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sexta-feira, 19 de julho de 2019

O mito sobre as catacumbas


Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 Catacumba de Priscilla, em Roma.
Catacumba de Priscilla, em Roma

*Artigo de Mirticeli Dias de Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa da Santa Sé


‘Um dia li em uma rede social : ‘Pelo jeito, voltaremos ao período das catacumbas’. E é muito comum que as pessoas associem os primeiros cristãos a esses cemitérios subterrâneos, ativos entre os séculos II e V e redescobertos só no século XVI. Primeiro entendamos o que são essas galerias repletas de sepulturas para depois desfazermos alguns mitos.

Antes de mais nada, devemos salientar que a descoberta desses lugares emblemáticos revolucionou o estudo a respeito da história dos primeiros cristãos. Como muitos sabem, foi possível conhecer grande parte da iconografia cristã e alguns costumes dos primeiros seguidores de Cristo através das várias inscrições deixadas nas paredes dessas galerias. As figuras do bom pastor, do ‘orante’, do monograma de Cristo e do peixe podem ser vistas ainda hoje pelos visitantes.

O ‘R.I.P’, por exemplo, sigla bastante propagada hoje nas redes sociais, significa ‘Descanse em paz’, Requiescant in pace em latim. Tal saudação foi encontrada pela primeira vez em uma lápide cristã do século IV.  E como não falar das invocações ‘Paule et Petre petite…’, voltadas aos mártires mais importantes da cristandade, as quais atestam que os cristãos do século III já acreditavam na comunhão e na intercessão dos santos?

Missas e perseguições

A indústria do cinema, baseada nas primeiras cartilhas da história do cristianismo, retrata que os primeiros cristãos, no período das perseguições, se escondiam nas catacumbas e lá realizavam suas celebrações litúrgicas. E tais afirmações entraram em cheio no imaginário popular.

Há uma confusão enorme a respeito dessa interpretação, pois as catacumbas, para início de conversa, eram locais públicos para o sepultamento dos mortos, chamadas posteriormente de coemeterium (cemitério - dormitório) pelos primeiros cristãos. Alguns desses terrenos eram de propriedade privada e funcionavam com o aval do império. Seguindo um costume da época, os mortos deveriam ser enterrados fora dos muros da cidade. Daí a origem do nome ‘Basílica de São Paulo fora dos muros’, a igreja onde foram depositados os restos mortais do apóstolo Paulo, que fica localizada em Roma.

Sendo assim, é no mínimo impensável que um cristão se escondesse em um lugar que era conhecido por todos. O que podemos dizer é que era um local de peregrinação, uma vez que os primeiros mártires foram sepultados e, consequentemente, cultuados nesses lugares. Só em São Calisto, estima-se que centenas de cristãos tenham sido enterrados, dentre os quais 9 papas.

Já em relação aos cultos religiosos, eles eram realizados sobretudo nas casas dos primeiros cristãos, as chamadas domus ecclesiae. Alguns desses lugares foram doados à Igreja e, por conseguinte, preservaram o nome de seus proprietários, como o caso da Basílica de São Clemente, em Roma, cujo dono era Clemente.

Não há fontes que atestem que os cristãos celebravam missas nas catacumbas. No entanto, sabe-se que eles celebravam o refrigerium, uma prática de origem pagã que consistia na realização de um banquete em honra ao morto. E daqui nasce a confusão de que, nas catacumbas, os cristãos celebrassem o banquete da Eucaristia. Na famosa catacumba de São Sebastião, por exemplo, havia um espaço reservado para isso. No local, foram encontradas várias inscrições At Paulum et Petrum refrigeravi, uma vez que os corpos dos dois apóstolos teriam sido transportados provisoriamente para lá.

É interessante confrontarmos os mitos que criamos com os estudos mais recentes a respeito da história do cristianismo. Ao contrário do que muitos pensam, o interesse pelas fontes nos leva a viver uma fé mais enraizada e menos ‘espetacularizada’. A melhor propaganda do cristão é seu testemunho, não o proselitismo do ‘vale-tudo’, repleto de informações infundadas. Sigamos em frente na busca e no amor pela verdade.


Fonte :

quarta-feira, 30 de março de 2016

Paquistão : as madrassas e os “cristãos das catacumbas”

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 lahore Cristiani-Pakistan

‘No domingo da Ressurreição, o Paquistão mergulhou de novo nas profundezas do ódio e da morte. Em Lahore, na região central do país, um suicida se explodiu em um parque repleto de famílias que celebravam com alegria.

O saldo (infelizmente) provisório é de 72 vítimas, incluindo 30 crianças, e pelo menos 340 feridos. A maioria pertence à comunidade cristã do Paquistão, 4% de uma população de preponderância muçulmana e que é alvo, pela enésima vez, de ataques atrozes.

A chacina alimentou um clima de tensão e de alarme. Em conversa com Zenit, quem fala desse clima é o professor Shahid Mobeen, que leciona Pensamento e Religião Islâmica na Pontifícia Universidade Lateranense e é fundador da Associação de Paquistaneses Cristãos na Itália.

Após o ataque, as minorias religiosas ficaram apavoradas. É difícil sair de casa’, explica ele, com base nos contínuos testemunhos que recebe por telefone de seu país. Mobeen conta que sua irmã estava em Lahore no domingo. Com ela e outros membros da família ‘está tudo bem’, porque tinham ficado em casa com outros parentes.

Parece que retornaram os tempos das catacumbas para os cristãos do país asiático. ‘Muitos pais estão evitando mandar os filhos para a escola e muitos também evitam os locais de maior aglomeração’.

Era o caso, no domingo, do parque infantil de Gulshan-e-Iqbal, onde muitas famílias cristãs comemoravam a tarde de Páscoa depois de terem participado das celebrações religiosas.

O ataque foi reivindicado pelos jihadistas do grupo Jamatul Ahrar, ligado ao principal grupo do Taliban paquistanês (Tehrik e Taleban Pakistan – TTP). Pode ser uma mostra de força do Taliban diante do Estado Islâmico (EI), que busca apoio entre as franjas mais extremistas do islã no Paquistão. Mobeen recorda que, ‘recentemente, foi desbaratado um grupo que pretendia criar uma filial do EI no Paquistão. Existem campos de treinamento onde os mujaheddin são recrutados pelo EI para cometer ataques não só no Paquistão, mas também no exterior’.

Muitos analistas interpretam o ataque em Lahore como um sinal enviado ao governo, que tem se mostrado disposto a alterar a lei antiblasfêmia introduzida em 1986 e que vem gerando muitas injustiças (e vítimas) entre os cristãos. Além de condenar à pena de morte quem ‘insulta’ a religião islâmica, essa lei tem sido usada muitas vezes como pretexto para indiciar, aprisionar e até linchar sem prova alguma os assim chamados ‘infiéis’.

Eu não acho que seja um sinal desse tipo’, objeta Mobeen. Ele acredita que, com este ataque, o grupo TTP ‘quis registrar a sua presença em Lahore para o primeiro-ministro Nawaz Sharif’, que é da cidade. O professor recorda ainda que o Talibã ‘já atacou várias outras áreas do país, como as que fazem fronteira com o Afeganistão e as do Sul’.

A demonstração de instabilidade do Paquistão ameaça a visita do papa Francisco, que recebeu o convite do governo de Islamabad faz algumas semanas. De acordo com Mobeen, a presença do papa no Paquistão se torna agora uma quimera, porque o ataque ‘mostrou todas as falhas de segurança das autoridades’ – autoridades, aliás, que, apesar dos discursos, parecem impotentes diante do crescimento do fundamentalismo islâmico, atribuído por Mobeen ao papel das madrassas, escolas corânicas que, ao longo dos anos e graças a abundante financiamento do exterior, têm corroído lentamente a educação pública no país.

Mobeen observa que os pais, ‘muitas vezes, sem contarem com escolas do Estado, são obrigados a enviar seus filhos às madrassas’, onde as crianças podem acabar doutrinadas para a jihad. Especialmente quando essas instituições são zonas francas do islamismo mais radical, livres de qualquer monitoramento.

De 40 mil madrassas no território nacional, as registradas pelo Estado e que seguem um mínimo do currículo não chegam a 8.000’, diz Mobeen. Isto significa que ‘cerca de 32 mil madrassas, frequentadas por centenas de milhares de crianças, são potenciais promotoras da ‘guerra santa’ contra o Ocidente, contra a democracia e contra as instituições’.

Para mudar a situação, Mobeen pede ao governo paquistanês que reative o Ministério Federal das Minorias, porque ‘nós, cristãos, não somos dhimmi (indivíduos não-muçulmanos) a ser protegidos, mas sim co-fundadores do Paquistão com pleno direito de cidadania’. A paz não passa pela proteção de uma minoria, mas pelo reconhecimento da igualdade de oportunidades.’


Fonte :
* Artigo na íntegra


quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

País muçulmano financia restauração de catacumbas

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)



Afrescos extraordinários das Catacumbas romanas dos Santos Marcelino e Pedro, num vasto sítio arqueológico aberto recentemente ao público, recuperaram seu antigo esplendor. Na sede do Pontifício Conselho da Cultura foram apresentados na manhã desta terça-feira os resultados da complexa obra de restauração, cujos custos foram cobertos em parte pela Fundação ‘Heydar Aliyev’, presidida pela Sra. Mehriban Aliyeva, esposa do Presidente muçulmano do Azerbaijão.

As Catacumbas dos Santos Marcelino e Pedro, na Via Casilina, 641, são uma extraordinária pinacoteca subterrânea. Terceiras catacumbas em Roma em extensão, abrigam em uma área de mais de 18 mil m² pinturas paleocristãs únicas no mundo, dentro do complexo arqueológico ‘Ad duas lauros’. O recente e precioso trabalho de restauração permite contemplar excepcionais afrescos em suas cores originais. Estas Catacumbas, ligadas ao martírio dos Santos Marcelino e Pedro, foram por séculos, assim como neste Ano Santo da Misericórdia, metas privilegiadas de peregrinação.


Os Santos Marcelino e Pedro

Pedro era um jovem exorcista que recusou-se abjurar da própria fé e de adorar outros deuses. Por isto foi torturado e encarcerado. Entre os carcereiros havia um homem especial, Artêmio, que profundamente tocado pela fé de Pedro, converteu-se ao cristianismo. Converteram-se também muitos outros detentos, carcereiros e famílias inteiras. Pedro não podia administrar o batismo e um sacerdote, Marcelino, foi até a prisão para batizar.


O martírio dos Santos Marcellino e Pedro

Marcelino e Pedro foram condenados à morte, sendo mortos em 304 d.C. por ordem do Imperador Diocleciano, que considerava o cristianismo um obstáculo para o desenvolvimento econômico e social do Império. Os dois mártires foram obrigados, antes da decapitação, a escavar o próprio túmulo com as mãos em uma densa floresta, conhecida como Floresta Negra, para que o local em que haviam sido enterrados permanecesse ignorado.


Restos mortais transferidos para o cemitério ‘Ad duas lauros’

Uma romana chamada Lucila, conseguiu transferir os restos mortais daquela área – que atualmente é chamada de Floresta Candida, em honra aos dois mártires – para um Cemitério cristão na Via Casilina, na localidade de ‘Ad duas lauros’. O lugar, mais tarde dedicado à memória dos dois Santos, tornou-se meta de peregrinação. No período carolíngio, as relíquias dos dois Santos foram levadas à Alemanha, na cidade de Seligenstadt, onde são guardados até hoje.


Os afrescos salvos pelas obras de restauração

A vinda dos recursos da Fundação ‘Heydar Aliyev’, foi possível graças aos acordos firmados em 2012, o que permitiu, com o uso de avançadas técnicas de conservação, a restauração de extraordinários monumentos pictóricos, como o Cubículo de Susana e o coveiro; o nicho de Daniele; o Arcosolium de Sabina; o Arcosolium de Orfeu; o Cubículo de Nossa Senhora com os dois Magos; o Cubículo da dama orante, que mostra uma mulher com a cabeça velada e os braços abertos. Uma joia pictórica que antecipa a iconografia medieval das Nossas Senhoras da Misericórdia.


Prevista restauração das Catacumbas de São Sebastião

A colaboração entre a Santa Sé e o Azerbaijão prosseguirá com outros importantes projetos. Hoje, em particular, foi selado um protocolo de intenção para obras de restauração e a valorização do complexo monumental de São Sebastião fora dos Muros, na Via Apia Antiga. O acordo diz respeito, entre outros, a uma extraordinária coleção de sarcófagos.

Ao ser questionada sobre o por quê de uma fundação de um país muçulmano financiar a restauração de patrimônios cristãos, a Sra. Mehriban Aliyeva explicou :

O Azerbaijão é um país entre a Europa e Ásia, entre o Ocidente e Oriente, e esta posição geográfica influenciou a profunda diversidade que caracteriza o país. A amizade e a fraternidade sempre acompanharam os povos que viveram no país. A nossa grande riqueza também é constituída pela presença de múltiplas confissões religiosas. Em particular, a restauração das Catacumbas dos Santos Marcelino e Pedro insere-se neste projeto de uma colaboração entre a Santa Sé e o Azerbaijão. No futuro, a nossa Fundação estará sempre pronta a prosseguir com esta cooperação’.


Cardeal Ravasi fala da ampla colaboração

A colaboração entre a Santa Sé e o Azerbaijão tem uma ampla abrangência, sublinha o Cardeal Gianfranco Ravasi, Presidente do Pontifício Conselho da Cultura e da Pontifícia Comissão de Arqueologia Sacra :

A colaboração tem o seu cerne principal nas Catacumbas dos Santos Marcelino e Pedro e agora na de São Sebastião. Mas o compromisso da Fundação ‘Aliyev’ e, em particular da sua presidente, ampliou-se também para a Biblioteca Apostólica Vaticana, com a restauração de muitos manuscritos azeris, e aos Museus Vaticanos, onde tiveram início  trabalhos de restauração, sobretudo de uma imponente estátua de Júpter. A segunda consideração diz respeito ao fato de que eu mesmo, certa vez, visitei o Azerbaijão e tive  a oportunidade de lá encontrar várias comunidades religiosas. Portanto, trata-se de uma rede de colaboração muito difundida.’’


Fonte :