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terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Artesãos de misericórdia

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Irmão Darlei Zanon


A Igreja Católica não é uma ONG ou uma associação de voluntariado, isso já enfatizou o Papa em diversas ocasiões. No entanto, a Igreja é fonte de caridade e dentre as suas ações há muito espaço – e necessidade – do trabalho voluntário. Exatamente isso é o que enfatiza o Papa Francisco no seu vídeo do mês de dezembro, no qual pede orações pelos voluntários e pelas organizações de voluntariado. Mais especificamente, Francisco convida-nos a rezar ‘para que as organizações de voluntariado e promoção humana encontrem pessoas desejosas de empenhar-se pelo bem comum e procurem caminhos sempre novos de colaboração a nível internacional.’

Num mundo sempre mais individualista e marcado pela cultura do descarte, é interessante refletir sobre o significado e a importância do voluntariado, dentro e fora da Igreja. Voluntário é aquele que age por vontade própria, que se compromete com um trabalho ou assume a responsabilidade de uma tarefa sem ter a obrigação de o fazer, que realiza alguma ação movido pelo desejo sincero de fazer o bem, sem esperar nada em troca, sem pretender nenhum pagamento pelo trabalho exercido. Alguém que quer colaborar com a construção de um mundo melhor, agindo por empatia, ou seja, com a capacidade de se colocar no lugar de outra pessoa.

Ser voluntário nos enche de alegria. E vai muito além, pois nos abre à justiça social, ao amor ao próximo, ao desenvolvimento humano, ao crescimento pessoal e comunitário. Exatamente isso é o que destaca o Papa Francisco no seu vídeo do mês : ‘o mundo precisa de voluntários comprometidos com o bem comum’. Precisa de pessoas que se comprometam com o outro, com a comunidade, que estejam dispostos a ‘multiplicar a esperança’.

Para ilustrar a importância do voluntariado, o Sumo Pontífice utiliza uma expressão muito bonita e cheia de significado : a imagem do artesão, tantas vezes já utilizadas por Francisco, junto ao conceito de misericórdia, sentimento ou virtude ao qual dedicou inclusive um ano jubilar (2016). Francisco afirma que ‘ser voluntário é ser artesãos de misericórdia : com as mãos, com os olhos, com o ouvido atento, com a proximidade’.

Artesão é aquele pequeno produtor que exercita a sua arte com paciência, cansaço, cuidado e constância, mas também com grande maestria. Produz objetos cuja realização exige uma particular capacidade técnica e um específico gosto estético. O artesão é um profissional no seu campo, mas é também um artista, criativo, inovador, minucioso. Empenha-se e envolve-se profundamente na sua criação, vê a sua obra como uma extensão da sua pessoa. O artesão dá vida, ‘põe a mão na massa’ diríamos popularmente.

O conceito de artesão exprime bem a visão e a metodologia de trabalho a serem concretizadas para alcançar a misericórdia e a comunhão. É um trabalho feito de pequenos e grandes gestos, a cada dia, em cada situação, colocando atenção a cada pequeno detalhe, como fizeram Jesus e os seus discípulos. Ser artesão significa, como indicou o Papa Francisco em outra ocasião, «praticar a paciência, o diálogo, o perdão, a fraternidade» (Angelus, 19 de fevereiro de 2017).

A imagem do ‘artesão’ é utilizada pelo Papa com frequência. Poderíamos recordar, por exemplo, de quando incentivou os participantes no Concerto Beneficente ‘Avrai’, realizado na Sala Paulo VI em 2016, a serem ‘artesãos de misericórdia a cada dia’; ou quando nos falou dos ‘artesãos de justiça e de paz’, na mensagem para a LIII Jornada mundial da Paz (1° de janeiro de 2020); de ‘artesãos de fraternidade’, na mensagem na Praça do Campidoglio, Roma (26 de março de 2019); ou então dos ‘artesãos de hospitalidade’, durante a cerimônia de boas-vindas na Tailândia (21 de novembro de 2019); e ainda de ‘artesãos de paz’, no Angelus de 1° de janeiro de 2019. Comum a todos esses discursos, inclusive à imagem do voluntário como um ‘artesão de misericórdia’, está a certeza de que a atividade artesanal requer trabalho exigente e contínuo, e pode dar resultados esplêndidos, gerando verdadeiras obras de arte.

A misericórdia que somos convidados a construir artesanalmente através do voluntariado se torna sinal potente do amor de Deus no mundo e por isso um testemunho forte de comunhão, de fraternidade e de alegria do Evangelho. Tema provocador para refletir e rezar especialmente durante o Advento, enquanto esperamos alegres e ansiosos pela encarnação do Filho de Deus, expressão maior do seu amor e misericórdia.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2022-12/artesaos-misericordia-papa.html

quarta-feira, 25 de agosto de 2021

A responsabilidade da pregação cristã para com o diálogo em tempos de intolerância

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo do Padre Francisco Thallys Rodrigues

 

‘A base fundamental da pregação cristã é o anúncio da boa nova do Reinado de Deus, proclamado por Jesus, este que se expressa como um tempo novo para os excluídos, pobres e sofredores. O princípio fundamental da fé cristã é o amor a Deus e ao próximo vivido no cotidiano da vida. Seguir Jesus é manifestar o amor de Deus pela humanidade por meio da palavra e do testemunho. Neste contexto, denunciar as injustiças e situações de exploração deve ser parte integrante da espiritualidade dos cristãos de todos os tempos, expressos em palavras e atos. O problema é que muitas vezes a denúncia da injustiça e o anúncio da boa nova do Reino tem cedido espaço para discursos pretensamente ‘neutros’, sem posição diante das ameaças à vida, ou em outros casos tem cedido espaço para o discurso de ódio. Qual a importância da pregação cristã num contexto de dificuldade de diálogo?

Na palavra e ação de Jesus encontramos uma abertura fundamental ao próximo, independentemente de sua situação ou condição. Acolhe a todos que o procuram nas mais variadas situações não se atendo a questões culturais, religiosas ou étnicas. Isto ocorre mesmo com aqueles que claramente se opunham a ele ou procuravam matá-lo. O Reinado de Deus anunciado por Jesus não foi imposto, mas trata-se de um convite que supõe uma adesão livre e por amor. A pregação de Jesus tem por base fundamental a experiência filial com Deus, ela é acompanhada por um testemunho sincero e fecundo. Os cristãos devem reconhecer-se nesta experiência filial com o Pai que conduz a vivência da fraternidade com os irmãos e irmãs. Filiação e fraternidade tornam-se essenciais numa vida segundo o Espírito.

No decorrer dos séculos, a pregação, acompanhada do testemunho, tornou-se o eixo fundamental para o crescimento do cristianismo seja nos espaços celebrativos ou mesmo na expansão da atividade missionária. Tão grande era a importância da pregação cristã que, no contexto medieval, surgiu uma ordem (dominicanos) especialmente dedicada à pregação em vista da conversão daqueles que muitas vezes eram considerados ‘hereges’. Mesmo em nossos tempos, uma quantidade significativa de pessoas dirige-se semanalmente, ao menos, às igrejas e templos para participarem de celebrações que dedicam uma parte, ou quase sua totalidade, à pregação a partir dos textos bíblicos.

Quando se considera o momento atual, marcado pela crescente polarização em todos os setores e o crescimento do ódio, a pregação cristã tanto pode favorecer espaços de abertura e diálogo, quanto pode levar ao acirramento de ânimos, aumentando a segregação e o ódio. Quando se parte do princípio de que o respeito e a capacidade de escuta são exigências fundamentais do amor cristão, o diálogo torna-se possível. Trata-se de um processo de maturidade para reconhecer que o outro tem igual dignidade mesmo que não professe a mesma fé ou que não concorde com o que pensamos. Dentro das próprias comunidades cristãs torna-se urgente insistir em sua diversidade como expressão dos próprios dons do Espírito, tendo consciência de que o Evangelho de Jesus é ponto fundamental que nos une. Tal experiência quando asseverada nas pregações pode favorecer maior solicitude diante do próximo. Não faltam exemplos de homens e mulheres que, em cada tempo e lugar, estabeleceram diálogos, aparentemente impossíveis, tal é o caso de Francisco de Assis com o Sultão; ou Charles de Foucauld com os mulçumanos no deserto africano.

Por outro lado, a pregação cristã pode conduzir ao fechamento em si mesmo quando os pregadores estabelecem uma linha divisória entre os espirituais e os profanos ou se quiser outra linguagem, entre os batizados e os ‘do mundo’. Nesta concepção, estes últimos encontram-se destituídos de valor porque não acolheram a boa nova de Deus, não se ‘converteram’. Neste caso, o diálogo só é possível quando os ‘perdidos’ decidem entrar num processo de conversão ou mostram alguma disposição para fazê-lo. Do contrário, o diálogo torna-se impossível. O extremismo de tal posição pode levar ao cerceamento do outro, tal como aconteceu também na história, por mais de uma vez, aos judeus e, no caso brasileiro, às religiões de matriz afro. O crescente ódio dos cristãos motivados por pregações de cunho farisaico, fundamentalista e, porque não dizer elitista (no sentido de termos os salvos e os condenados), é uma enorme contradição com o Evangelho de Jesus e com a vida dos cristãos.

Neste cenário, os pregadores cristãos deveriam insistir no diálogo como elemento fundamental para a vivência do Evangelho. O diálogo supõe capacidade de abertura, reconhecimento de valor e consideração do outro como irmão e não como inimigo. O caminho parece ser insistir na necessidade de construir pontes e estabelecer diálogos, pequenos consensos que possam conduzir a uma abertura. Além disso, não se deve esquecer que o mais fundamental deverá ser o testemunho dado no cotidiano da vida que como fermento na massa transforma o mundo.

Portanto, o papel da pregação cristã neste cenário é convidar ao seguimento de Jesus que exige uma constante conversão para o serviço a Deus e aos irmãos e irmãs. Estes não podem ser compreendidos unicamente como aqueles que fazem parte da mesma confissão de fé, mas deve incluir a todos sem distinção. A pregação cristã será mais evangélica na medida em que expressar aquilo que foi o mais fundamental na vida de Jesus : o amor feito doação a todos os irmãos e irmãs a partir da experiência filial com o Pai animado pelo Espírito.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/noticia/1534402/2021/08/a-responsabilidade-da-pregacao-crista-para-com-o-dialogo-em-tempos-de-intolerancia/

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Responsabilidade religiosa e pastoral: o contraponto ao desserviço ao Evangelho

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Felipe Magalhães Francisco,

teólogo


‘Pessoalmente, uma das coisas que mais causa indignação é o uso do poder religioso para enganar pessoas. Religião é, também, uma questão de poder. É por isso que muitas pessoas adentram por este universo. Exercer uma posição de liderança religiosa exige muita responsabilidade : o aspecto religioso é psiquicamente estruturante para muitas pessoas. Um manejo irresponsável disso, pode causar muitos danos, alguns irreversíveis, aos sujeitos religiosos. É por isso também, entre outras coisas, que o processo de formação para um candidato ao Sacramento da Ordem – isto é, para se tornar padre – exige acompanhamento sério, multidisciplinar, com amparo psicológico. É um processo longo de formação, que tem como parte o curso de duas graduações. Ainda assim, não há certezas de que o processo foi bem feito, frutífero. Apesar de toda a complexidade do processo, há uma espécie de fracasso na formação de presbíteros, salvo algumas exceções.

Em nossa atualidade, tudo cai nas redes de forma muito rápida, sejam as boas coisas, como as ruins – e, definitivamente, este não deve ser um critério para que as pessoas tenham medo de se expressar, mas para que pensem o papel social que exercem, que precisa ser responsável. Ao mesmo tempo em que acompanhamos notícias envolvendo um pe. Júlio Lancellotti (ameaçado de morte, vale dizer, por fazer o bem!), que inspira bom testemunho de serviço ao Evangelho, vemos viralizar vídeos de homilias e falas de clérigos – presbíteros e bispos – que fazem com que os cristãos e cristãs minimamente conscientes de sua fé em Jesus Cristo, tenham vergonha e indignação. Isso sem falar em lideranças religiosas de outras confissões cristãs, que sequer têm o preparo mínimo para exercerem o papel de pregadores e pregadoras. Nesse descaminho do Evangelho, temos desde bispo que se recusa a aparecer próximo de um jovem que tem uma postura que destoa do padrão heteronormativo, quanto padres que usam da Mesa da Palavra – lugar digno onde, sacramentalmente, o próprio Jesus se manifesta –, para propagar inverdades sobre a pandemia que vivemos, e a vacinação, única solução viável até o presente momento, para superarmos essa tragédia sanitária.

Esses dois casos são escandalosos. Ainda assim, não vimos sequer notas de repúdio, por parte de representantes autorizados da Instituição. Infelizmente, temos um clero corporativista, que evita se indispor com seus pares, mesmo que seja para uma correção fraterna, aos moldes do que nos propõe o Evangelho de Mateus. O silêncio é conivente! São tempos difíceis, de ódio e de fortalecimento de propagação de mentiras; e tudo o que menos precisamos, são de clérigos que atuem para a ascensão deste anti-Evangelho. De que adiantam documentos pastorais dizendo que a Igreja acolhe as diferenças, não julga e não exclui, que todas as pessoas são bem-vindas no redil do Senhor, quando alguém que destoa de certo comportamento padrão é evitada, com muito constrangimento, para que um bispo não seja mal interpretado pelo olhar de alguns? Qual a legitimidade de uma Igreja que se diz atuar em favor da vida, quando um presbítero se propõe a pregar inverdades sobre uma vacina, usando o engodo de fetos abortados, para causar pavor nos fiéis? Alguns podem pensar, e até mesmo dizer, que estes não representam a Igreja. De fato, eles não são o todo da Igreja, que é plural, benéfica e maleficamente. Mas, mesmo não sendo o todo da Igreja, eles são a Igreja : afinal, não é esse um dos significados teológico-sacramentais do Batismo?

Ou o catolicismo começa a lidar com mais seriedade e transparência evangélicas com estes casos absurdos, que podem parecer isolados, mas que pipocam no dia a dia, por todos os cantos, ou seremos uma Igreja cada vez mais desacreditada, e isso não sem razão! O descrédito da Igreja é, em última análise, o descrédito do Evangelho e do Reino, aos quais a Igreja deve ser fiel servidora. Descrédito entre os de fora, má educação da fé para os de dentro. Enquanto uma infeliz claque aplaude a lacração ultraconservadora de alguns clérigos, o Evangelho perece e a fé se esvazia. De que vale uma Igreja assim?

 

Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/noticia/1497935/2021/02/responsabilidade-religiosa-e-pastoral-o-contraponto-ao-desservico-ao-evangelho/

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Não é o que nos falta. É o que temos.

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Marta Arrais,
cronista


‘Não é o que nos falta. É o que temos.

Não são os que nos falharam. São os que sempre estiveram.

Não é o que nos falta andar. É o caminho que já fizemos.

Não é a mágoa de estimação. É a alegria que acaba por se descobrir, apesar de tudo.

Não é o que não se conseguiu fazer. É o que se conquistou quando não se esperava nada.

Não é o que os outros nos dizem. É o que nós escolhemos ouvir.

Não é o que sonhamos. É o que escolhemos fazer.

Não é o que fica no papel. É o que se torna ação, gesto, força e ternura.

Não é o plano. É o que implica construir.

Não é a casa. É quem temos dentro dela.

Não é o que se diz. É como se diz.

Não são as luzes que se acendem. São as luzes que podemos acender.

Não é o prémio no final. É o que se aprendeu até lá chegar.

Não é o passado. É a história que nos trouxe até aqui.

Não é o futuro. É a possibilidade bonita de ficar por cá mais um bocadinho. Ou não.

Não é o tempo que corre depressa. Somos nós.

Não é a vida. Somos nós.

Não é o que tem que ser. Somos nós.

Não há coincidências. Há caminhos.

A vida nunca é sobre o que nos falta. É (quase) sempre sobre o que temos.’


Fonte :

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Papa sobre pedofilia: 'responsabilidade e transparência'

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 Papa Francisco discursa na abertura da reunião sobre a proteção de menores, no Vaticano.
*Artigo de Mirticeli Dias de Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa da Santa Sé



A assembleia, cuja proposta é debater o problema a partir de duas diretrizes apresentadas por Papa Francisco - ‘responsabilidade e transparência’ -, admite ao mundo a enorme contradição que existe quando em uma instituição que diz prezar pela dignidade humana e cuja matriz é, por essência, educadora, se manifeste esse tipo de crime hediondo. E Francisco tem consciência disso.

Em 3 anos, não foram poucas as denúncias de abusos contra menores e adultos envolvendo padres, religiosos e até um cardeal, o americano Theodore Edgar McCarrick, recentemente demitido do estado clerical por Francisco. A maioria dos casos, ocorridos entre as décadas de 70 e 80, só vieram à tona agora. Os acobertamentos e as falhas na deliberação de medidas concretas estão entre as principais causas desse ‘boom’ que aconteceu do dia para a noite.

Em meio a esses escândalos que abalam as estruturas da Igreja Católica, o papel da imprensa tem sido fundamental. É tanto que, na coletiva de imprensa realizada esta semana, os membros da comissão responsável pela assembleia surpreenderam a todos ao elogiar o trabalho realizado pelos jornalistas, com destaque para os profissionais do The Boston Globe que integraram a famosa rede de investigação Spotlight. No caso do Chile, foi graças à apuração da jornalista chilena Paulina de Allende que o ex-sacerdote Fernando Karadima foi a julgamento.

Enquanto dentro dos ‘sagrados palácios’ os 190 membros da hierarquia católica discutem como lidar com essa crise, do lado de fora os membros de associações formadas por vítimas de abusos, que vieram a Roma, protestam em locais públicos, em frente à praça de São Pedro e no centro da cidade. É a voz do povo que clama por justiça e denuncia o abuso de poder presente em parte de uma estrutura marcada pelo clericalismo e pelo carreirismo, duas chagas que Francisco pretende combater e que, na visão dele, estariam por trás de todos esses crimes.

Um dia antes do início da reunião, 12 vítimas de abusos cometidos por religiosos encontraram os membros da comissão de combate à pedofilia na Igreja. O evento, cujo encerramento acontecerá no domingo (24), gera esperança porque é a primeira vez na história que um pontífice coloca nas mãos da Igreja universal a responsabilidade pelo ocorrido e, juntamente com ela, tenta achar uma saída para que tais situações dramáticas não se repitam.

É certo que, com a iniciativa, a expectativa é que a vigilância nas dioceses se intensifique, do contrário, tudo continuará do jeito que está. Os bispos bolivianos, representados pelo presidente da conferência episcopal, pretendem apresentar ao Papa Francisco a proposta de um ‘protoloco de atuação’ contra padres pedófilos. Da mesma forma, outros líderes católicos terão a liberdade de propor linhas de ação no decorrer do evento. Agora é esperar para ver se, além dos documentos e boas intenções, esse mal seja erradicado de vez do seio da Igreja Católica.

Nossa falta de resposta diante do sofrimento das vítimas, ao ponto de rechaçá-las e de acobertar o escândalo para proteger os autores e as instituições, acabou com o nosso povo’, disse o cardeal filipino Luís Antonio Tagle, um dos 9 relatores escolhidos para discursar durante a assembleia.’


Fonte :  

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Recuperar as instituições

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG


‘É grave o processo de sucateamento das instituições. Isso porque os funcionamentos institucionais, frequentemente, são obsoletos e não conseguem promover o bem da coletividade.  Essa realidade traz resultados nefastos para cada instituição – sejam elas governamentais, educacionais, religiosas ou familiares, além de prejuízos para toda a sociedade. Os investimentos para se adequar processos são insuficientes e, consequentemente, os resultados são pífios na prestação de serviços. Um mal terrível que envolve variadas instituições, inclusive as que têm seu balizamento maior na experiência da fé.

A sociedade pede mais consistência por parte das organizações, que precisam cumprir bem sua tarefa : assumir a responsabilidade de cooperar para a transformação de uma sociedade carente de novos impulsos e inovações. É preciso deixar de insistir em práticas de tempos que já se foram. Muitas ações que são próprias do passado já não têm força para interagir com as demandas do mundo contemporâneo. Consequentemente, não conseguem interferir positivamente na realidade. Mas ainda assim, permanecem os gastos - com recursos financeiros e também humanos - direcionados a esses funcionamentos inadequados. As pessoas ficam submersas na mediocridade de escolhas e de encaminhamentos. Conviver com a pequenez naquilo que se faz, por não se engajar nos processos de mudanças, torna-se normal. Isso trava criatividades e amordaça muitos na condição de não conseguir contribuir. Cria-se facilmente o vício de se fazer das configurações institucionais, nos seus funcionamentos, simplesmente um amparo para quem se satisfaz com a oportunidade de ter um ‘lugar ao sol’. Ora, esse fenômeno é a contramão das dinâmicas modernas e inevitáveis das inovações.

Inovar é uma exigência e deveria ser a meta, mas os agentes da inovação – as pessoas que integram as instituições – se satisfazem com a conquista de uma zona de conforto que mata gestos de altruísmo, impedindo o ser humano de ser participe na criação e recriação. Compreende-se, assim, porque a ocupação de cargos não é garantia para uma atuação proativa e com força de transformação. O marasmo no interior das instituições envolve como uma nuvem a preciosidade de cada pessoa. O resultado nefasto é o cumprimento de mandatos ou tempo de serviço com opacidade.

Percebe-se que a dimensão pessoal sucateia a instituição. Mas, também a dimensão institucional pode prejudicar as pessoas, enjaulando-as, inclusive as que têm grande potencial. Sem conseguir mostrar a própria capacidade, elas permanecem na linha mediana de atuação.  Por isso, cada pessoa precisa assumir o compromisso de lançar um olhar sobre a instituição na qual se insere, buscando saídas para a terrível fragilização das organizações. Essa fragilização é fundamentada na incompetência que afeta modos de agir e nos desvios ético-morais que, inclusive, levam agentes a usufruírem, de modo desonesto, de recursos institucionais, conduzindo velozmente as organizações, na qual trabalham, rumo a precipícios.

O fato mais comum é, consciente ou inconscientemente, tender a escolhas que levem a colocar responsabilidades e intervenções nas mãos de quem não as operará adequadamente. Certamente, trata-se de mecanismo de defesa que perpetua a mediocridade que, infelizmente, incomoda menos. O que incomoda mais é o desafio de desinstalar-se da ‘zona de conforto’ para responder às exigências e às demandas do dia a dia, às necessidades de qualificação permanente do tecido institucional. Esse tecido, quando fortalecido, pode alavancar mudanças que levem às soluções adequadas para o tempo atual.  Assim, em gesto de humildade e batendo penitencialmente no peito, cada pessoa precisa cultivar uma consciência cidadã e não apenas ocupar postos que representem, somente, oportunidade de promoção pessoal. Todos devem assumir a responsabilidade para ajudar a encontrar novas respostas, com trabalho produtivo. Esse é um indispensável caminho no combate à mediocridade, no enfrentamento das demagogias e na coragem de avaliar, sinceramente, o que se está fazendo, para encontrar os caminhos da inovação e recuperar as instituições.’


Fonte :


quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Sou eu o responsável por meu irmão?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Fabrício Veliq,
protestante, é mestre e doutorando em
teologia pela Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE),
doutorando em teologia na Katholieke Universiteit Leuven - Bélgica,
formado em matemática e graduando em filosofia pela UFMG


‘Sou eu responsável pelo meu irmão? Essa pergunta se encontra no início do livro do Gênesis (Gn 4:9) e faz parte da narrativa a respeito de Caim e Abel. Ela surge em resposta a uma outra feita por Deus a Caim a respeito do paradeiro de Abel que havia sido morto. Embora seja um simples diálogo, ainda hoje ele nos faz refletir a respeito da nossa relação com nossos irmãos e irmãs. Gostaria de propor dois aspectos que a resposta de Caim à pergunta feita por Deus nos faz pensar a respeito da nossa relação com nossa irmandade.

O primeiro, diretamente ligado à narrativa, tem a ver com a indiferença. A resposta de Caim denota uma postura indiferente em relação ao seu irmão Abel. Se trouxermos para nossos dias, isso quer dizer que simplesmente não nos é importante saber aquilo que acontece com quem está próximo de mim e com minha irmandade que está na Terra. Dessa forma, tanto faz se quem mora na mesma região que eu passa fome, tem necessidades, é violentado ou violentada em seus direitos ou em seus corpos, não tem os filhos e filhas na escola, etc. Se não faz parte do meu convívio e se não tem minha amizade, então, simplesmente, não preciso fazer nada para ajuda-los ou me importar, verdadeiramente, com eles. Basta passar a ideia de alguém engajado com justiça social e equidade de todos nas redes sociais para me ver como alguém que realmente se importa com todos. Em um mundo virtual, em que ações efetivas tem se tornado cada vez mais raro, passar a impressão de que se é alguma coisa se torna mais importante do que realmente ser aquilo que se fala. Porém, ao fazermos isso, não estamos simplesmente dando a mesma resposta que Caim deu com uma pitada de hipocrisia? No final, nossa atitude continua a mesma a de Caim com relação à Abel, seu irmão.

O segundo, trazendo de uma maneira interpretativa da atualidade, tem a ver com o julgamento que fazemos em relação àqueles e àquelas que pensam diferente de mim. Não dificilmente, ouvimos pessoas dizerem frases do tipo sempre que algum escândalo acontece : ‘não tenho nada a ver com isso’; ‘eu, ser igual a esses? Jamais’; ‘Que eu tenho a ver com essa pessoa que faz isso?’; ‘Eu jamais faria algo assim’, dentre diversas outras que poderíamos listar e, com certeza, seria do mesmo teor. Ao fazermos isso, nos colocamos em posição de julgamento em relação ao nosso irmão sem reconhecermos que também seríamos capazes de cometermos os mesmos atos que esse cometeu. Dessa forma, a pergunta de Caim, se tomada em seu sentido justificador, nos coloca não como indiferentes, antes, como superiores em relação ao nosso irmão ou irmã.

Qual o perigo disso? O perigo está, justamente, ao nos considerarmos fortes o suficiente para não sucumbir às tentações e nos transformamos nos monstros que combatemos. Se observarmos bem, transformarmos nos monstros que combatemos é o que mais acontece em cenários atuais. Basta vermos que os que mais condenavam a corrupção têm se revelado pertencerem aos mais corruptos, os que mais condenavam os homossexuais se revelaram, com o passar do tempo, também homossexuais, os que condenavam veemente a teologia da prosperidade se transformaram em um de seus pregadores e a lista segue indefinidamente.

Nisso tudo, o que é importante de percebermos é que, quanto mais nos colocarmos como aqueles que dizem : ‘que tenho eu a ver com meu irmão?’ maior será a probabilidade de, dadas as circunstâncias propícias, nos tornarmos naquilo que condenamos. Assim, reconhecermo-nos como capazes do mal em sua pior forma é, talvez, a maneira mais sábia de nos tornarmos pessoas mais humanas. Como disse Paulo : ‘quando sou fraco, aí que sou forte.’ (2 Co 12:10).

Estejamos sempre atentos para que nosso olhar em relação ao nosso próximo não se encaixe em nenhum desses, antes, que seja um olhar que reconheça a importância e também se reconheça nas dificuldades e fracassos que todos e todas passamos ao longo da vida. Assim, no lugar da indiferença surgirá um importar verdadeiro e no lugar do julgamento, a misericórdia entre nós que somos todos iguais.’


Fonte :

sábado, 2 de julho de 2016

Convicção X conveniência

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)


*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG


‘As dinâmicas da vida em sociedade carecem de imprescindível convicção : o bem do outro, particularmente dos mais pobres, deve estar acima de qualquer outro bem ou razão. Por isso, torna-se importante refletir sobre a responsabilidade social, que precisa  orientar funcionamentos empresariais e presidir a consciência individual. O senso de responsabilidade social é indispensável para conduzir a sociedade desigual e empobrecida na direção da justiça e da prática cidadã de se buscar o bem comum. Isso é incontestável e há de ser uma convicção que inspire o comprometimento com a solidariedade.  Porém, lamentavelmente, há sempre o sério risco de se dedicar ao tema da responsabilidade social apenas de maneira teórica.  Nesse sentido, são construídas reflexões até bem arquitetadas, ancoradas em citações. Mas ficam apenas no campo das teses, não se efetivam em ações. Então, a abordagem sobre a responsabilidade social se torna mera conveniência, estratégia para conquistar a simpatia da sociedade ou do poder público.  Também, torna-se mero caminho para reunir apoios a projetos sociais que são verdadeiras migalhas, quando comparados ao lucro que seus autores acumulam em seus negócios.

Quando o discurso social conquista a simpatia de eleitores, mas não se desdobra em ações dos eleitos, reduz-se a mera conveniência. Da mesma forma, quando instituições - particularmente governamentais e empresariais - adotam slogans em que manifestam o ‘compromisso social’, mas disponibilizam pouco para reverter quadros de pobreza e exclusão, apenas instrumentalizam o discurso da responsabilidade social para conquistar simpatia. A apropriação desse discurso por mera conveniência pode, até mesmo, ocorrer por parte de organizações religiosas, que correm o risco de pregar certos valores relacionados à solidariedade, mas pouco fazem para mudar a realidade dos mais pobres. Responsabilidade social é, permanentemente, uma lição a aprender, prática que precisa ser exercida, compromisso para ser assumido. Quando os indivíduos, os funcionamentos empresariais e governamentais não a traduzem em práticas, torna-se apenas um discurso conveniente. O Papa Francisco sublinha, na Exortação sobre a alegria do Evangelho, que ‘a solidariedade é uma reação espontânea de quem reconhece a função social da propriedade e o destino universal dos bens como realidades anteriores à propriedade privada’. 

Nesse sentido, tranquilizar a própria consciência enquanto se acumula bens sem servir, decisivamente, ao bem comum, é um equívoco.  O bem de todos é, obviamente, mais importante que um simples usufruto familiar, partidário, institucional, empresarial. Sobre toda produção - lucro e aumento de posses - pesa uma hipoteca : o que deve ser devolvido aos pobres. Cada pessoa tem, no dízimo ofertado em suas comunidades de fé, a oportunidade para participar de projetos e campanhas que beneficiam a sociedade. E o mundo empresarial também é desafiado a apoiar projetos grandes, importantes e indispensáveis para o bem de todos. Iniciativas capazes de resgatar muitas pessoas de cenários marcados pelas misérias materiais e tantas outras que ferem dignidades, esfacelam a cidadania.

Urgente é cultivar a coragem para ‘por a mão no bolso’ e apoiar iniciativas que promovam a inclusão social e o bem dos mais pobres, agindo de modo coerente com os ensinamentos cristãos.  Práticas assim são remédio para evitar que as estruturas se tornem pesadas, propícias para hibernar a corrupção e a mesquinhez. Quanto mais a cidadania for balizada no sentido nobre e altruísta da solidariedade, mais a cultura ganhará força para manter funcionamentos que estão na contramão de tudo o que desgasta o patrimônio público.  Para isso é necessário ouvir o clamor do povo, que deve ser acolhido no coração de cidadãos, de instituições e empresas, e assim se convencer sobre a necessidade de investir e apoiar projetos dedicados ao bem de todos. Nesse caminho, quem puder ajudar não hesitará, mesmo que isso signifique diminuir o próprio lucro. A consciência generalizada de que o bem comum deve ser prioridade é um sonho, uma ousada meta. Porém, deixar de buscá-la significa alimentar o recrudescimento da violência, da indiferença que compromete a paz, e da ilusão de que a vida segura e civilizada é para poucos.

Quando o tema da responsabilidade social é convicção e não conveniência, nutre-se a coragem para investir em projetos necessários para o bem comum, a promoção da cultura, dos valores e das tradições que são riquezas de um povo. Essa convicção desperta, em todos, a consciência de que é fundamental participar, nos diferentes cenários, das iniciativas que busquem devolver a inteireza da dignidade humana. Para assumir a responsabilidade social como convicção, também é oportuno ouvir esta palavra interpelante do Papa Francisco : ‘É preciso repetir que os mais favorecidos devem renunciar a alguns dos seus direitos, para poderem colocar, com mais generosidade, os seus bens a serviço dos outros’.’


Fonte :
* Artigo na íntegra


quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Os dons nos foram concedidos não para nossa vaidade, mas para servir e amar a Deus e ao próximo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo de Dom Alberto Taveira Corrêa,
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará
  
‘Ao aproximar-se o final do Ano Litúrgico, a Igreja nos brinda com a conhecida Parábola dos Talentos (Cf. Mt 25, 14-30). Aquele que é a Sabedoria de Deus (Cf. 1 Cor 1, 24) nos oferece o caminho para assumir com dignidade a vida que nos foi dada de presente. A partir da parábola, ‘talento’ veio a significar um dom, habilidade ou qualidade. Ao tempo da redação do Evangelho, talento era uma unidade monetária equivalente a cinquenta quilos de prata, correspondente a cerca de seis mil denários, e um denário era a diária de um trabalhador do campo. O servo da parábola que recebeu um talento tinha muito em mãos e podia fazer tanto com o que lhe fora dado.

As parábolas são propostas pelo Senhor para provocar positivamente, suscitando uma resposta de vida. Do dinheiro passamos à nossa história. Os servos somos nós; os talentos são as condições oferecidas por Deus a cada um; o tempo de viagem do proprietário é a vida; a volta inesperada é a morte, nossa páscoa pessoal; a prestação de contas é o juízo e a entrada na festa, o banquete da alegria, oferecido pelo Senhor, o Paraíso. No final de tudo, quando a obra de nossa vida estiver concluída, no tempo certo conhecido pelo Senhor da História, haveremos de entregar os dons que nos foram concedidos não para nossa vaidade, mas para servir e amar a Deus e ao próximo.

Como Deus não impõe, mas propõe, à sua proposta cabe uma resposta. Temos consciência de não sermos proprietários da própria vida, mas administradores dos dons de Deus. Nenhuma pessoa inventou sua vida, nem a planejou por conta própria. Na maravilhosa criação de Deus, todas as pessoas sejam consideradas como obras primas, a serem aperfeiçoadas no correr dos anos, contando com a inspiração do Espírito Santo, que não abandona qualquer um dos filhos e filhas de Deus. É condição de felicidade identificar o projeto de Deus a respeito de sua própria vida e buscar todos os meios para realizá-lo. Cabe a cada pessoa abraçá-lo, na maravilhosa aventura da liberdade, com a qual todos foram feitos, ao assumir responsavelmente os rumos da existência.

Assumir responsabilidades! Tarefa exigente que pede formação e preparação adequada. O processo educativo na família, na escola e na Igreja pode contribuir para que as crianças, adolescentes e jovens sejam iniciados para ter nas mãos o rumo da própria existência. Para todas as idades, inclusive para nós, adultos, tudo começa com o reconhecimento de que todos têm valor aos olhos de Deus e diante dos outros. Discriminar, humilhar e condenar pessoas não corresponde ao plano do Senhor, que quer todos vivos e felizes. Ninguém seja visto como massa sobrante em qualquer campo da convivência humana.

Constitui-se uma personalidade responsável quando se leva em conta as condições de cada um, considerando idade, formação recebida, condições de saúde, temperamento, ambiente familiar e referências culturais e ambientais. Faz-se necessário muitas vezes exercer o papel de ‘caça-talentos’, para descobrir uma quantidade considerável de tesouros escondidos. Nestes dias, um menino de dez anos me foi apresentado como um dos líderes do projeto de evangelização numa das Paróquias da Arquidiocese de Belém. Como foi significativo ver o brilho dos olhos daquele que se sabe missionário! Sem forçar e exigir mais do que pode oferecer, ele se torna sinal para muita gente crescida!

Responsabilidade se aprende e há de ser assumida pouco a pouco, quando alguém se arrisca, confia e lança o outro para voos mais ousados. Há muita gente aguardando este voto de confiança! O Senhor faz assim conosco, agindo ‘como a águia que incita a ninhada, esvoaçando sobre os filhotes, também ele estendeu as asas e o apanhou e sobre suas penas o carregou’ (Dt 32, 11). Responsabilidade se consolida com dedicação, tempo, preparação das atividades, coragem para rever e recomeçar quando acontecem falhas, superação de julgamentos com os eventuais fracassos, idealismo cultivado com afinco.

Vale a pena até detalhar um caminho de revisão pessoal de vida, a esta altura do ano. Examinemos como aproveitamos o tempo, a pontualidade, a ordem, os deveres familiares, a dedicação ao trabalho. Como temos oferecido as qualidades e talentos recebidos para servir a Deus e ao próximo? Temos olhado ao redor para ver o que é possível fazer pelo bem comum na Paróquia, no bairro em que vivemos, ou, quem sabe, nas associações e organismos aos quais estamos ligados? Outro ponto para uma revisão corajosa da vida é ‘fazer bem feito’. Basta olhar para Deus, que fez tudo e todos como obra de arte, para entender que nossa passagem por este mundo, por sinal, muito breve, pode deixar um rastro de dedicação e amor. Até para o equilíbrio pessoal é importante realizar por inteiro as tarefas! E dentre os dons oferecidos pelo Senhor, venha em relevo o presente da Palavra de Deus. Faz parte da responsabilidade do cristão não reter para si o conhecimento das coisas de Deus, mas oferecê-la aos demais.

A liturgia da Igreja, celebrada neste final de semana, faz preceder a Parábola dos Talentos com um esplêndido texto do livro dos Provérbios :  ‘Uma mulher forte, quem a encontrará? Ela vale muito mais do que as jóias. Seu marido confia nela plenamente, e não terá falta de recursos. Ela lhe dá só alegria e nenhum desgosto, todos os dias de sua vida. Procura lã e linho, e com habilidade trabalham as suas mãos. Estende a mão para a roca e seus dedos seguram o fuso. Abre suas mãos ao necessitado e estende suas mãos ao pobre. O encanto é enganador e a beleza é passageira; a mulher que teme ao Senhor, essa sim, merece louvor. Proclamem o êxito de suas mãos, e na praça louvem-na as suas obras!’ (Pr 31, 10-13. 19-20. 30-31). Fortaleza, confiança, capacidade para oferecer alegria aos outros, trabalho, habilidade, partilha, temor do Senhor. Tais valores continuam atuais e se tornam talentos preciosos a serem postos ‘em circulação’ em nossos dias! Homens e mulheres de todas as idades os assumam com responsabilidade.


Fonte :
* Artigo na íntegra de http : //www.zenit.org/pt/articles/os-dons-nos-foram-concedidos-nao-para-nossa-vaidade-mas-para-servir-e-amar-a-deus-e-ao-proximo