sexta-feira, 14 de junho de 2019

O novo papado (que não querem)


Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Em 2017, papa Francisco abraçou criança que perguntou se seu pai, que morreu declarando-se ateu, iria para o céu. 
Em 2017, papa Francisco abraçou criança que perguntou se seu pai,
que morreu declarando-se ateu, iria para o céu

*Artigo de Mirticeli Dias de Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa da Santa Sé


‘Desde Pio IX, quando iniciaram a cultivar uma certa devoção ao papa após o período conturbado marcado pela presença dos ‘papas-reis’ da Renascença, a figura do sumo pontífice tem sido alvo de toda espécie de instrumentalização. Tal empatia em relação a essa liderança - tida como positiva para a consolidação e a unificação da Igreja Católica após a queda do Estado Pontifício -, aos poucos foi dando lugar a um misto de sentimentos de rejeição e aceitação provocados pela polarização que marcou o século XX, sobretudo no período da guerra fria e que, pelo jeito, volta a compor o cenário social.

Do papa soberano preocupado com os negócios do seu pequeno estado, ressurge, com toda força, a figura do pastor universal salvaguardado por uma infalibilidade que se transformou em dogma no século XIX.

Como sabemos, o ultramontanismo teve um papel fundamental na instauração desse novo papado, marcado pela tentativa de consolidar um monarquismo universal ‘mais espiritual’. Com o poder temporal ruindo diante dos seus olhos, Pio IX conseguiu, com êxito, restaurar a aquela autoridade espiritual perdida desde as tensões do cisma do Ocidente.

Anos depois, com menos ingerências externas de caráter político, João XXIII e Paulo VI inauguram uma práxis diplomática marcada pelo diálogo e pela conciliação. A partir disso, percorreu-se um caminho sem volta (ainda bem!). Não se condena somente uma ideologia específica, mas todas elas. Não se demonizam mais espectros políticos, mas tenta-se demonstrar que, independente do lado, é possível lutar por uma sociedade mais justa a partir dos valores do Evangelho. O proselitismo dá lugar à promoção do encontro com Deus. O debate torna-se antídoto contra extremismos e polarizações.

Nas reuniões que antecedem o conclave da atualidade, traça-se a figura do papa capaz de dialogar com a sociedade e a corresponder aos sinais dos tempos. Diálogo passa a ser a palavra de ordem e o caráter humanizador do Evangelho o fio condutor.

O papa João XXIII é associado ao comunismo por ter promovido a Ospolitik no Concílio Vaticano II. Paulo VI, segundo os tradicionalistas da época que assumiram uma postura de contra-conduta, foi quem destruiu ‘a missa de sempre’ através de sua reforma litúrgica e, por consequência, a própria Igreja Católica.

O papa Francisco, por sua vez, é visto com um outro comunista por preocupar-se demais com as questões sociais. Em um mundo que se polariza a cada ano que passa, a interpretação é que o diálogo destrói em vez de agregar. E pensar que uma das missões do papa é justamente a de promover o respeito mútuo e a de lutar contra tudo aquilo não condiz com a fé que professa. Porém, pelo jeito, para muitos não é o testemunho cristão que conta, mas transformar a fé no cavalo de batalha de disputas ideológicas.’


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