sábado, 30 de novembro de 2024

Santo André, Apóstolo (século I)

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

*Artigo da redação da revista Ave Maria


‘Maravilha e encanta a espontaneidade de André, irmão de Simão, nascido em Betsaida. Junto com o pai, Jonas, e com o irmão dedicava-se à pesca no lago de Tiberíades, na Galileia, e morava em Cafarnaum. No seu nome percebe-se que a influência da cultura grega tinha chegado também àquela região.

O episódio mais simpático de sua vida nos é narrado no Evangelho de João (cf. Jo 1,35-42). André tinha ido para as margens do Jordão junto com João, o futuro evangelista, para escutar João Batista. Este, indicando-lhes Jesus, disse : ‘Eis o Cordeiro de Deus! ‘E os dois discípulos, ouvindo-o falar assim, seguiram Jesus. Jesus então se voltou e, vendo que o seguiam, disse : ‘Que procurais?’. Responderam-lhe : ‘Rabi (que significa ‘mestre’), onde moras?’. Disse-lhes : ‘Vinde e vede’. Foram, pois, e viram onde morava e ficaram aquele dia junto dele; eram cerca de quatro horas da tarde’ (Jo 1,36-39).

O encontro deve ter sido particularmente marcante, visto que os dois recordavam até mesmo a hora daquele dia inesquecível : ‘Eram cerca das quatro horas da tarde’ (diz o texto bíblico ‘Era cerca da hora décima’ (Jo 1,39) e a nota confirma a equivalência, pelas quatro horas da tarde].

‘Um dos dois que tinham ouvido as palavras de João e o haviam seguido era André, irmão de Simão Pedro’ está escrito em João1,40. São João Crisóstomo faz este comentário : ‘André, tendo ficado perto de Jesus e tendo aprendido muitas coisas, não manteve escondido em si esse tesouro, mas apressou-se a correr para junto de seu irmão para torná-lo participante disso’. Já o destino dos dois estava marcado para sempre, porque o Mestre havia colocado seus olhos neles.

Esse, de fato, segundo a narrativa do evangelista Marcos, ‘passando junto do mar da Galileia, viu Simão e André, irmão de Simão, enquanto lançavam as redes ao mar; eram de fato pescadores. Jesus disse-lhes : ‘Segui-me, eu vos farei pescadores de homens’. E logo, deixadas as redes, seguiram-no’ (Mc 1,16). André foi com João entre os mais íntimos de Jesus. A ele se dirigiu Filipe para que dissesse a Jesus que os gregos o queriam ver (cf. Jo 12,20-23). Quando Jesus pediu que dessem de comer à multidão que o havia escutado, André apresentou ao Mestre um menino com cinco pães e dois peixes (cf. Jo 6,8-9).

No monte das Oliveiras perguntou a Jesus, junto com Pedro, Tiago e João, quando aconteceria a destruição do maravilhoso templo que brilhava diante dos seus olhos (cf. Mc 13,3). Depois da paixão, André estava com os outros apóstolos no Cenáculo aguardando a vinda do Espírito Santo (cf. At 1,13) e depois de Pentecostes, segundo a tradição, teria encorajado o apóstolo São João a narrar os fatos e as palavras de Jesus no seu Evangelho. Segundo Orígenes, André teria pregado o Evangelho na Cítia, no Ponto Euxino, na Capadócia, na Galácia e na Bitínia. Depois, segundo São Jerônimo, teria passado a evangelizar a Acaia, firmando-se em Patrasso, onde teria sofrido o martírio aproximadamente nos anos 60, pregado em uma cruz, cujos braços eram dispostos diagonalmente. Daí o nome de cruz de Santo André. 

Mais tarde, no século IV, suas relíquias foram transportadas para Constantinopla, que o escolheu como seu padroeiro. A nova Roma possuía o ‘troféu’ do irmão de Pedro e deu a André o título de Protocleto, isto é, de primeiro chamado, mesmo que o mesmo título diga respeito igualmente a São João evangelista.

Em 1208, os alfenenses levaram para a sua cidade as relíquias do apóstolo e, em 1462, deram sua cabeça à Igreja de Roma. Em sinal de reconciliação, o Papa Paulo VI, em 1964, restituiu essa relíquia para a igreja irmã de Constantinopla.

Atualmente, a relíquia da cabeça de Santo André é conservada em Patrasso.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/santo-andre-apostolo-seculo-i.html

quinta-feira, 28 de novembro de 2024

A missão de Irmã Pia gera luz às crianças cegas de Ruanda

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

*Artigo de Tomasz Zielenkiewicz

  

‘Com uma população de 14 milhões de habitantes, Ruanda é recordado por causa do aconteceu no início da década de 80. Naquele período, a Abençoada Virgem Maria apareceu às jovens de Kibeho. A Igreja Católica reconheceu oficialmente todas as aparições e peregrinos têm vindo de todo o mundo. Nas proximidades, encontra-se uma escola e um centro educativo para os cegos administrados pelas Irmãs Franciscanas Polonesas Servas da Cruz.

A fundação foi em 2008. Em 2009, foi inaugurada uma escola básica - a primeira para cegos em todo Ruanda. Há também duas escolas secundárias, uma delas especializada com diferentes módulos educativos. Atualmente, o centro é frequentado por 185 crianças. A equipe que trabalha no espaço é formada por duas religiosas da Polônia, uma do Quênia, três de Ruanda, além de vários funcionários leigos.

A Irmã Pia Gumińska explica que contemplava a ideia de servir como missionária há anos. «Disse a Jesus que, se houvesse a necessidade, eu iria. Houve uma oferta das superiores, por isso quis conhecer esta jovem Igreja e vim para cá, com total abertura», salienta. As religiosas em Kibeho querem incutir nas crianças a ideia de Madre Rosa Czacka, fundadora da Congregação das Irmãs Franciscanas Servas da Cruz, agora Beata : «queremos mostrar-lhes que conseguem ser independentes e que podem demonstrar aos outros que a deficiência não impede o desenvolvimento e o sucesso. Queremos dar-lhes esperança através da nossa atividade».

No entanto, muitas das crianças das quais as religiosas cuidam foram abandonadas pelas famílias. É por isso que muitas vezes chegam ao centro mais velhas, com 12 ou 13 anos. Os alunos da escola não são preguiçosos. Levantam-se cedo, começam o estudo individual às 6 da manhã, vão para a escola às 8 e ficam lá até às 17h. Depois da escola, têm atividades desportivas e, em seguida, novamente o tempo de estudo individual. O grupo inclui alguns alunos que se distinguem. Um deles é Jean de Dieu Niyonzima, que ficou em quinto lugar no país nos exames nacionais do final do ensino básico. Ele disse à imprensa local que gostaria de estudar jornalismo e línguas.

As religiosas estão muito orgulhosas de cada resultado dos seus protegidos. «As crianças são extremamente criativas. Conseguem compor uma canção para o Dia dos Professores, por exemplo. Cantam a várias vozes e em diferentes tonalidades, e também temos um coro da escola. Atuam em todas as celebrações do colégio e dirigem os cânticos na Missa de Domingo», diz a Irmã Pia. Dois professores dão aulas de dança, frequentadas por crianças mais novas e mais velhas com deficiência visual.

A escola é o lar de um grupo de crianças albinas também. Elas sentem-se seguras aqui, apesar do seu destino poder ser trágico na África. «Um dia, uma mulher trouxe duas crianças albinas para a escola, dizendo que só a terceira, deixada em casa, era ruandesa», conta a religiosa. «É por isso que é necessário dedicar-lhes um amor especial», sublinha.

As religiosas insistem que a Providência está olhando por elas. «Deus, cuida muito bem de nós, enviando-nos financiadores; a maior parte das nossas atividades é possível graças a donativos, principalmente da Polônia e de organizações de outros países», acrescenta a Irmã Pia :

“Por vezes, basta pensarmos numa nova ideia e, de repente, há pessoas que nos ajudam a materializá-la.”

A Madre Rosa Czacka é uma patrona especial nas tarefas quotidianas das religiosas. «Ela aceitou a cegueira como vontade de Deus, por isso damos o nosso melhor para oferecer fé às crianças. Isto é fácil, na medida em que a sociedade ruandesa é uma sociedade de crentes em Deus. A gratidão e a alegria são visíveis nos rostos das crianças». «Até as mais pequenas prendas que recebem as levam às lágrimas. Quando há uma festa de aniversário, a alegria é imensa e ficam gratas por alguém se lembrar de uma ocasião como esta», diz a Irmã Pia.

Palavras como alegria, gratidão e vontade de aprender são frequentemente ouvidas aqui em Kibeho. As crianças recuperam a convicção de que podem alcançar algo na vida. Ficam orgulhosas quando conseguem mostrar em casa que sabem ler. Criam chapéus e cachecóis durante os laboratórios de tricô, e tudo isto constitui uma excelente motivação para as religiosas. «O fato de estarmos aqui é obra de Deus, sentimo-lo. Somos poucas, e o centro é grande, por isso esperamos por novas vocações», frisa a Ir. Pia. «Aqui, as pessoas desfrutam do que têm e têm pouco», sublinha ela. Embora este seja apenas o primeiro ano do seu serviço no centro, a religiosa já adquiriu a marca distintiva do sorriso dos seus assistidos.

A chegada do embaixador da Polônia a Ruanda será um apoio significativo para as religiosas. Estão sendo feitos preparativos para abrir a embaixada. Em fevereiro de 2024, o centro recebeu o presidente da Polônia, Andrzej Duda, e a esposa, Agata Kornhauser-Duda.’


Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2024-11/projeto-sisters-africa-ruanda-pia-guminska-luz-criancas-cegas-24.html

terça-feira, 26 de novembro de 2024

Judite, libertadora do povo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Pedro Nascimento,

leigo missionário comboniano 

 

‘Judite era viúva e vivia na cidade de Betúlia. Fora casada com Manassés. Judite, mulher de Deus, «jejuava todos os dias da sua viuvez, exceto ao sábado e nas suas vésperas, nas festas da lua nova e suas vésperas, nas festas e nos dias de alegria para a casa de Israel» (Jt 8, 6).

Sucede que uma grande ameaça de destruição do povo de Israel, e especialmente da cidade de Betúlia, fez com que o povo quisesse entregar-se ao inimigo. Holofernes, general de Nabucodonosor, rei da Assíria, inimigo prepotente e insolente de Deus, cercou a cidade de Betúlia com dezenas de milhares de homens e impediu-os de terem acesso a água e comida. Por esse motivo, após trinta e quatro dias de cerco, «os recipientes de água dos habitantes de Betúlia ficaram vazios; as suas cisternas começaram a ficar esgotadas sem água para poderem beber a sua porção diária, uma vez que a água era racionada» (Jt 7, 20-21). Nessa situação, o povo decidiu render-se ao inimigo: «Para nós, é melhor sermos sua presa. Seremos seus escravos, mas as nossas vidas serão poupadas e não teremos de assistir à morte das nossas crianças diante deles, numa grande destruição» (Jt 7,27). Decidiram manter-se na cidade durante mais cinco dias e depois disso, entregar-se ao general Holofernes e ao seu exército, sedentos de destruição e pilhagem.

Depois de ter conhecimento da decisão do povo, Judite, com o ímpeto e coragem de uma profetisa, chamou os anciãos a sua casa e procurou dissuadi-los da decisão: «Apesar de tudo, dêmos graças ao Senhor, nosso Deus, que nos está a pôr à prova, tal como fez com nossos pais» (Jt 8, 25). E, confiante em Deus, teve um plano : sair da cidade com a sua escrava, ir ao encontro de general Holofernes e conseguir matá-lo. E assim fez! Com a sua beleza física, inteligência e capacidade de argumentação, conseguiu convencer o poderoso general de que o povo iria ser alvo de um castigo do seu Deus e que ele não iria perder nenhum dos seus homens nesta batalha, bastando aguardar. Durante o tempo em que esteve no acampamento, Judite encontrava-se em plena sintonia com Deus, rezando. A sua bela aparência não passava despercebida e o general desejava Judite. Por isso, uma noite, após o banquete, Judite ficou na tenda do general, o qual se encontrava bastante embriagado. Aproveitando que o general se encontrava debilitado, Judite cortou-lhe a cabeça e regressou à cidade. O povo percebeu que Deus não os abandonara e que, por intermédio de uma mulher viúva, conseguiu mostrar a sua força e grandeza. Para conseguir a libertação do seu povo, Judite foi corajosa e pôs em risco a sua própria vida. Conquistou a estima da comunidade com a sua sabedoria e coragem e tornou-se o orgulho de Israel (cf. Jt 15,9).

A história de Judite demonstra-nos como os nossos caminhos não são os de Deus. Várias vezes o Senhor nos demonstrou que nós olhamos à aparência e aos usos sociais. Quem pensaria, naquele tempo (e neste também), que um numeroso exército com um poderoso general sairia derrotado pela astúcia de uma viúva. Ela pode cantar que Deus derruba os poderosos e eleva os humildes. Deus sabe o que faz e sabe quem o ama e o segue de coração sincero! Por esse motivo, Judite, fiel a Deus e cheia do seu temor, soube compreender quanto Deus ama o Seu povo e não o abandona! 

Este livro bíblico também ajuda a compreender que, nos vários momentos da nossa vida, nem sempre confiamos plenamente em Deus e nem sempre seguimos os seus mandamentos de amor, fraternidade e paz. Infelizmente, continuamos a ser fustigados por guerras no nosso mundo : Ucrânia, Médio Oriente, Sudão, Moçambique, Etiópia e em tantos países; continuamos a ser escravos de vários poderes, sejam políticos, economicos ou outros; continuamos a viver num mundo em que Deus não é importante. Mas, além disso, temos também as nossas guerras internas e pessoais : a nossa personalidade e todos os desafios a que diariamente somos chamados; a nossa família, a nossa vida profissional, a vida social... Onde está Deus em todos os aspectos da nossa vida?

 

Vocação e missão

No plano de Deus, todos somos importantes e temos a nossa vocação e missão a cumprir. Nas palavras de São João Paulo II, Judite «é uma figura exemplar também para exprimir a vocação e a missão da mulher, chamada à igualdade com o homem, de acordo com as suas características específicas, a desempenhar um papel significativo no desígnio de Deus» (audiência geral, 29 de Agosto de 2021).

Judite sempre teve Deus como prioridade e o seu «sim» e ação destemida permitiu libertar o povo oprimido e conservar a mística no Deus da Vida. Cada um de nós tem um dom, uma pérola preciosa (uma vocação e missão específica) contida num débil vaso de barro. Precisamos discernir qual é o nosso dom para o pôr, com alegria e generosidade, ao serviço do bem comum e da vida plena.

O desafio da formação das crianças

A irmã Liée Mramadji Natingar, missionária comboniana, é diretora da escola primária São Daniel Comboni e da escola secundária com o mesmo nome em Butembo, República Democrática do Congo. Nesta zona, ela e as suas colegas vivem num contexto de total insegurança e guerra, incluindo o rapto de crianças, que preocupa todos e sobretudo os pais. A religiosa partilha conosco o seu trabalho evangelizador e de defesa da vida digna neste contexto desafiante.

«No meu trabalho no ambiente escolar, a primeira coisa que procuro é a qualidade da educação das crianças que me são confiadas, e também que elas encontrem um lugar onde se sintam seguras. A formação das crianças, que são o futuro da nação e da Igreja, é o meu campo de batalha.

No nosso contexto, o insucesso escolar é uma realidade e são muitas as causas. Quando há crianças indisciplinadas, por exemplo, chamamos os tutores e falamos com eles para tentar compreender o motivo desse comportamento. O que é que faz com que a criança durma durante a aula? Porque é que chega sempre atrasada à escola? Trabalha demasiado em casa? Não come o suficiente? Está traumatizada? Vive com os pais? Os pais estão vivos? Estas perguntas têm como objetivo descobrir a origem do problema da criança para, assim, encontrar os meios para que ela se adapte bem à escola.

Outras vezes, pode ser devido à falta de material escolar. Nesse caso, é necessário falar com os pais para que comprem à criança o que ela precisa. Por vezes, os pais mostram pouco interesse pela educação dos filhos, por exemplo, em casos de abandono paterno em que a mãe tem de tratar de tudo. Encontramos também crianças abandonadas a si próprias, com falta de roupa, alimento, etc. 

Outras dificuldades são encontradas com as crianças deslocadas pela guerra que não têm quadro, caderno ou caneta. Mesmo conseguir algo para comer todos os dias é difícil.

Há crianças que foram abandonadas pelos pais e são os avós que tomam conta delas. Nestes casos, o principal objetivo dos avós é encontrar alimento para a criança e a questão da escola não é importante e passa para segundo plano. Estas crianças sentem-se inseguras no ambiente escolar, porque não têm o que precisam para progredir nos seus estudos. 

As pessoas estão muito contentes com esta escola recentemente construída. Para elas, é uma jóia no meio da insegurança e da guerra. Dá-lhes muita esperança porque é o futuro dos seus filhos. Agora, as crianças já não têm de percorrer longas distâncias para irem à escola. Os pais confiam em mim. Sabem que, neste centro educativo, os seus filhos recebem uma boa educação, são bem acompanhados e supervisionados. A minha presença como diretora desta escola, uma religiosa africana, é uma grande alegria para eles. Para alguns, é a concretização do sonho de São Daniel Comboni de ‘salvar a África com a África’.»’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.combonianos.pt/alem-mar/artigos/8/1285/judite-libertadora-do-povo/

segunda-feira, 25 de novembro de 2024

Sobre o direito de ir e vir quando a migração se torna uma fuga

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
Um grupo de refugiados e migrantes caminha em direção à cidade de Canaan, no extremo sul do Panamá, depois de atravessar a região de Darién, uma das rotas migratórias mais letais do mundo. (Foto: Nicolo Filippo Rosso/ACNUR)

 *Artigo do Padre Alfredo J. Gonçalves, CS


‘O direito de ir e vir comporta, necessariamente, uma face tríplice : a possibilidade de migrar, a liberdade de permanecer na terra natal e o sonho antecipado de retornar (em caso de ter migrado). Os três verbos – migrar, ficar e retornar –  desenham os contornos daquele direito fundamental de todo cidadão. Concentrando o olhar no contexto atual, na imensa maioria dos casos, em lugar de desfrutar desse direito de ir e vir, os migrantes sofrem uma obrigação compulsória de deixar o próprio país, lugar onde estão sepultados os restos mortais de seus antepassados.

A migração torna-se, assim, uma fuga. Fuga da violência em todas as suas manifestações : guerras, intolerância étnico-religiosa, oposição político ideológica, conflitos localizados; fuga da situação de pobreza, miséria e fome, bem como de condições adversas que se revelam na falta de terra e trabalho ou de oportunidades para abrir caminhos em direção a uma vida melhor; fuga, enfim, dos efeitos devastadores das catástrofes cada vez mais extremadas, provocadas pelo aquecimento global e pela vertiginosa velocidade das mudanças climáticas. O planeta Terra, em sua genuína trajetória, não consegue reciclar-se ao ritmo frenético e alucinado com que a política econômica globalizada utiliza de seus recursos.

Semelhante agitação febril da humanidade, ao sacudir as placas tectônicas da economia capitalista de lucro e de mercado, sacode igualmente as ondas superficiais, provocando, dessa forma, deslocamentos humanos de massa cada vez mais frequentes. E, ao mesmo tempo, mais intensos, diversificados e complexos. Disso se conclui que o fenômeno migratório em seu conjunto, se nas décadas passadas tinha uma origem e um destino mais ou mens pré-determinados, nos dias de hoje os migrantes passam a errar pelas estradas sem saber onde replantar as raízes arrancadas à força.

Numa palavra, as migrações tornam-se mais incertas, mais inseguras e mais inquietantes. Nos rumos e horizontes dos migrantes, as nuvens se acumulam e adensam sombriamente. Nessa perspectiva, as três faces do direito de ir e vir, como vimos acima, se reduzem a uma mera fuga, não raro apressada pelas bombas, pela fome ou por estiagens e enchentes dramáticas. Na verdade, se essas três alternativas não estão contemporaneamente presentes, acaba por prevalecer apenas uma espécie de saída pressionada pelas mais diversas circunstâncias. As alternativas de permanecer como cidadão do próprio país, por uma parte, ou de retornar após uma experiência migratória, por outra, tornam-se opções descartadas de antemão por algum tipo de constrangimento violento.

A verdade é que quando se apresenta para uma pessoa ou família a necessidade de sair, deveria se apresentar, ao mesmo tempo, a possibilidade de ficar, bem como a de retornar em caso de partida. Se as três alternativas não ocorrem de forma simultânea, verificamos então que o direito de ir e vir fica limitado à obrigação de escapar a todo custo de uma situação hostil e adversa. Ao pretender migrar, a pessoa ou família experimenta simultaneamente o desejo de permanecer com as raízes no solo em que nasceu, como também o sonho de um possível retorno mais ou menos próximo. Em caso contrário, o migrante se vê diante de uma contingência de inapelável impotência. Pressionado pela necessidade ou pela perseguição, sente-se condenado a fugir. Neste caso, convém distinguir corretamente o que representa a fuga e o que representa a busca. A fuga não permite qualquer tipo de escolha : a carência e falta de novas oportunidades, os abalos climáticos ou as divergências político-ideológicas exigem via de saída, por vezes tão imediata quanto inesperada. A busca, pelo contrário, contém boa dose de opção : embora o migrante não esteja pressionado por adversidades, opta por migrar em direção a um futuro mais promissor numa outra região ou país. No primeiro caso, prevalece a necessidade de salvar a si mesmo e à família; no segundo, prevalece a liberdade de fazer uma aposta pessoal/familiar por uma mobilidade geográfica que represente, ao mesmo temo, uma mobilidade social.

Quando o migrante se vê empurrado à estrada devido à penúria, à violência ou a alguma catástrofe, está em jogo o instinto de sobrevivência. Migrar se converte em uma solução última, por mais precária que seja, mas uma solução que o submete ao destino, como se diz. De forma inversa, quando ele resolve subjetivamente aventurar-se através de novas veredas e novas oportunidades, embora não esteja à beira do desespero ou da miséria, está em jogo a liberdade de escolha. Ou seja, quando aquilo que o leva a se decidir pela partida são as circunstâncias externas, o direito de ir e vir torna-se, a rigor, definitivamente comprometido. Tal direito só existe em termos reais e verdadeiros, quando em correspondência existe também o direito de ficar. Um e outro – partir ou permanecer – devem ter o mesmo peso na balança, então sim cria-se o terreno propício para uma decisão livre e espontânea.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://migramundo.com/sobre-o-direito-de-ir-e-vir-quando-a-migracao-se-torna-uma-fuga/

sábado, 23 de novembro de 2024

Quanto pesa a fome de uma criança

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

*Artigo de Ibrahim Faltas


‘A morte é uma das poucas certezas da vida. Ela é o fim de um curso natural ou acontece por outros motivos, muitas vezes trágicos : catástrofes, acidentes e doenças. Ela atinge toda morte que não é a conclusão natural da vida, atinge o sofrimento e a impotência de não ser capaz de evitá-la. As guerras são todas injustificáveis, o sofrimento e a dor não são quantificáveis para qualquer ser humano de qualquer idade, raça, nacionalidade, para qualquer ser humano que tenha vivido em qualquer época histórica.

A guerra que atingiu a Terra Santa e o Oriente Médio não é mais ou menos devastadora do que outras, mas choca pelo número altíssimo de crianças que morreram, foram feridas e ficaram incapacitadas para o resto da vida. Essa guerra e todas as outras que estão presentes no mundo de hoje chocam porque as vemos e ouvimos sem estar lá e, graças à tecnologia, elas chocam porque tomamos conhecimento, em tempo real, do sofrimento de crianças e de tantos seres humanos e não há nada que possamos fazer. Não podemos correr e escavar para salvar os feridos sob os escombros, não podemos nos envolver em mortalhas e enterrar os pequenos corpos sem vida de vítimas inocentes. Não podemos dar apoio com comida e água, não podemos curar as feridas do corpo e da alma, não podemos dar um sorriso, um brinquedo ou um doce, não podemos nos sentar ao lado de uma criança e ler um conto de fadas juntos. É essa impotência que choca e destrói!

A história nos trouxe notícias, dados e números de massacres, excídios, extermínios, genocídios : qualquer outro nome que dermos a essas brutalidades jamais dará razão e justificativa à tragédia do mal. Mas esses números e brutalidades não puderam ser evitados porque foram revelados depois de terem sido cometidos. Agora vemos, ouvimos e aprendemos sobre o mal ao vivo e não com seguimos deter as armas e mudar os corações!

Um escritor e pedagogo escreveu : quanto pesa a lágrima de uma criança? A lágrima de uma criança desobediente pesa menos do que o vento, a de uma criança faminta pesa mais do que a terra inteira.

Todos os dias vemos fotos e vídeos de crianças sofrendo, todos os dias vemos lágrimas que não conseguimos enxugar. 

Quanto pesa sobre as consciências o sofrimento de uma criança? Quanto custará à humanidade a derrota de não deter aqueles que matam? Nos últimos dias, foi divulgado um vídeo no qual podemos ver algumas mulheres em Gaza correndo, carregando um pano no qual é colocado o corpo de uma pessoa. Elas correm para escapar de um ataque e, ao mesmo tempo, para enterrar o corpo de um ente querido; elas desafiam o perigo para dar, mesmo na morte, dignidade à vida.

Nessas imagens, vi a morte e a vida, vi a corrida para a salvação e a imobilidade daqueles que não podem mais se salvar, vi o amor e a solidariedade, vi os valores essenciais nos quais todo ser humano deveria se inspirar. Os mesmos valores que devem ter os homens e as mulheres que têm o destino do mundo em suas mãos, deixando de lado, ou melhor, anulando o desejo de supremacia, poder e autoritarismo. É necessário agora, imediatamente, considerar a paz como a única maneira possível de afirmar a verdade e a justiça de que este mundo precisa.

Se todos juntos pudermos compartilhar esses princípios essenciais, seremos capazes de entender a dor dos outros, seremos capazes de torná-la nossa e seremos capazes de fazer coisas boas, até mesmo derrotar as guerras.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2024-11/quanto-pesa-fome-crianca-faltas-guerra.html


quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Pecados Mortais e Veniais: o que você precisa saber?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo do diácono Alexandre Varela e Viviane Varela


‘Muitos protestantes dizem que ‘não existe pecadinho e pecadão : todos os pecados são equivalentes e tornam a pessoa igualmente culpada’. Essa ideia é totalmente sem lógica e vem de uma interpretação errada desta passagem da Bíblia : ‘Pois quem guardar os preceitos da Lei, mas faltar em um só ponto, se tornará culpado de toda ela’ (Tg 2, 10).

Alguém em sã consciência pode mesmo acreditar que uma criança ou que um mendigo que roubou uma maçã porque estava passando fome é tão culpável diante de Deus quanto um homicida que planejou a morte de alguém para ficar com a sua herança?

A Igreja Católica ensina que, basicamente, há dois tipos de pecados

  • os pecados MORTAIS (graves), que separam a alma da amizade com Deus. Se não houver arrependimento, conduzem ao Inferno, ou seja, à morte da alma;
  • os pecados VENIAIS (leves), que diminuem a graça na alma, mas não condenam ao Inferno.

São João revelou que há pecados que conduzem à morte da alma, e há outros que não : ‘Se alguém vê seu irmão cometer um pecado que não o conduza à morte, reze, e Deus lhe dará a vida; isso para aqueles que não pecam para a morte. Há pecado que é para morte; não digo que se reze por esse. Toda iniquidade é pecado, mas há pecado que não leva à morte.’ (1 Jo 5, 16-17).

Diante de Pilatos, Jesus também ensinou que há uma hierarquia de gravidade entre os pecados : ‘quem me entregou a ti tem pecado maior’ (Jo 19, 11b). E, no ato do lava-pés, Pedro pede que Jesus lave suas mãos e também a cabeça, mas Jesus diz que aquilo não era necessário, pois ‘Aquele que tomou banho não tem necessidade de lavar-se; está inteiramente puro’ (Jo 13,10a). Ou seja, Pedro só precisava ser purificado de seus pecados veniais, que são como a poeira nos pés.

O Catecismo da Igreja Católica esclarece que um pecado pode ser mortal ou venial, dependendo da intenção e da dimensão do dano gerado (Catecismo, n. 2484). Quando um fiel tem a consciência de que está em pecado grave, ele não deve se aproximar da Eucaristia para comungar. Para que um pecado seja mortal (grave), é preciso que esteja de acordo com os três pontos abaixo. Se faltar apenas um ou mais desses elementos, o pecado é venial :

  • é matéria grave
  • o pecador sabia que era pecado
  • fez porque quis, com total liberdade

Nos Evangelhos, Jesus delineia claramente a grande diferença de culpabilidade entre uma pessoa que faz coisas más por falta de conhecimento do que era o certo, e outra, que faz o que é mau com plena consciência do erro : 

O servo que, apesar de conhecer a vontade de seu senhor, nada preparou e lhe desobedeceu será açoitado com numerosos golpes. Mas aquele que, ignorando a vontade de seu senhor, fizer coisas repreensíveis, será açoitado com poucos golpes. Porque, a quem muito se deu, muito se exigirá. (Lc 12, 47-48).’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/pecados-mortais-e-veniais-o-que-voce-precisa-saber.html 

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

De não católica à fundadora do primeiro convento católico da Etiópia

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
Emahoy Haregeweine com o cardeal Berhaneyesus durante a bênção da Capela em Holeta, Etiópia 


*Artigo de Bezawit Bogale

 

‘Quero ser uma freira católica etíope’. Com essa declaração audaz, Emahoy Haregeweine, uma religiosa pioneira na Etiópia, fundou o primeiro convento local no interior da Igreja católica do país : o convento beneditino da Santíssima Trindade. Aos membros é dado o título ‘Emahoy’, uma palavra amárica que significa ‘Minha Mãe’ e reflete a convicção de que todas as mulheres são mães : algumas tornam-se mães biológicas, enquanto outras, como as religiosas, dedicam a sua vida para se tornar mães espirituais de todos.

Da inspiração litúrgica à líder monástica

Emahoy, nascida em Addis Abeba, na Etiópia, estudou na Lycée Gebremariam French School, onde conheceu diversas culturas e línguas. Aos 16 anos, depois de ter participado da sua primeira missa na Paróquia de São Francisco com um amigo católico, ficou profundamente comovida com a liturgia, que suscitou nela o desejo de reforçar a sua relação com Cristo.

Apesar do seu background ortodoxo, sentia-se atraída pelo catolicismo, começou a ir regularmente à missa e aspirava tornar-se uma religiosa. A sua fé fortaleceu-se depois de ver uma imagem de São Francisco, que consolidou o compromisso pela sua vocação.

Guiada pela oração e pelo acompanhamento espiritual, Emahoy Haregeweine superou os desafios e uniu-se às Pequenas Irmãs de Jesus (fundadas por São Carlos de Foucauld). Fez formação religiosa em diversos países, entre os quais Nigéria, Quênia, Egito, França e Itália, enquanto procurava continuamente respostas para as suas questões espirituais.

Em 2007, enquanto frequentava um seminário sobre as tradições monásticas etíopes, sentiu ter encontrado as respostas que procurava. Esse momento marcou o início da sua missão de fundar um convento católico que refletisse a identidade espiritual e cultural única da Etiópia.

 O convento beneditino da Santíssima Trindade

Em 2018, concretizou o seu sonho ao fundar o primeiro convento católico da Etiópia, o ‘convento beneditino da Santíssima Trindade’. Durante a sua estadia na França, com o apoio dos beneditinos, utilizou o seu tempo livre para angariar fundos vendendo lembranças feitas à mão. Com isso, conseguiu comprar uma pequena casa em Addis Abeba.

Mais tarde, com o apoio dos beneditinos franceses, comprou um terreno em Holeta, a 40 km da capital. Com a bênção e a aprovação do cardeal Berhaneyesus Souraphiel, arcebispo de Addis Abeba e presidente da Conferência Episcopal Católica da Etiópia, foi-lhe concedido o privilégio de fundar o convento. Vestida com o seu novo hábito monástico e oferecendo orações na língua local, sentiu que tinha finalmente descoberto as respostas para as lacunas do seu percurso religioso.

Uma missão em sintonia com as iniciativas agrícolas

Emahoy Haregeweine apoia a integração da fé na cultura local, promovendo simultaneamente a autossuficiência financeira no seu convento. Lançou iniciativas agrícolas, como a criação de galinhas para a produção de ovos, e a de bovinos para garantir a sustentabilidade a longo prazo.

Inspirada no apelo do Papa Francisco para o cuidado do ambiente, adotou práticas eco-compatíveis, entre as quais, a agricultura biológica, em benefício quer do convento quer da comunidade.

A sua visão vai para além do convento e iniciou um programa de jardim de infância que liga a sua comunidade aos habitantes das aldeias locais. Através dos seus projetos educativos e agrícolas, Emahoy promove laços fortes com os habitantes das aldeias, fornecendo orientação sobre parentalidade e sobre a preparação de alimentos biológicos. Considera esse programa uma oportunidade divina para abrir caminho a futuras escolas na área e salienta a importância da autossuficiência local, encorajando as comunidades a financiar autonomamente as atividades pastorais em vez de dependerem exclusivamente do apoio externo.

A vida monástica e o chamado à santidade

Emahoy vê o convento como um santuário pacífico onde os fiéis podem se unir às religiosas em oração, em reflexão e para consultas espirituais nas suas línguas locais. Visa criar um espaço onde a fé e a comunidade floresçam em conjunto, promovendo uma ligação profunda com Deus e entre eles.

Encoraja os casais a terem mais filhos e a cultivar famílias orantes, exortando os que discernem as suas vocações a passar tempo em oração e a ouvir as indicações de Deus.

À luz da evangelização mediática, espera instituir um website para o convento para difundir mensagens vocacionais. Para ela, a santidade não está confinada à vida religiosa, mas é um apelo universal, sublinhando que a Igreja só subsistirá se estivermos dispostos a nos sacrificar por amor a Jesus Cristo.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2024-11/sisters-project-etiopia-irmas-emahoy-haregeweine-vocacao-convent.html

sábado, 16 de novembro de 2024

O Dom da Inteligência

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre José Alem, CMF

  

‘Os dons do Espírito Santo refletem o amor, o grande e único dom, com cada um representando diferentes aspectos desse amor como um objeto visto de diversos ângulos. Para viver plenamente esses dons é necessário seguir o caminho de Jesus, acreditando no amor, cumprindo os mandamentos e praticando as bem-aventuranças. Assim, desenvolvemos os dons do Espírito e crescemos em sabedoria e graça. Esse processo envolve meditação, oração e uma vivência concreta da presença de Deus em nossas vidas e na Igreja. 

Falaremos agora sobre o dom da inteligência. Esse dom é dado para conhecer a linguagem de Deus, para compreendê-lo e segui-lo. A inteligência faz com que o cristão possa entender o Evangelho assim como é, faz com que se acolha a Palavra de Jesus sem medo da verdade. Por exemplo, quando se lê o mandamento de Jesus ‘Ama o próximo como a ti mesmo’ se entende que aquele ‘como’ quer dizer da mesma maneira que Jesus ama. Nem sempre se entende bem essa frase de Jesus. Muitos colocam limites no amor e fazendo assim não amam de modo algum. 

O dom da inteligência não é mera capacidade intelectual. Trata-se da inteligência que envolve todas as linguagens de compreensão, sobretudo da linguagem de Deus. Mesmo uma pessoa não estudada pode ter essa inteligência e entender a mensagem além das palavras, por isso, é um dom que nasce da fé e do amor. Quem tem fé verdadeira e ama sinceramente tem essa inteligência e pode surpreender a muitos. 

Quantas pessoas na história da Igreja, modelos de santidade, nem eram alfabetizadas e, no entanto, foram doutoras pela inteligência vivida como dom do Espírito Santo. O importante é ser inteligente como Jesus, que compreendia o que os outros não entendiam. O amor é também inteligência.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/o-dom-da-inteligencia.html

quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Pecados que agridem o nome de Deus

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre Luiz Antônio de Araújo Guimarães 


‘Para que fique bem claro, o segundo mandamento da lei divina é ‘Não pronunciarás o nome do Senhor teu Deus em vão!’ (Ex 20,7) e isso requer uma atenção redobrada porque, em muitos casos, as pessoas podem cometer pecados sem que saibam que era pecado. 

Catecismo da Igreja Católica, no parágrafo 2144, recorda : ‘A deferência para com o nome de Deus exprime o respeito que é devido ao mistério do próprio Deus e a toda a realidade sagrada que ele evoca’. Tendo essa compreensão é necessário que, para manter esse respeito, a pessoa saiba distinguir o que fere o nome santo do Senhor. Dentre os pecados que vão ao encontro do segundo Mandamento, observe-se blasfêmia, autossuficiência e mentira. 

A blasfêmia é o pecado que mais fere a dignidade do nome de Deus : ‘A blasfêmia opõe-se diretamente ao segundo mandamento. Ela consiste em proferir contra Deus – interior ou exteriormente – palavras de ódio, de ofensa, de desafio, em falar mal de Deus, faltar-lhe deliberadamente com o respeito, abusar do nome de Deus’ (Catecismo da Igreja Católica, 2148). O blasfemador desse nome é uma pessoa que não reconhece a soberania e a santidade de Deus e acha que pode dizer o que quer sem que lhe traga algum prejuízo. Engana-se! O maior prejuízo será para ela perder o Céu caso não se arrependa e mude de conduta. Vale lembrar que ‘(…) a proibição da blasfêmia se estende às palavras contra a Igreja de Cristo, os santos, as coisas sagradas. É também blasfemo recorrer ao nome de Deus para encobrir práticas criminosas, reduzir povos à servidão, torturar ou matar. O abuso do nome de Deus para cometer um crime provoca a rejeição da religião’ (Catecismo da Igreja Católica, 2148). 

Quanto ao pecado da autossuficiência é o ser humano achar que tudo lhe é possível e que ele não depende do nome de Deus para nada. Por exemplo : pais que não batizam o filho ou pessoas que não querem ser batizadas e acham que a vida segue normalmente sem a necessidade de ser batizado ‘em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo’ pecam por autossuficiência. Receber o Batismo é, por sua vez, acolher o nome do Deus, que é Pai e Filho e Espírito Santo e, por meio desse nome, receber a sua divina proteção. ‘No começo do dia, de uma oração e também de tarefas importantes, o cristão coloca-se sob o ‘sinal da cruz’ e inicia a sua ação em ‘nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo’. A invocação nominal do Deus trino, por quem estamos cercados de todos os lados, santifica as coisas que empreendemos; ela concede-nos a bênção e fortalece-nos nas dificuldades e nas tentações.’ (Catecismo Jovem da Igreja Católica – Youcat, 360) 

Já o pecado da mentira é ferir a plena verdade que o nome de Deus traz consigo : ‘Dizer a alguém o seu nome é um sinal de confiança. Se Deus nos disse o seu nome, é porque Ele se dá a conhecer e porque nos permite o acesso a Ele mediante esse mesmo nome. Deus é todo verdade; por isso, peca gravemente quem invoca a verdade e o nome de Deus para testemunhar uma mentira’ (Catecismo Jovem da Igreja Católica – Youcat, 359). A mentira em si já é pecado e mentir usando o nome Deus o é mais ainda, porque é querer reduzir a plena verdade que é Deus a um fato ilusório, falso. Condutas como essas não convêm, de forma alguma, a um cristão que busca viver em Deus e para Deus. 

Diante de tais constatações que ferem o santíssimo nome do Senhor, que não falte no coração e na mente de toda pessoa, e particularmente dos jovens, o espírito de reflexão interior para ter o máximo cuidado de não tomar o nome de Deus em vão. 

Se assim o fizer, sua vida não somente estará em perfeita comunhão com Deus, mas terá credibilidade diante dos irmãos e irmãs. Boa reflexão interior!

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/pecados-que-agridem-o-nome-de-deus.html


terça-feira, 12 de novembro de 2024

Idan Landau: o plano dos generais por trás das bombas no norte de Gaza

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Roberto Cetera

 

‘Enquanto a atenção da mídia estava voltada para o Líbano e para o confronto com o Irã, nos últimos dias o Exército israelense retomou os bombardeios maciços no norte da Faixa de Gaza, causando muitas vítimas civis. Alguns observadores acreditam que esse é o início do Generals’Plan (Plano dos Generais), um plano de cerco e evacuação forçada do norte da Faixa, proposto em suas linhas gerais pelo ex-general israelense Giora Eiland, numa entrevista ao ‘The Times of Israel’, desde abril passado. O plano foi comunicado ao comitê de relações exteriores e defesa do parlamento pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu em setembro passado. Sobre esse assunto, o jornal da Santa Sé ‘L'Osservatore Romano’ questionou o professor Idan Landau, da Universidade de Tel Aviv, que cuidadosamente pesquisou e escreveu sobre o assunto em várias revistas israelenses.

Professor Landau pode explicar brevemente o que significa o Plano dos Generais?

Plano dos Generais foi lançado em setembro passado. Seu objetivo é esvaziar a parte norte da Faixa de Gaza de sua população, ou seja, cerca de um terço do total da Faixa de Gaza, isto é, cerca de 300 mil habitantes. Numa primeira fase, o Exército israelense informaria a todas essas pessoas que elas teriam uma semana para evacuar para o sul por meio de dois corredores humanitários. Numa segunda fase, no final daquela semana, toda a área seria declarada uma ‘área militar fechada’. Os que permanecessem seriam considerados inimigos a serem combatidos e mortos se não se rendessem. Um cerco total seria então imposto a todo o território, intensificando, por meio do isolamento, a crise alimentar e de saúde.

Professor, o plano proposto pelo General Eiland foi apresentado ao governo em abril passado, e não foi totalmente aprovado. Por que o senhor acha que ele está agora em fase de realização? Quais operações militares atuais provariam isso?

A minha impressão é que, apesar das negações oficiais, os militares israelenses estão implementando uma versão não muito longe da original. E os próprios soldados em campo confirmam isso aos jornalistas. Muitos civis foram mortos nos últimos dias e o cerco no norte da Faixa também continua. Dezenas de testemunhas das cidades de Jabalia, Beit Hanoun e Beit Lahia relatam níveis de destruição sem precedentes, a demolição de bairros inteiros e até mesmo ataques a abrigos para expulsar aqueles que ali procuram proteção. Os massacres são diários : em 29 de outubro, a força aérea israelense bombardeou massivamente edifícios densamente povoados em Beit Lahia, matando 250 pessoas (metade das quais ainda estão sob os escombros). Por conseguinte, não creio que haja nenhuma dúvida de que o plano se tornou operacional. Paralelamente à destruição, as Forças de Defesa Israelenses (Idf) estão empurrando os deslocados para o Sul, embora muitos resistam em querer permanecer no enclave e não atravessar o corredor de Netzarim, porque temem nunca mais poder regressar.

Quantas pessoas são afetadas pelo plano de evacuação forçada?

Antes de 5 de outubro de 2024 – data estimada para o início da operação – viviam no enclave entre 300 e 400 mil pessoas. Agora, restam cerca de 100 mil. Mas as Idf estão determinadas a não deixar nenhuma. É bastante claro que tudo isto nada tem a ver com a intenção declarada de capturar os restantes líderes do Hamas e destruir as suas bases. O direito humanitário internacional não permite este tipo de operação militar.

Além da pressão militar, o plano incluiria também a suspensão do fornecimento de alimentos, combustível, energia e água. Isto também entraria em conflito com o direito humanitário internacional?

Deixe-me dizer que me oponho ao uso do verbo condicional. Não ‘iria prever’, mas ‘prevê’; não 'seria', mas 'é'. Há um mês não entram alimentos e água no enclave norte de Gaza, com exceção de fornecimentos limitados para o hospital Kamal Adwan. Todas as agências das Nações Unidas e organizações humanitárias relatam todos os dias que a situação humanitária é agora catastrófica. Acredito que não pode haver dúvidas sobre a natureza desta operação no que diz respeito ao direito humanitário internacional e é esta a razão pela qual o governo israelense tende a esconder o seu real significado.

Até à data de hoje, o governo israelense não expressou uma posição clara e definitiva sobre os futuros acordos de Gaza. Você acha que esta operação constitui uma ordem futura pelo menos para o Norte da Faixa?

Sim. Penso que o objetivo final é o reassentamento dos colonos. Um regresso após a remoção ordenada em 2005 pelo então primeiro-ministro Sharon. A extrema direita da coligação que apoia o governo de Netanyahu não esconde isto. Começando pelo Ministro do Tesouro, Smotrich. Obviamente este é um projeto que será implementado em etapas. Através da permanência dos militares no perímetro da Faixa e nas chamadas zonas de ‘segurança’. Depois começarão pequenos assentamentos, justificados como uma necessidade de controle militar do território, que crescerão então para se tornarem grandes comunidades como as existentes na Cisjordânia. No entanto, não creio que esta solução de reassentamento de colonos possa alguma vez funcionar, mesmo ao sul do corredor Netzarim, porque dois milhões de palestinos, amontoados naquele gueto ao ar livre, não podem ir para outro lugar. E com o tempo acabarão por constituir uma bomba-relógio de pobreza, de doenças e até de um extremismo perigoso e crescente.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2024-11/bombardeios-gaza-plano-generais-entrevista-idan-landau.html