terça-feira, 30 de abril de 2024

Eucaristia, testemunho de fé da vida cristã

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Maria Dilelli Cruvinel Cruvinel


Certa vez, um homem indagou a outro : ‘Como pode Deus estar na hóstia?’ Uma resposta a tal questão está no campo da fé da Igreja na presença real de Cristo no santíssimo sacramento. A veracidade de algo é comprovada pelo testemunho de duas ou mais pessoas. A fé na eucaristia é apostólica; Jesus mesmo a instituiu na última ceia, estando reunido com seus apóstolos. A partir de Pentecostes, quando a Igreja iniciou sua peregrinação rumo à pátria celeste, este sacramento divino foi dando ritmo aos seus dias e conforto na presença do Senhor.

Sim, esta é a convicção de fé da Igreja. O Concílio Vaticano II afirmou que o sacrifício eucarístico é ‘fonte e centro de toda a vida cristã’. Com efeito, ‘na santíssima eucaristia, está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, a nossa Páscoa e o pão vivo que dá aos homens a vida mediante a sua carne, vivificada e vivificadora pelo Espírito Santo’, falou o papa João Paulo II (Ecclesia de Eucharistia, n. 1).

Quanto ao testemunho de fé dos fiéis na participação da eucaristia, a constituição sobre a Liturgia orienta que os cristãos não entrem neste mistério de fé como estranhos ou espectadores mudos, mas participem de forma consciente, ativa, piedosa, com boa compreensão dos ritos e orações da ação sagrada; sejam formados pela palavra de Deus; alimentem-se à mesa do Senhor; ofereçam ações de graças a Deus; ofereçam-se a si mesmos e, juntamente com o sacerdote, ofereçam a hóstia imaculada; que, por Cristo mediador, progridam na unidade com Deus e entre si, a fim de que Deus seja tudo em todos (Sacrosanctum Concilium, n. 47).

Que belo testemunho de amor e intimidade ao tão sublime sacramento a Igreja tem em São Tomás de Aquino, maior poeta e compositor sobre a eucaristia. Dele, comenta o papa Bento XVI que, ‘segundo os antigos biógrafos, costumava aproximar a sua cabeça do tabernáculo, como que para sentir palpitar o coração divino e humano de Jesus’ (Bento XVI. Audiência geral, 23/6/2010).

A indagação daquele homem sobre a fé na presença real de Cristo na eucaristia, de certo modo, revela um desejo de conhecer a Deus. Por isso, é tão valioso o pensamento do Padre Pedro Julião, apóstolo da eucaristia no texto ‘Le Trés Saint Sacrement’ : ‘O culto solene à exposição do Santíssimo é necessário para despertar a fé, adormecida em tantos homens honestos. (…) A sociedade morre quando não tem mais um centro de verdade e de caridade, e tampouco vida em família. Muitos se isolam, se concentram em si mesmos, querem ser autossuficientes. Assim, a dissolução é iminente! Ao contrário, a sociedade renasce com vigor quando todos os seus membros se reúnem em torno do Emanuel.’

Por isso, o convite da Igreja é que se volte o olhar continuamente para o seu Senhor, presente no sacramento do altar, pois é nele que se descobre a plena manifestação do seu imenso amor. Ao comungar do corpo e sangue de Cristo, nosso Senhor comunica também o seu Espírito. Escreve São Efrém : ‘Chamou o pão seu corpo vivo, encheu-o de Si próprio e do seu Espírito. […] E aquele que o come com fé, come Fogo e Espírito’ (Ecclesia de Eucharistia, n. 17).

Que o seu amor a Jesus Eucarístico seja renovado ao receber do seu Espírito a fim de que dê um bom testemunho de fé para que o mundo creia!

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/eucaristia-testemunho-de-fe-da-vida-crista.html


domingo, 28 de abril de 2024

A graça de não pertencer a si mesmo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre Marlon Mucio


Há algo que verdadeiramente me fascina nesta vida : a possibilidade de não me pertencer, a graça de não ser de mim, a oportunidade de ser inteiramente de alguém. 

A sociedade atual fala de empoderamento, de autoestima. O mundo apregoa cada vez mais que a pessoa tem que ser isso ou aquilo, que ela tem que se valorizar e se impor, ter as rédeas de sua vida em suas mãos, ter sucesso. O Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo ensina totalmente o contrário! O Senhor nos disse para renunciarmos a nós mesmos, tomarmos a nossa cruz e segui-lo (cf. Lc 9,23). 

Quando eu tinha 22 anos de idade, no meu primeiro ano de seminário, dos estudos para ser padre junto aos salvistas, tive a graça de conhecer o Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, do grande santo francês que entrou no Céu em 1716, o padre São Luís Maria Grignion de Montfort, e já me consagrei como escravo de Jesus, por meio de Maria. 

Sempre gosto de me referir ao Tratado como sendo uma pequena grande enciclopédia sobre Maria Santíssima. Piedoso e formativo, é um opúsculo, mas de uma densidade pouco vista em muitas obras sobre Nossa Senhora. 

O autor é cirúrgico, ele não se dá a meias palavras. São Luís é firme. Substitui o não me toque do jansenismo do século XVIII, uma heresia que combateu a devoção a Maria Santíssima, pelo desejo de salvar cada alma, apresentando sem rodeios quanto a devoção a Nossa Senhora é útil para a nossa salvação. São Luís mostra qual é a verdadeira devoção e qual é a falsa devoção a Nossa Senhora. 

Sempre ensinei que quem quer ser santo – e essa é a vocação de todos nós! – deve imitar os santos no caminho que os levou ao Céu. A consagração a Jesus, sabedoria encarnada, por meio de Maria Santíssima foi um necessário caminho que trilharam grandes santos como São João Paulo II, Santa Teresinha do Menino Jesus e Santo Antônio de Santana Galvão. Frei Galvão, o primeiro santo brasileiro elevado à honra dos altares, chegou até mesmo a assinar com seu próprio sangue a sua consagração. 

Sou muito feliz em não me pertencer, em viver numa livre escravidão de amor a Jesus por meio de Maria. ‘Totus tuus ego sum, et omnia mea tua sunt’ (‘Eu sou todo vosso, Maria, e tudo o que eu tenho vos pertence’).

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/a-graca-de-nao-pertencer-a-si-mesmo.html


sexta-feira, 26 de abril de 2024

Verdade e realidade : o real se impõe!

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

*Artigo de Dom Luiz Antonio Lopes Ricci Lopes Ricci,

Bispo de Nova Friburgo, RJ 


A definição filosófica de verdade, como ‘adequação do pensamento à realidade’, serve para constatar, com pesar, um perigoso distanciamento entre pensamento e realidade em vários setores e pessoas, especialmente nos pronunciamentos de alguns políticos e ‘comunicadores’ digitais. Constata-se uma espécie de ‘esquizofrenia’ culposa, porque com conhecimento e consentimento fazem questão de dissociar e separar o mundo real de suas próprias ideologias, que ofuscam o pensamento reto e verdadeiro. Sem contar aqueles que vão além, disseminando as destrutivas fake news e o ódio, manipulando a dignidade da consciência dos indivíduos. Não se acaba jamais de procurar a verdade, porque algo de falso sempre se pode insinuar, mesmo ao dizer coisas verdadeiras. De fato, uma argumentação impecável pode basear-se em fatos inegáveis, mas, se for usada para ferir o outro e desacreditá-lo à vista alheia, por mais justa que pareça, não é habitada pela verdade. A partir dos frutos, podemos distinguir a verdade dos vários enunciados : se suscitam polêmica, fomentam divisões, infundem resignação ou se, em vez disso, levam a uma reflexão consciente e madura, ao diálogo construtivo, a uma profícua atividade, como afirma o Papa Francisco.

A emoção desmedida não pode colocar a verdade em segundo plano. As ideologias prejudicam grandemente a racionalidade. Urge colaborar, como exigência da fé em Cristo, para a superação de todas as formas de violência, especialmente a digital, que, infelizmente, ainda persiste. O cristão é chamado a agir de modo diferente : entre vocês não deverá ser assim (cf. Mt 20,26), já advertia Jesus.

A realidade é mais importante do que a ideia, afirma o Papa Francisco : ‘Existe uma tensão bipolar entre a ideia e a realidade : a realidade simplesmente é, a ideia elabora-se. Entre as duas deve-se estabelecer um diálogo constante, evitando que a ideia acabe por separar-se da realidade. É perigoso viver no reino só da palavra, da imagem, do sofisma. Isso supõe evitar várias formas de ocultar a realidade’ (Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, 231). A realidade deve ser iluminada pelo pensamento. Dessa forma, evitam-se idealismos ineficazes e autorreferencialidade, que pode levar a uma forma de narcisismo estéril, a uma perigosa ‘autoverdade’. Precisamos de frutos concretos para uma realidade concreta! ‘Produzir frutos no amor, para a vida do mundo’ (Decreto Optatam Totius, 16).

Nesta nossa reflexão, cabe recordar o conceito de pós-verdade : ‘Que se relaciona ou denota circunstâncias, nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais’ (Universidade de Oxford, 2016). A verdade é o que corresponde à opinião pessoal ou modo de pensar. Ocorre assim, infelizmente, a perda do senso crítico e a assimilação de uma ideologia. 

Pós-verdade não é a mesma coisa que mentira. Os políticos, afinal, mentem desde o início dos tempos. O que a pós-verdade traz de novo ‘não é a desonestidade dos políticos, mas a resposta do público a isso. A indignação dá lugar à indiferença e, por fim, à convivência’ (M. D’Ancona, 2018). Massacrado por informações verossímeis e contraditórias, o cidadão desiste de tentar discernir a agulha da verdade no palheiro da mentira e passa a aceitar, ainda que sem consciência plena disso, que tudo o que resta é escolher, entre as versões e narrativas, aquela que lhe traz segurança emocional.

A verdade, assim, perde a primazia epistemológica nas discussões públicas e passa a ser apenas um valor entre outros, relativo e negociável, ao passo que as emoções, por outro lado, assumem renovada importância. Na base do fenômeno, argumenta D’Ancona, está o colapso da confiança nas instituições tradicionais’ (Editores, Pós-verdade, 2018).

Enfrente com serenidade! Em frente com fé, fortaleza e esperança! Com o meu abraço virtual, gratidão e bênção.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/verdade-e-realidade-o-real-se-impoe.html


quarta-feira, 24 de abril de 2024

Companheiros de Jesus : a conexão espiritual de Inácio

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)


*Artigo de João Melo


‘No coração da França renascentista, na prestigiada Universidade de Sorbonne, em Paris, dois jovens espanhóis cruzaram caminhos que mudariam não apenas suas vidas, mas também o curso da história espiritual da fé cristã. Inácio de Loyola, um ex-soldado ferido em batalha, e Francisco Xavier, um nobre ambicioso, encontraram-se em circunstâncias que pouco prometiam para uma amizade duradoura. Inicialmente, Francisco nutria uma antipatia por Inácio, cuja presença lhe era desagradável. Contudo, após viver a experiência inaciana dos exercícios espirituais propostos por Inácio, Francisco experimentou uma transformação profunda, abandonando sua vaidade e aspirações mundanas.

Em que consiste a experiência inaciana para transformar tanto a vida de uma pessoa? A aventura da experiência espiritual inaciana consiste em amar e deixar-se amar com coragem e generosidade. Deixar-se amar é acolher o dom do perdão, da cura e da misericórdia para a aceitação de si e do amor que nos alcança sem mérito ou merecimento. É o que nos tira do fechamento em nós mesmos e nos abre ao entendimento de nossa dignidade inalienável de filhos de Deus. É o que cria condições para que verdadeiramente possamos amar. Amar é missão; é, portanto, o mandamento de que Jesus fala no Evangelho. Não se trata de uma obrigação imputada pela lei, mas um estilo de vida, isto é, o seguimento ao modo de vida de Jesus. O discípulo, ao contemplar o jeito de Jesus, seu trato com as pessoas e seu projeto de vida, deseja assumir em sua vida e ao seu modo esse mesmo modo de proceder que lhe encanta, portanto, amar e deixar-se amar são duas atitudes e disposições interiores que estabelecem as bases para uma relação de confiança e de entrega na comunhão. Assim, o discípulo e o Mestre possuem um vínculo amoroso que é mais forte do que a morte. A generosidade é a força e a vontade do discípulo amado que contempla na vida de Jesus a entrega que Ele faz de sua vida ao anúncio e chegada do Reino de Deus, demonstrando muito amor aos menos amados. Esse amor generoso é paixão pelo gênero humano criado à imagem e semelhança do Deus, que é amor. Essa paixão ganha uma forma radical na paixão da cruz em que Jesus vive dando a vida pelo amor aos seus amigos. A coragem é a realidade da ressurreição, que leva o discípulo a superar a experiência de morte e o medo de seguir amando profundamente. Na coragem do Ressuscitado, o discípulo ousa construir mais vida a partir da aposta no amor generoso.

Em 1540, a Ordem dos Jesuítas foi erigida sob a bênção do Papa Paulo III, com Inácio de Loyola como seu primeiro superior-geral. Francisco Xavier, por sua vez, embarcou em uma jornada missionária que o levaria às terras distantes da Índia e do Japão. Os dois amigos nunca mais se viram pessoalmente. Foi nesse período que a expressão ‘amigos no Senhor’ ganhou vida, usada por Inácio para descrever a profunda ligação espiritual que compartilhava com seus companheiros de ordem, especialmente com Francisco.

Xavier, em suas viagens, carregava consigo, costurados em sua batina junto ao coração, os nomes de seus companheiros jesuítas, mantendo Inácio em um lugar de destaque. Essa prática simbolizava a conexão inquebrantável que transcendia as barreiras geográficas. As cartas trocadas entre eles eram o cordão umbilical que mantinha viva essa amizade, servindo como um meio vital de comunicação e apoio mútuo, mesmo separados por milhares de quilômetros.

A história de Inácio e Francisco é um testemunho do poder da convivência e do conhecimento mútuo para superar mal-entendidos e julgamentos precipitados. De estranhos com impressões erradas um sobre o outro, eles se tornaram ‘amigos no Senhor’, um exemplo luminoso de como o tempo e a experiência compartilhada podem transformar relações e fortalecer laços de amizade verdadeira. Eles nos ensinam que as primeiras impressões podem ser enganosas e que é no convívio que se revela a verdadeira essência das pessoas, permitindo que a amizade floresça e cresça em profundidade e significado.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/companheiros-de-jesus-a-conexao-espiritual-de-inacio.html

 

segunda-feira, 22 de abril de 2024

São Jorge, mártir (século IV)

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo da redação da revista Ave Maria


‘Os exemplos de todos os mártires nos primeiros séculos eram convites aos não cristãos à conversão e, nos séculos seguintes, quando o Batismo começou a ser ministrado às crianças, estimulava os cristãos a redescobrirem o valor desse Sacramento, encarnando com seriedade o Evangelho na vida pessoal e da comunidade.

São Jorge é um mártir do século III ou IV, certamente antes do Édito de Constantino. Sabemos que existiu uma antiquíssima igreja, construída em sua honra, em Lidda-Diospolis, Palestina. Exceto o fato de ter existido, nada mais sabemos de certo sobre esse santo e devemos nos contentar com aquilo que foi descrito em sua passio (atas do sofrimento) a respeito de seu martírio, historicamente incerta, escrita – diz-se – por seu ajudante de nome Pasicrate.

Segundo esse autor, Jorge era originário da Capadócia e tornou-se oficial do exército. Convertido ao cristianismo, renunciou a seu ofício e, quando foi preso por causa da fé, enfrentou com firmeza o martírio.

A lenda do dragão

À sua figura foi ligada a famosa lenda do dragão, que vale a pena ser contada, pois no imaginário popular queria significar que então a força desarmada do cristianismo estava para triunfar sobre a violência desumana do mal.

Próximo da cidade, havia um lago do qual de tempos em tempos saía um horrível dragão que, com seu hálito fétido, matava muitas pessoas inocentes.

Para aplacar sua ira era necessário lhe oferecer vítimas humanas e uma vez coube ao rei do lugar dar-lhe em alimento a própria filha. Mesmo profundamente entristecido, levou-a até o lago, acompanhado por uma multidão de pessoas aos prantos.

Quando o dragão saiu das águas para agarrar a jovem, encontrou ao seu lado um cavaleiro, Jorge, que lhe pôs uma corrente ao pescoço e entregou-o à jovem. Iniciou-se a procissão de volta para a cidade : caminhava a filha do rei e ao seu lado o corajoso cavaleiro, levando preso à corrente o monstro que se tornou manso como um cordeiro.

Quem permaneceu na cidade, ao ver o dragão acorrentado e então inofensivo teve medo, fechava a porta e espiava pela janela entreaberta o insólito espetáculo. O cavaleiro garantia a segurança a todos, afirmando que ele viera em nome de Cristo para libertar a cidade do dragão e anunciar a todos a salvação por meio do Batismo. O povo percebeu o significado do acontecimento e, a começar pela princesa e sua família, pediram o Batismo, deixando para sempre as práticas de escravidão às quais se submetiam até aquele momento.

O culto

O culto a São Jorge foi e continua sendo um dos mais difundidos no mundo cristão em todos os lugares. Sua imagem de cavaleiro com o dragão sob seus pés se de um lado alimenta a fantasia popular, de outro instrui também os analfabetos, infundindo nos cristãos a confiança na proteção divina também nos momentos mais difíceis da vida. Na Idade Média, São Jorge se tornou protetor dos cavaleiros e, de maneira particular, dos cruzados; numerosas igrejas foram dedicadas a ele. Devido a São Jorge, o reino da Geórgia e os reis da Inglaterra, a começar por Ricardo Coração de Leão, quiseram que ele fosse o patrono da casa real e de suas terras.

O imperador Constantino ergueu uma igreja em Constantinopla em homenagem a São Jorge. Entre os povos eslavos sua figura é muito apreciada.

Ainda hoje é incontável o número de igrejas católicas e ortodoxas dedicadas a ele, em todas as partes do mundo. Talvez a função histórica desses santos envoltos em lendas seja a de recordar ao mundo um só pensamento muito simples, mas fundamental : o bem, mesmo que demore, vence sempre o mal e a pessoa sábia nas escolhas fundamentais da vida não se deixa jamais enganar pelas aparências.’


Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/sao-jorge-martir-seculo-iv.html


sábado, 20 de abril de 2024

Os irresponsáveis e a responsabilidade dos povos

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Andrea Tornielli


O que aconteceu nos últimos seis meses e, infelizmente, está acontecendo hoje no Oriente Médio mantém o mundo em suspense. A cruel agressão em Israel perpetrada pelo Hamas, com a morte de 1.200 pessoas, a maioria civis pacíficos; o bombardeio em massa e a invasão da Faixa de Gaza, que deixou quase 34. 000 mortos, em sua maioria civis, muitos deles crianças; o ataque que destruiu o prédio de uma sede diplomática iraniana em Damasco; a resposta do Irã com ataques de drones e mísseis contra alvos militares israelenses e, hoje, a resposta de Israel atacando alvos militares no Irã : o risco de a escalada degenerar em escolhas sem retorno, arrastando o mundo inteiro para um conflito de consequências incalculáveis, torna-se mais real a cada dia.

Com o Papa Francisco, o único líder mundial de cujas palavras emerge uma consciência da trágica encruzilhada que enfrentamos, dizemos não à guerra, não à violência, sim à paz, sim à negociação. Há mais de vinte anos, após o ataque terrorista de 11 de setembro no coração dos Estados Unidos, São João Paulo II publicou uma mensagem significativa para o Dia Mundial da Paz intitulada ‘Não há paz sem justiça, não há justiça sem perdão’. Palavras verdadeiras, palavras proféticas. A lógica da reação e da vingança, da resposta que sempre deve se seguir, desencadeia uma espiral da qual é difícil sair e cujas consequências catastróficas serão pagas pelos povos.

Em um mundo onde existem pessoas irresponsáveis que, em vez de investir na luta contra a fome, na melhoria dos serviços de saúde, na energia renovável, na criação de uma economia menos subserviente aos senhores das finanças e mais atenta ao bem comum, pensam apenas em investir enormes somas no rearmamento, nos instrumentos mais sofisticados para produzir morte e destruição, o apelo não pode deixar de ser dirigido à responsabilidade dos povos. Enquanto os crentes elevam orações a Deus para inspirar as escolhas dos governantes, milhões de pessoas unem suas vozes para elevar um grito de paz. A guerra é uma aventura sem retorno : em um mundo com arsenais repletos de armas nucleares, essas palavras dramaticamente verdadeiras se tornam cada vez mais reais a cada dia.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2024-04/editorial-tornielli-gaza-guerra-hamas-irresponsaveis-povos-ira.html

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Escutar a voz de Deus

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Pedro Nascimento,

Leigo Missionário Comboniano


Deus conhece-nos pelo nome, chama-nos! Mas nem sempre compreendemos o que quer de nós, a que nos chama, porque passamos por situações dramáticas! Necessitamos de conhecer Deus, de O escutar, compreender o que espera de nós, o que nos pede. Tal como aconteceu com Samuel, Deus vem até nós e chama! Compreender a voz de Deus implica abertura, perceber que Deus nos ama e que nos quer bem, que nos convida à santidade.

Samuel, apesar de servir o Senhor no templo, não conhecia a Sua voz! Quantas vezes Deus nos chama, nos interpela mas não sabemos, não estamos preparados para O Escutar… São tantas as distrações, a vida familiar, o trabalho, os amigos, os nossos momentos de descanso, andamos tão absorvidos por tantos compromissos, que não existe espaço para Deus na nossa vida… Mas Ele está lá!

Apesar de Samuel não ter compreendido que Deus o chamava, o Senhor continuou a chamar e não desistiu até que Samuel compreendesse a Sua voz! Deus não desiste de ti, nem de mim! E continuará a chamar até estarmos disponíveis para O acolher no nosso coração, na nossa vida.

Depois de compreender que Deus lhe falava, a resposta de Samuel foi clara e assertiva : «Fala, Senhor, que o teu servo escuta» (1 Sm 3, 10). E a sua vida foi de serviço e dedicação a Deus, sendo um profeta extremamente importante! 

Abrir o coração a Deus

Precisamos de parar! Precisamos de ‘perder tempo’ para encontrar Deus, para compreender a vontade do Senhor. Samuel encontrou Deus no templo, no silêncio, na noite. Nós necessitamos de espaços na nossa vida para O acolher, para rezar, para ler a palavra de Deus, para encontros de intimidade com Deus, em que lhe falamos da nossa vida, dos nossos problemas e das nossas alegrias, em que desabafamos as vezes em que não O compreendemos…

O testemunho de Samuel deve servir de exemplo para todos nós! Quando se escuta Deus, quando se percebe a vocação a que somos chamados, devemos seguir Deus, que não nos trata como mais um, que não nos considera dispensáveis, mas um Deus amoroso que conhece cada um pelo nome e que é capaz de guardar noventa e nove ovelhas e ir em busca de uma ovelha perdida (Mt 18, 10-14, Lc 15, 4-7). Ser chamados e amados por Deus é um dom maravilhoso, que tu e eu recebemos!

Da escuta atenta de Deus, nasce uma intimidade com Ele, no nosso coração, que nos permite viver e servir o Senhor na nossa vida, com simplicidade, generosidade e autenticidade!

Viver Deus em plenitude não significa que deixaremos de pecar, que passaremos apenas a ter qualidades ou que somos seres perfeitos! Viver Deus implica conhecê-lo, experimentá-lo, amá-lo, e saber que apesar das nossas limitações, das nossas imperfeições, Deus nos ama e nunca desiste de nós!

Na vocação de Samuel é extremamente importante compreender o papel de Ana, sua mãe, e de Eli, o sacerdote.

A sua mãe ofereceu o menino a Deus, cheia de confiança que o Amor de Deus é o maior Dom que podemos ter, um Amor tão grande que dá a Sua vida por nós! Uma mãe quer o melhor para o Seu filho quer-lhe bem! Samuel foi um dom de Deus para sua mãe e, por isso, o entregou a Deus, cumprindo a sua promessa ao Senhor.

De igual modo, Eli ajudou Samuel a escutar e a compreender a voz de Deus; com a sua sabedoria, foi um verdadeiro acompanhante espiritual para o jovem Samuel.

A vocação é um dom único e pessoal. Contudo, continuamente, Deus serve-se dos outros para nos falar! Precisamos de viver Deus em comunidade, nas nossas comunidades em que nos identificamos como irmãos e irmãs na fé; precisamos de ser luz para os outros e ajudar quem passa por nós a ir ao encontro de Deus; precisamos de testemunhar Deus com o nosso exemplo; precisamos de ver Deus nos outros, nos seus exemplos, na sua vida.

Chamados a partir

Cada um de nós, como Samuel, recebe um chamamento de Deus. Escutar a sua voz, discernir a vocação e seguir o projecto que Ele tem para nós é o que dá sentido à nossa vida e nos permite encontrar a felicidade. Assim acontece com a Maria Augusta Pires, leiga missionária comboniana, que no mês passado partiu para Moçambique e nos partilha o seu testemunho.

«Sou leiga missionária comboniana, chamo-me Maria Augusta, nasci numa família católica. O meu desejo de partir em missão começou em Agosto de 1994 ao participar numa semana missionária em Fátima. Nessa altura já tinha 39 anos. Durante essa semana ouvi testemunhos missionários fascinantes, que me cativaram muito. Conheci o padre Dário, missionário comboniano, e comecei a fazer formação para a missão.

Em Dezembro de 1997, parti para a minha primeira aventura missionária em Moçambique. Fui para a Missão de Alua na diocese de Nacala, onde tive um acolhimento excepcional de todos os missionários e do povo macua. Fui descobrindo a missão. Trabalhei sempre na escola pública, leccionando Português, e à tarde tirava dúvidas aos alunos que precisavam e queriam. As condições da maioria dos alunos eram muito precárias, tendo muitas dificuldades na aquisição dos materiais e para pagarem o que fosse preciso. Muitos deles percorriam grandes distâncias para chegarem diariamente à escola, mais ou menos 15 km e, muitos deles só tinham uma refeição diária. Aumentaram também as meninas, que começaram a estudar devido à insistência dos missionários junto das famílias.

Decorridos cinco anos, fui chamada para a missão de Mueria para ser responsável do lar feminino, com 52 meninas dos 11 aos 18 anos. Foi uma tarefa difícil, mas deveras gratificante. Conseguimos, com muita ajuda e protecão de Deus, fazer uma grande família onde havia a discussão e a zanga, mas depois existia o diálogo e o pedir perdão.

No dia 6 de Setembro de 2006, tive de voltar para Portugal a fim de leccionar o último ano antes de me reformar.

Em Fevereiro de 2008 parti outra vez, não para Mueria, mas para uma nova aventura, desta vez na República Centro-Africana. Fui, pela primeira vez, viver numa comunidade de Leigas Missionárias Combonianas, composta por uma italiana e duas portuguesas. Neste país existem dois povos : os Bantos e os Pigmeus. É com os Pigmeus que colaboramos mais, pois estes são muito pobres, marginalizados e explorados pelos Bantos. Os Pigmeus são nómadas que vivem na floresta e que, antigamente viviam daquilo que caçavam, pescavam e colhiam. Com a desflorestação, já não encontram tudo o necessário, sentindo dificuldades no acesso aos serviços básicos de saúde e de educação e a serem julgados como qualquer cidadão do país. O nosso trabalho é ajudá-los a integrarem-se na sociedade, irem ao hospital, à escola… e serem acolhidos e tratados como qualquer centro-africano.

Neste país era responsável pelas escolas da missão e quando era necessário apoiava no dispensário. Sentia grande alegria quando ia acompanhar a escola que ficava num acampamento dentro da floresta. As crianças, todas pigmeias, ficavam muito contentes com a nossa visita! Estudávamos, fazíamos jogos, cantávamos…

Em Julho de 2010, vim a Portugal de férias, mas o Senhor, mais uma vez, mudou os meus planos e permaneci até Novembro de 2015. Durante este tempo trabalhei na animação missionária em escolas e paróquias. Também cuidei da minha mãe até Deus Pai a chamar a Si.

Em 2015, voltei à missão de Mongoumba, onde servi os Pigmeus e os Bantos. Depois regressei a Portugal e nos anos de 2022 e 2023 estive em Camarate (Loures), numa missão, com crianças filhas de emigrantes africanos.

Em Março passado, parti novamente. Desta vez para Carapira, Moçambique. Sinto que Deus me chama a partir, mas não é fácil, pois ouvem-se tantas vozes a dizer para ficar. Que o Senhor me ajude a continuar a amá-Lo e servi-Lo nos irmãos mais pobres e abandonados.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.combonianos.pt/alem-mar/artigos/8/1168/escutar-a-voz-de-deus/

domingo, 14 de abril de 2024

Música e saúde

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Ricardo Abrahão 


Muito já se falou sobre a relação entre música e saúde e incontáveis trabalhos pelo mundo têm comprovado os efeitos da música no corpo e na mente. Sendo assim, não há possibilidade de não entendermos a responsabilidade que temos sobre os sons que emitimos aos ouvidos do outro. Os sons podem ajudar, organizar e oferecer saúde ao ser humano, no entanto, se empregados de forma desequilibrada, podem causar muitos males.

A principal tarefa do músico litúrgico é o equilíbrio. A base do equilíbrio é o conhecimento. Alegar ser instrumento de Deus na música litúrgica exige conhecimento musical e humano. Não basta a tal da boa vontade, muitas vezes tão deturpada, é necessário juízo diante da execução musical. Como pode uma pessoa dizer que é instrumento de Deus quando desconhece a própria criação? Como criatura, deve-se conhecer seu Autor. É nesse ponto que encontramos uma imensa desconexão entre uma coisa e outra. A música deve estar em consonância perfeita entre Criador e criatura, desse modo, o conhecimento é fundamental para que se expresse com profunda ternura o verdadeiro valor da Eucaristia na vida do católico. 

O ambiente onde se celebra a Eucaristia deve ser saudável em todos os sentidos, portanto, os sons emitidos nesse ambiente não podem em hipótese alguma provocar dissonâncias entre corpo e alma. Por exemplo : o sistema nervoso se defende do volume alto, o que desconstrói o espírito de escuta. A desafinação também é uma forma de desconexão com o corpo. O monge beneditino Anselm Grün nos alerta muito sobre o perigo de uma espiritualidade adoecida e se expressa de maneira clara e feliz em diversos livros sobre a importância de nos conhecermos o suficiente para encontrarmos Deus dentro de nós. No livro A saúde como tarefa espiritual ele traz um importante alerta para evitarmos uma espiritualidade asfixiante : ‘A espiritualidade neurótica reprime a sombra e agarra-se forçosamente a ideais, sem jamais conseguir realizá-los’. O neurótico deseja, mas não realiza. Música é realização. Eucaristia é realização.

No Evangelho de João, Jesus diz ser o pastor do rebanho e suas ovelhas o seguem. Discipulado é seguimento. Suas ovelhas são os que ouvem sua voz, porém, não basta ouvir : é necessário seguir, colocar-se em ação, entender a mensagem. O músico litúrgico deve estar pleno do Espírito para bem servir ao Senhor com o coração afinado à voz que diz ‘Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas me conhecem’ (Jo 10,14). Quando a voz do Pastor se faz presente no coração do músico, nada o impede de dedicar-se inteiramente aos estudos, ao treino e ao trabalho que a música exige como reflexo de toda a criação de Deus.

Que a música litúrgica nos conduza à saúde do corpo e da alma, fazendo ressoar o Espírito Santo em todo o tempo, e que nossos corações cantem como no Salmo 83,5-6 : 

‘Felizes os que habitam vossa casa;

para sempre haverão de vos louvar!

Felizes os que em vós têm sua força,

e se decidem a partir quais peregrinos!’.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/musica-e-saude.html


sexta-feira, 12 de abril de 2024

O elenco das “graves violações” da dignidade humana

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Andrea Tornielli


Três capítulos oferecem os fundamentos para as afirmações contidas no quarto, dedicado a ‘algumas graves violações da dignidade humana’ : é a declaração ‘Dignitas infinita’ do Dicastério para a Doutrina da Fé, um documento que faz memória dos 75 anos da Declaração universal dos direitos do homem e reafirma «a imprescindibilidade do conceito de dignidade da pessoa humana ao interno da antropologia cristã» (Introdução). A principal novidade do documento, fruto de um trabalho que durou cinco anos, é a inclusão de alguns temas principais do recente magistério pontifício que acompanham aqueles bioéticos. No elenco ‘não exaustivo’ que é oferecido, entre as violações da dignidade humana, ao lado do aborto, da eutanásia e da maternidade sub-rogada, aparecem a guerra, o drama da pobreza e dos migrantes, o tráfico de seres humanos. O novo texto contribui assim para superar a dicotomia existente entre quem se concentra de modo exclusivo na defesa da vida do nascituro ou do moribundo, esquecendo muitos outros atentados contra a dignidade humana e, vice-versa, quem se concentra somente na defesa dos pobres e dos migrantes, esquecendo que a vida deve ser defendida desde a concepção até a sua natural conclusão.

Princípios fundamentais

Nas primeiras três partes da declaração, são evocados os princípios fundamentais. «A Igreja, à luz da Revelação, reafirma de modo absoluto» a «dignidade ontológica da pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus e redimida em Cristo Jesus» (1). Uma «dignidade inalienável» que corresponde «à natureza humana, para além de qualquer mudança cultural (6) e é «um dom recebido» e, portanto, está presente «por exemplo, em uma criança ainda não nascida, em uma pessoa em estado de inconsciência, em um idoso em agonia» (9). «A Igreja proclama a igual dignidade de todos os seres humanos, independentemente da sua condição de vida ou das suas qualidades» (17) e o faz com base na revelação bíblica : mulheres e homens são criados à imagem de Deus; Cristo, encarnando-se «confirmou a dignidade do corpo e da alma» (19), e ressuscitando nos revelou que «o aspecto mais sublime da dignidade do homem consiste na sua vocação à comunhão com Deus» (20).

Dignidade de cada pessoa

O documento evidencia o equívoco representado pela posição daqueles que à expressão ‘dignidade humana’ preferem ‘dignidade pessoal’, «porque entendem como pessoa somente ‘um ser capaz de raciocinar’». Consequentemente, afirmam que «não teria dignidade pessoal a criança ainda não-nascida, nem o idoso não autossuficiente, nem o portador de deficiência mental. A Igreja, ao contrário, insiste no fato que a dignidade de cada pessoa humana, porque é intrínseca, permanece para além de toda circunstância» (24). Além disso, se afirma «o conceito de dignidade humana foi às vezes usado de modo abusivo também para justificar uma multiplicação arbitrária de novos direitos... como se fosse devido garantir a expressão e a realização de toda preferência individual ou desejo subjetivo» (25).

O elenco das violações

A declaração apresenta então o elenco de ‘algumas graves violações da dignidade humana’, ou seja «tudo aquilo que é contrário à vida mesma, como toda espécie de homicídio, o genocídio, o aborto, a eutanásia e o suicídio voluntário»; mas também tudo aquilo que viola a integridade da pessoa humana, como as mutilações, as torturas infligidas ao corpo e à mente, as constrições psicológicas». Enfim, «tudo aquilo que ofende a dignidade humana, como as condições de vida sub-humana, os encarceramentos arbitrários, as deportações, a escravidão, a prostituição, o comércio de mulheres e de jovens, ou ainda as ignominiosas condições de trabalho com as quais os trabalhadores são tratados como simples instrumentos de lucro e não como pessoas livres e responsáveis». Cita-se também a pena de morte, que «viola a dignidade inalienável de toda pessoa humana para além de toda circunstância» (34).

Pobreza, guerra e tráfico de pessoas

Antes de tudo, se fala do «drama da pobreza», «uma das maiores injustiças do mundo contemporâneo» (36). Depois está a guerra, «tragédia que nega a dignidade humana» e «é sempre uma ‘derrota da humanidade’» (38), a ponto de hoje ser «muito difícil sustentar os critérios racionais maturados em outros séculos para falar de uma possível ‘guerra justa’» (39). Prossegue-se com o ‘sofrimento dos migrantes’, cuja «vida é colocada em risco porque não têm mais os meios para formar uma família, para trabalhar ou para nutrir-se» (40). O documento se detém depois no ‘tráfico de pessoas’, que está assumindo «dimensões trágicas» e é definida como «uma atividade indigna, uma vergonha para as nossas sociedades que se dizem civilizadas», convidando «exploradores e clientes» a fazer um sério exame de consciência (41). Do mesmo modo, se convida a lutar contra fenômenos como «comércio de órgãos e tecidos humanos, exploração sexual de crianças, trabalho escravizado, incluída a prostituição, tráfico de drogas e de armas, terrorismo e crime internacional organizado» (42). Cita-se ainda ‘o abuso sexual’, que deixa «profundas cicatrizes no coração daquele que o sofre» : trata-se de «sofrimentos que podem durar toda a vida e a que nenhum arrependimento pode remediar» (43). O texto continua com a discriminação das mulheres e a violência contra elas, citando entre essas últimas «a constrição ao aborto, que fere seja a mãe que o filho, tão frequente para satisfazer o egoísmo dos homens» e «a prática da poligamia» (45). Condena-se o ‘feminicídio’ (46).

Aborto e Maternidade sub-rogada

Firme, depois, é a condenação ao aborto : «entre todos os delitos que o homem pode cometer contra a vida, o aborto procurado apresenta características que o tornam particularmente grave e deplorável» e se recorda que a «defesa da vida nascente está intimamente ligada à defesa de qualquer direito humano» (47). Forte também é a contrariedade à maternidade sub-rogada, «através da qual a criança, imensamente digna, torna-se mero objeto», uma prática «que lesa gravemente a dignidade da mulher e do filho... que se funda sobre a exploração de uma situação de necessidade material da mãe. Uma criança é sempre um dom e nunca objeto de um contrato». (48) Na lista são citados ainda a eutanásia e o suicídio assistido, confusamente definidos por algumas leis como «morte digna», recordando que o «o sofrimento não faz perder ao doente aquela dignidade que lhe é própria de modo intrínseco e inalienável» (51). Fala-se, portanto, da importância dos cuidados paliativos e para evitar «toda obsessão terapêutica ou intervenções desproporcionais», reiterando que «a vida é um direito, não a morte, a qual precisa ser acolhida, não aplicada» (52). Entre as graves violações da dignidade humana, encontra lugar também o ‘descarte’ das pessoas com deficiência (53).

Teoria de gênero

Depois de reiterar que em relação às pessoas homossexuais deve ser evitada «‘toda marca de injusta discriminação’ e particularmente toda forma de agressão e violência», denunciando «como contrário à dignidade humana» o fato de que em alguns lugares pessoas «são encarceradas, torturadas e até mesmo privadas da vida unicamente pela sua orientação sexual.» (55), o documento critica a teoria de gênero, «que é perigosíssima porque cancela as diferenças na pretensão de tornar todos iguais» (56). A Igreja recorda que «a vida humana, em todos os seus componentes, físicos e espirituais, é um dom de Deus, que se deve acolher com gratidão e colocar a serviço do bem. Querer dispor de si, como prescreve a teoria de gênero... não significa outra coisa senão ceder à antiquíssima tentação do homem que se faz Deus» (57). A teoria do gênero quer «negar a maior das diferenças possíveis entre os seres viventes : a diferença sexual» (58). Portanto, «devem-se rejeitar todas aquelas tentativas de obscurecer a referência à insuprimível diferença sexual entre homem e mulher» (59). Negativo também o juízo sobre a mudança de sexo, que «arrisca a ameaçar a dignidade única que a pessoa recebeu desde o momento da concepção. Isto não significa excluir a possibilidade que uma pessoa portadora de anomalias dos genitais, já evidentes desde o nascimento ou que se manifestem sucessivamente, possa decidir-se por receber assistência médica com o fim de resolver tais anomalias» (60).

Violência digital

O elenco se completa com a ‘violência digital’, e cita as «novas formas de violência se difundem através das redes sociais, por exemplo o cyberbullying» e a «difusão da pornografia e de exploração das pessoas para fins sexuais ou através dos jogos de azar» na rede (61). A declaração se encerra exortando «a colocar o respeito pela dignidade da pessoa humana, para além de toda circunstância, ao centro dos esforços pelo bem comum e de todo ordenamento jurídico» (64).

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2024-04/documento-doutrina-da-fe-dignitas-infinita-dignidade-humana.html

terça-feira, 9 de abril de 2024

A tática cristã do amor

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre José Alem, CMF


Despojarmo-nos das coisas supérfluas e doá-las a quem necessita torna-nos mais coerentes com a palavra de Jesus, que diz ‘Quem de vocês não renuncia a tudo o que possui não pode ser meu discípulo’ (Lc 14,33). 

Assim começa nossa aventura de caminhar seguindo Jesus. Ele veio fazer uma revolução para mudar o mundo e nós que queremos segui-lo. Cumprindo seus ensinamentos, devemos procurar também modificar o mundo, produzir uma profunda renovação na sociedade, fazer nascer a fé nos corações das pessoas, reacendê-la nas pessoas que não se comprometem seriamente com o seguimento de Jesus, o que repugna aos homens e mais ainda a Deus. Jesus disse : ‘Eu vim trazer fogo sobre a terra e que outra coisa desejo senão que se acenda?’ (Lc 12,49). Vamos acender os corações – começando pelos nossos –, fazendo circular entre nós o verdadeiro amor. 

Toda mudança, qualquer revolução precisa de uma estratégia e ordem. É preciso um método e meios que ajudam a atingir os objetivos, a conduzir à vitória certa. Qual é a tática da nossa revolução pacífica? 

É verdade que, muitas vezes, sentimos o coração explodir de alegria pelo desejo de comunicar aos outros o imenso tesouro que descobrimos quando seguimos Jesus e amamos a todos como Ele ama e ensina. Muitas vezes comunicamos nosso entusiasmo e até convidamos outros a seguir o que o Evangelho ensina. Às vezes, nossas palavras não são bem aceitas, compreendidas, mas há também quem as entende e segue também nosso convite. Outras vezes encontramos, no ambiente onde estamos, indiferença, incompreensão e até zombarias. Tudo isso talvez aconteça porque não usamos a tática fundamental de nossa revolução. 

No entanto, e encontramos a pérola preciosa, se descobrimos algo belo e bom que transforma nossas vidas e nos dá sentido para viver, conservemos tudo isso nos corações. Agradeçamos a Deus e peçamos a Ele ardentemente, no silêncio de nossos quartos, ou diante de Jesus presente no tabernáculo nas igrejas ou mesmo no profundo de nossos corações onde Ele habita, para que nos faça verdadeiros apóstolos seus. 

Em seguida, antes de falar, comecemos por fazer, isto é, a amar. Era assim que Jesus fazia : agia e depois ensinava. 

Olhe ao seu redor e em todas as pessoas que encontrar veja nelas o próprio Jesus. Ame as pessoas. 

Se elas sofrem, sofra com elas. Se estão alegres, alegre-se com elas. Elas têm preocupações? Console-as. Estão em dificuldades? Divida-as com elas. Querem jogar? Jogue com elas. Querem passear? Acompanhe-as. Querem estudar? Ajude-as. Ajude sua mãe em casa quando ela precisa. Ajude a cuidar do irmãozinho ou dos avós idosos ou enfermos. Seja para eles como um anjo da guarda. 

Enfim, ame, ame sempre. Mesmo que isso lhe custe, faça tudo que puder para estar unido ao próximo, exceto nas coisas más que logicamente devemos evitar sempre. Fazer-se um com os outros, eis a tática nossa de discípulos de Jesus. Agindo assim muitos corações serão tocados e podem até perguntar por que você age assim com as pessoas. Aí então é o momento de falar, de explicar. Desse modo, as palavras que disser serão compreendidas porque antes foram vividas por você. Dessa maneira, outros poderão querer seguir também seu exemplo. 

Vivendo assim, Jesus permanece entre nós. Deixemos que Ele aja. Ele é onipotente. Esse amor vai se alastrando sempre mais.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/a-tatica-crista-do-amor.html