

Agora me sinto tão amada e cuidada’, disse ela. ‘Quando eu terminar o ensino médio, vou para a faculdade, depois volto para o trabalho no centro e ajudo as crianças que vivem com HIV. Eu aconselho as pessoas com a mesma condição a aceitarem seu status e serem apenas elas mesmas’.

Martha (nome fictício) foi resgatada há cinco anos por Manavalan, depois de ser expulsa de sua aldeia e deixada para morrer na rua.

Eu estava muito desnutrida quando fui trazida para este centro’, disse a jovem de 14 anos de Archers Post, uma pequena cidade no noroeste do Quênia. ‘Estava esperando a morte porque já tinha perdido a esperança na vida. A irmã Lilly me levou para o hospital e foi quando recebi medicamentos e tratamento. Agora estou feliz e quero me tornar enfermeira quando terminar o ensino médio’.

O padre Francis Riwa, fundador do centro de resgate, dirige o centro, a clínica e as equipes com a irmã Manavalan, para resgatar as crianças nas ruas. Duas outras irmãs Claristas Franciscanas ajudam no centro e na clínica.

Riwa elogiou as freiras pela prestação de serviços de saúde, aconselhamento e apoio psicológico, bem como assistência e auxílio para aqueles que vivem com HIV/AIDS.

Quero agradecer às irmãs porque mostraram a essas crianças o verdadeiro amor de Jesus Cristo’, disse Riwa, de 62 anos, que também é encarregada e administra escolas e outros lares na região. ‘Elas abraçaram e aconselharam essas crianças. Muitas se recuperaram de feridas emocionais e têm um propósito para viver’.

O padre, que também é médico, disse que há muitos mitos e equívocos na região sobre como se pode contrair o HIV. Ele incentivou as irmãs a continuarem educando as comunidades sobre o vírus.

Eu disse às pessoas por aqui que o vírus só pode ser transmitido de uma pessoa para outra através do leite materno, sangue, sêmen, mucosa anal e fluido vaginal’, disse ele. ‘A maioria das pessoas acredita que se pode pegar o HIV de alguém, abraçando-o ou apertando a mão’.

As autoridades locais contatadas pelo Global Sisters Report não fizeram comentários sobre os problemas das pessoas que vivem com HIV/AIDS em Samburu. Os anciãos, por outro lado, disseram que era impossível para as autoridades locais ir contra a cultura e as crenças da comunidade, mesmo se quisessem falar com verdade sobre o vírus.

Esses líderes nasceram aqui e conhecem nossa cultura. Eles estão muito conscientes de que tememos as pessoas que vivem com HIV/AIDS’, disse Lepariyo, um ancião.

Enquanto isso, Manavalan prometeu continuar resgatando mais crianças e educando a comunidade.

Eu quero salvar mais vidas de crianças vulneráveis das ruas’, disse ela. ‘Meu desejo é ver a comunidade aceitar pessoas vivendo com HIV’.’


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