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sexta-feira, 29 de março de 2024

Crucificado, morto e sepultado

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

Cristo na cruz (El Greco) 

*Artigo do Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer,

Arcebispo Metropolitano de São Paulo, SP


A celebração da Semana Santa e da Páscoa nos confronta com uma parte essencial da profissão de fé cristã, que diz respeito a Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador da humanidade. Refiro-me, em particular, ao ‘Credo’ mais curto, conhecido como símbolo apostólico. Essa fórmula da nossa fé, mais resumida, foi definida bem cedo na Igreja e reflete a pregação apostólica.

A parte que diz respeito a Deus Pai é breve : ‘Creio em Deus Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra’. Provavelmente, essa afirmação de fé era a mais tranquila e não oferecia muita dificuldade na pregação e na acolhida da fé. A parte referente a Jesus Cristo, em vez disso, representa mais da metade da fórmula da fé da comunidade cristã. Provavelmente, por causa das contradições e heresias que já surgiam por toda parte, era necessário explicitar bem mais o conteúdo da fé referente a Jesus Cristo.

‘Creio em seu único Filho, nosso Senhor, que foi concebido pelo poder do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria’. A pregação apostólica a respeito de Jesus, como Filho único, ou ‘unigênito de Deus’, representava um problema para muitos. Como entender que Deus tem um ‘Filho unigênito’? Não havia como explicar, senão pela palavra do próprio Jesus e dos apóstolos. São João, no prólogo do seu Evangelho, identifica Jesus como o ‘Verbo’, ou Palavra eterna de Deus, que ‘se fez carne’, em quem contemplamos ‘a glória do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade’ (Jo 1,14). E afirmando que ‘ninguém jamais viu a Deus’, destaca : ‘O Unigênito de Deus, que está no seio do Pai, foi quem o revelou’ (Jo 1,18).

A expressão identifica Jesus como Filho de Deus e também como verdadeiro homem. Na conversa com Nicodemos, Jesus afirma : ‘Deus amou tanto o mundo, que lhe deu o seu Filho Unigênito’ (Jo 3,16). Mais difíceis pareciam as partes seguintes da profissão da fé apostólica, quando se afirma que o Filho Unigênito, eterno Deus com o Pai, ‘nasceu da Virgem Maria e se fez homem’. Essa afirmação do nosso Credo refere-se ao mistério mais admirável da nossa fé cristã, que também ofereceu sempre dificuldades. A maior parte dos desvios da fé e das heresias diz respeito, justamente, a essa afirmação : Ele é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem (humano). Sempre houve quem afirmasse apenas uma parte : Jesus, somente como Filho de Deus, considerando a sua humanidade apenas como aparente; ou, então, Jesus apenas como homem, sendo a sua divindade apenas uma afirmação simbólica ou um mito. No entanto, a Igreja dos primeiros séculos do Cristianismo enfrentou essas dificuldades na sua pregação e em Concílios ecumênicos importantes. E manteve-se fiel à pregação de Jesus e dos apóstolos, mesmo quando a afirmação sobre Jesus, ‘verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem’, possa parecer uma contradição humanamente impossível.

A parte mais difícil do Credo apostólico refere-se à sua Paixão, Morte e Ressurreição : ‘Padeceu sob Pôncio Pilatos, morreu e foi sepultado’. Como foi que Pilatos entrou no Credo cristão? Ele foi um governante fraco que, mesmo sabendo ser Jesus inocente, o condenou à morte para ficar ‘de bem’ com a multidão, que pedia a morte de Jesus. Nossa fé não é em Pilatos, mas em Jesus, historicamente, socialmente e humanamente situado, ‘verdadeiro homem’, e não um mito criado pela fantasia dos discípulos. As afirmações seguintes, breves e lapidares, são igualmente densas de sentido e retratam respostas a vários problemas postos à pregação da fé cristã. ‘Foi crucificado, morto e sepultado’. O Filho de Deus morreu e, ainda mais, numa cruz? Foi até mesmo sepultado? Parecia demais para os religiosos do tempo e também para os pagãos e os filósofos. Mas era isso mesmo que os apóstolos pregavam. São Paulo, aos gregos de Corinto, escreve sem meias palavras : ‘Nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos’ (1Cor 1,21).

Havia quem espalhasse que Jesus não chegou a morrer na cruz, mas apenas perdeu os sentidos, que recuperou depois de ser posto no túmulo. Tratava-se de uma maneira de diminuir o ‘escândalo’ de um Filho de Deus crucificado e morto; e também para explicar a sua Ressurreição, como o ‘acordar de um desmaio’. Mas os apóstolos não cederam nem um pouco no seu testemunho sobre a morte de cruz daquele que reconheceram como verdadeiramente homem/ humano e Deus/divino. E, contra toda negação ou tentativa de racionalizar esse ‘mistério da fé’, a Igreja manteve-se fiel à pregação apostólica. Jesus Cristo, verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem.

Há quem pergunte : para onde foi o Filho de Deus, na sua divindade, após a sua morte, segundo a sua humanidade? ‘Desceu à mansão dos mortos’. A Igreja parte do pressuposto segundo o qual Ele veio ao mundo para oferecer a misericórdia e a salvação de Deus a todos; mesmo aos que já haviam morrido antes de sua vinda ao mundo e que estavam ‘na mansão dos mortos’. O Salvador, morto na cruz e sepultado como os demais humanos, foi levar a Boa Nova da misericórdia, do perdão e da vida de Deus aos que esperavam por Ele, desde Adão até o último dos falecidos.

Quanta coisa sublime e profunda faz parte do patrimônio da fé da Igreja, do qual fazemos parte! Para ler e aprofundar a catequese sobre o Credo, é só tomar em mãos o Catecismo da Igreja Católica, no capítulo III, que trata de nossa fé em Jesus Cristo. No Sábado Santo, durante a Vigília Pascal, nós faremos a renovação da nossa profissão de fé, junto com os que serão batizados e com toda a Igreja.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2024-03/crucificado-morto-sepultado.html

sábado, 23 de março de 2024

9 coisas que deve saber sobre o Domingo de Ramos

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo da Redação da ACIDIGITAL


O Domingo de Ramos marca o início da Semana Santa comemorando não um, mas dois acontecimentos muito significativos na vida de Cristo.

Aqui estão as 9 coisas que você precisa saber sobre essa data.

1. Este dia é chamado de ‘Domingo de Ramos’ ou ‘Domingo da Paixão’

O primeiro nome vem do fato de se comemorar a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, quando a multidão o recebeu com ramos de palmas (João 12, 13).

O segundo nome provém do relato da Paixão que é lido neste domingo, porque de outro modo não seria lido em um domingo, já que no próximo a leitura tratará da Ressurreição.

Segundo a carta circular do Vaticano sobre ‘A Preparação e Celebração das Festas Pascais’ de 1988, o Domingo de Ramos ‘une num todo o triunfo real de Cristo e o anúncio da paixão. Na celebração e na catequese deste dia sejam postos em evidência estes dois aspectos do mistério pascal’.

2. Ocorre uma procissão antes da Missa

A procissão pode ocorrer apenas uma vez, antes da Missa. Pode ser tanto no sábado, como no domingo.

‘Desde a antiguidade se comemora a entrada do Senhor em Jerusalém com a procissão solene, com a qual os cristãos celebram este evento, imitando as aclamações e os gestos das crianças hebreias, que foram ao encontro do Senhor com o canto do Hosana’, detalha a carta das celebrações da Páscoa.

3. Pode-se levar palmas ou outros tipos de plantas na procissão

Não é necessário usar folhas de palmeira na procissão, também podem utilizar outros tipos de plantas locais, como oliveiras, salgueiros, abetos ou outras árvores.

De acordo com o Diretório sobre a Piedade Popular e a Liturgia : ‘Os fiéis gostam de conservar em suas casas, e às vezes no local de trabalho, os ramos de oliveira ou de outras árvores, que foram abençoados e levados na procissão’.

4. Os fiéis devem ser instruídos sobre a celebração

De acordo com o Diretório sobre a Piedade Popular e a Liturgia, ‘os fiéis devem ser instruídos sobre o significado desta celebração para que possam compreender seu significado’.

‘Deve ser lembrado, oportunamente, que o importante é a participação na procissão e não só a obtenção das folhas de palmeira ou de oliveira’, que também não devem ser conservadas ‘como amuletos, nem por razões terapêuticas ou mágicas para afastar os maus espíritos ou para evitar os danos que causam nos campos ou nas casas’, indica o texto.

5. Jesus reivindica o direito dos reis na entrada triunfal em Jerusalém

O Papa Emérito Bento XVI explica em seu livro ‘Jesus de Nazaré : Da entrada em Jerusalém até a Ressurreição’ que Jesus Cristo reivindicou o direito régio, conhecido em toda a antiguidade, da requisição de meios de transporte particulares. 

O uso de um animal (o burro) sobre o qual ninguém havia montado é mais um indicador do direito régio. Jesus queria que seu caminho e suas ações fossem compreendidos com base nas promessas do Antigo Testamento que nele se tornaram realidade.

‘Ao mesmo tempo, esse atrelamento a Zacarias 9,9 exclui uma interpretação ‘zelota’ da sua realeza : Jesus não Se apoia na violência, não começa uma insurreição militar contra Roma. O seu poder é de caráter diferente; é na pobreza de Deus, na paz de Deus que Ele individualiza o único poder salvador’, detalha o livro.

6. Os peregrinos reconheceram Jesus como seu rei messiânico

Bento XVI também assinala que o fato de os peregrinos estenderem suas capas no chão para que Jesus caminhe também ‘pertence à tradição da realeza israelita (2 Reis 9, 13)’.

‘A ação realizada pelos discípulos é um gesto de entronização na tradição da realeza davídica e, consequentemente, na esperança messiânica’, diz o texto.

Os peregrinos, continua, ‘cortam ramos das árvores e gritam palavras do Salmo 118 – palavras de oração da liturgia dos peregrinos de Israel – que nos seus lábios se tornam uma proclamação messiânica : ‘Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o reino que vem do nosso pai Davi! Hosana no mais alto dos céus!’ (Mc 11, 9-10; cf. Salmos 118, 26)’.

7. ‘Hosana’ é um grito de alegria e uma oração profética

No tempo de Jesus essa palavra tinha significado messiânico. Na aclamação de Hosana se expressam as emoções dos peregrinos que acompanham Jesus e seus discípulos : o jubiloso louvor a Deus no momento da entrada processional, a esperança de que tivesse chegado a hora do Messias.

Ao mesmo tempo, era uma oração que indicava que o reino davídico e, portanto, o reino de Deus sobre Israel, seria restaurado.

8. A multidão que aplaudiu a chegada de Jesus não é a mesma que exigiu sua crucificação

Em seu livro, Bento XVI afirma que, os três Evangelhos sinóticos, assim como o de São João, mostram claramente que aqueles que aplaudiram Jesus na sua entrada em Jerusalém não eram seus habitantes, mas as multidões que acompanhavam Jesus e entraram na Cidade Santa com ele.

Este ponto é mais claro no relato de Mateus, na passagem depois do Hosana dirigido a Jesus : ‘E entrando em Jerusalém, a cidade inteira agitou-se e dizia : ‘Quem é este?’. A isso as multidões respondiam : ‘Este é o profeta Jesus, o de Nazaré de Galileia’’ (Mt 21, 10-11).

As pessoas tinham escutado falar do profeta de Nazaré, mas isso não parecia importar para Jerusalém, e as pessoas de lá não o conheciam.

9. O relato da Paixão desfruta de uma solenidade especial na liturgia

A Carta das Celebrações das Festas Pascais diz o seguinte no número 33

‘É aconselhável que seja cantada ou lida segundo o modo tradicional, isto é, por três pessoas que representam a parte de Cristo, do cronista e do povo. A Passio é cantada ou lida pelos diáconos ou sacerdotes ou, na falta deles, pelos leitores; neste caso, a parte de Cristo deve ser reservada ao sacerdote’.

A proclamação da paixão é feita sem os portadores de castiçais, sem incenso, sem a saudação ao povo e sem o toque no livro; só os diáconos pedem a bênção do sacerdote.

‘Para o bem espiritual dos fiéis, é oportuno que a história da Paixão seja lida integralmente sem omitir as leituras que a precedem’.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.acidigital.com/noticia/47652/9-coisas-que-deve-saber-sobre-o-domingo-de-ramos

segunda-feira, 15 de abril de 2019

Via da misericórdia

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG



Esse caminho está na contramão da perversidade e da indiferença. Envolvendo corações e mentes, esses males marcam os tempos atuais com os frutos da insanidade e da ignorância, insensíveis às muitas possibilidades para os avanços humanitários, sociais e políticos. A misericórdia é, assim, remédio indispensável, lição inigualável.

Quando um coração é forjado pela misericórdia, torna-se base para uma mente límpida, orientada para a fraternidade solidária, repleta de uma luz que inspira a inteligência e a sabedoria, qualidades indispensáveis em qualquer momento da história. Afinal, a desastrosa percepção dos mais diferentes processos é um tipo de cegueira que causa confusões, leva a decisões equivocadas, à falta de senso crítico sobre as próprias atitudes.

Percorrer a via da misericórdia é necessário treinamento para se conquistar a competente compreensão a respeito de si e do outro. Permite reconhecer a vida de cada pessoa como dom. É, pois, atitude fundamental para se administrar, com equilíbrio, a própria vida. Caminho que consolida a justiça, pois conduz ao compromisso com a verdade, o bem comum, a honestidade. Quem se aproxima do amor misericordioso de Deus, revelado em Jesus Cristo, desenvolve o gosto pela honestidade, não alimenta qualquer tipo de orgulho ou ilusória concepção sobre si.

Sem a via da misericórdia, tudo se enfraquece. A religiosidade deixa de contribuir para que a sociedade alcance nova etapa de seu desenvolvimento. As famílias, que deveriam ser ambiente para muitos aprendizados, ficam desfiguradas. Buscar a misericórdia não é, pois, um passeio sem propósito. É experiência renovadora, a partir do encontro com Jesus Cristo, o rosto misericordioso de Deus-Pai. Um acontecimento capaz de corrigir muitos descompassos, a exemplo do costume de se alegrar, perversamente, com o fracasso dos outros. As lições de Jesus Cristo salvam a humanidade também de males que afligem a alma, tornando-a suscetível a sofridas depressões.  Quem segue o Mestre, rosto da misericórdia divina, não desiste de viver, pois passa a reconhecer a própria existência como dom. Cultiva especial apreço à vida de todos, acima de qualquer interesse egoísta que possa levar a disputas insanas.

Nesse horizonte, compreende-se a oportunidade singular oferecida na Semana Santa: buscar a misericórdia seguindo os passos do Mestre, na sua paixão, morte e ressurreição, a partir das celebrações e da escuta da Palavra de Deus. A Semana Santa condensa lições essenciais que, se aprendidas por todos, permitem o surgimento de uma humanidade nova, solidária. Jesus é único e seus ensinamentos são a verdadeira sabedoria. Todos aproveitem a chance de fixar o olhar em Cristo, para percorrer com Ele a via da misericórdia. Assim, cada pessoa tem a oportunidade de unir-se a Deus, abrir o próprio coração para o amor, que transforma, produz sabedoria, permite discernimentos e escolhas acertadas.

Os atos de Jesus são permeados de compaixão, que não pode ser confundida com fraqueza. Trata-se de corajosa fidelidade à verdade e ao bem de todos.  Acolher suas palavras, silenciar ante seus sofrimentos e sua morte expiatória, refletindo sobre os preciosos ensinamentos reunidos na Bíblia, a exemplo dos que estão concentrados no Sermão da Montanha, é passo importante para percorrer a via da misericórdia junto com Cristo. A humanidade precisa, com urgência, trilhar esse caminho. Seja, pois, compromisso de todos, percorrer a via da misericórdia para aproximar-se de Deus e aprender com o seu amor.’


Fonte :

sexta-feira, 23 de março de 2018

O remédio da compaixão


Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

  ÃƒÂ‰ preciso um remédio que tenha força de ação no coração humano.
*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG


 ‘Causam perplexidade a crescente violência e a força destruidora das indiferenças. As perseguições e o gosto mórbido de se destruir reputações ou tratar, com espetacularização, a condição humana são graves ameaças. E diante deste turbulento cenário, ainda surgem figuras que se apresentam como a ‘força da moralização’, mas agem com truculência e se autopromovem a partir da disseminação de notícias falsas, criando confusões e semeando desarranjos. Há, assim, uma retroalimentação das hostilidades, disputas, revides e, de modo preocupante, do espírito doentio daqueles que querem ver ‘o circo pegar fogo’.

Constata-se que o coração das pessoas, projetado para ser da paz, se transforma em lugar que abriga sentimentos de vingança, de apreço ao banditismo. Distancia-se, assim, do sentido humanístico indispensável para alimentar a fraternidade e a solidariedade. O processo crescente de desumanização conduz a sociedade ao colapso. Os cenários são de guerra, o que é comprovado pelas estatísticas sobre homicídios provocados pela falta de compromisso com a sacralidade da vida do outro, que é irmão.

Na contramão da indispensável e urgente sensibilização humana, o que se verifica é um processo de petrificação dos corações, uma patologia. Afinal, quem cultiva o hábito de praticar maldades é doente. As práticas que, apesar de sedutoras, levam pessoas e instituições ao fracasso, são também indicações do grave sintoma da devastação das referências humanísticas. Há uma perda de limites : as consequências dos atos inadequados e imorais sequer são consideradas. Isso decorre da falta de compromisso com a honestidade. A probidade, que deveria ser norteadora de condutas, não tem seu valor reconhecido.

Uma sociedade vivida neste horizonte confuso não tem força para recuperar-se de crises. Carece de sabedoria para reencontrar caminhos e respostas. E as pessoas não conseguem perceber o sentido e o alcance da vida como dom. Pelo contrário, as condutas ficam emolduradas pelos estreitamentos humanísticos que levam a cidadania a ser palco de teatralizações.  Consequentemente, a vida cotidiana distancia-se da felicidade, possível quando todos se reconhecem como pertencentes a uma grande família – todos se percebendo como irmãos uns dos outros.

É preciso um remédio que tenha força de ação no coração humano. É lá que reside o problema. Chegue, pois, aos corações, o remédio da compaixão, capaz de fazê-lo sede da experiência do amor.  Os processos que tendem a brutalizar o coração humano precisam ser debelados. Isso inclui investimentos em segurança pública, legislações, infraestrutura e, principalmente, promover, no ambiente familiar, religioso, entre tantos outros, o remédio da compaixão. A compaixão permite o desenvolvimento de competências, de responsabilidades, a recuperação do sentido de irmandade, a alegria do pertencimento a um povo, o gosto de zelar por seu patrimônio e o comprometimento com aqueles que precisam de ajuda. A patologia do embrutecimento, por sua vez, leva à perda do sentido mais profundo da vida, causando sequelas e trazendo prejuízos preocupantes - mortes, suicídios, violências de todo tipo, indiferenças destruidoras. Por isso mesmo, precisa ser tratada com o remédio da compaixão.

A compaixão não é fraqueza, menos ainda conivência com os erros que requerem penas e correções. A aprendizagem e a prática da compaixão, legado próprio da espiritualidade cristã, é o remédio que trata o coração humano, fonte inesgotável para se lavar e se purificar. É preciso reconhecer-se como necessitado desse remédio. Vivenciar a Semana Santa, seguindo os passos de Jesus Cristo - a compaixão - é tomar esse remédio para curar-se de muitos males, caminho para se tornar agente construtor de uma vida nova, de um tempo novo e um exercício que permite educar o coração para reconhecer a importância do outro, principalmente de quem é pobre e indefeso.

Limpar o coração de mágoas que geram vinganças e ressentimentos. Cultivar o gosto pelo bem e pela verdade. Compreender a vida como dom. Abrir um ciclo novo para a própria vida, na vivência e celebração da Semana Maior, a Semana Santa. Eis o convite : o remédio da compaixão!


Fonte :




terça-feira, 11 de abril de 2017

A Festa da Páscoa

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo do Padre Jacques Goettmann,
teólogo e sacerdote cristão ortodoxo
(1921 – 2002)


‘A Grande Semana ou a Semana Santa, ressonância e réplica dos sete dias da Criação se aproxima. Se, durante estes sete dias concentrarmos nosso olhar sobre o Filho do Homem, sobre cada um dos seus gestos e palavras, de sua Paixão, e se ao mesmo temos descobrirmos em nós mesmos as atitudes contraditórias de Pedro que O negou, dos discípulos que tiveram medo, dos sacerdotes que O condenaram, dos soldados que O torturaram sem nada entender e também, de João que O seguia em silêncio, de Maria e das outras mulheres que Lhe davam sua amorosa presença, então vamos penetrar e permanecer em um espaço e em um tempo novos. Tempo e espaço do Mistério deslumbrante da Vida Nova que sai da morte amarga e velha : Mistério da transfiguração do homem e da criação.

«Destruís este Templo e em três dias eu o reconstruirei», dizia Jesus. São João comenta em seu Evangelho : «Ele falava do templo do seu Corpo... e, quando se levantou dentre os mortos, seus discípulos se recordaram de suas palavras» (Jo 2, 19-22). O templo do homem, nosso corpo, nossa alma, nosso espírito, nossa pessoa, tantas vezes «desumanizado», freqüentemente é transformado em casa de comércio ou em covas de ladrões; a arquitetura da Criação, a sinfonia do Universo, tão arruinada, tão desafinada, tão corrompida. É este o templo que Jesus Cristo está levantando conosco, seus discípulos, em três dias que são os dias mais longos e decisivos da história de nossa vida.


A Sexta Feira Santa

Cristo se enfrenta voluntariamente com a morte. Não morre por acidente ou enfermidade, por velhice ou desespero, mas por uma força maior, a força do amor. Manifestou-a algumas horas antes em sua última Ceia com palavras jamais ouvidas (Jo 13-17) e pelo dom de seu Corpo e Sangue. Não suprime nossa morte física, mas por sua vitória na Árvore da Cruz, nos dá poder sobre a morte : podemos agora encará-la de maneira nova e concebê-la como porta de um novo nascimento que já começou, abrindo-nos o caminho para uma nova vida. É o «dia das dores do parto».


O Sábado Santo

Cristo desce aos Infernos, à região dos mortos que esperam nas trevas, ao inferno de nossos terrores inconscientes, ao inferno de nosso mundo violento, angustiado e frustrado. Seu Corpo descansa silencioso no sepulcro e seu Espírito se abandona às mãos do Pai. Deste silêncio nos grita : «Venci o mundo, derrotei o Inferno e venho ressuscitar-vos comigo». É o dia da espera e da esperança.


A Noite Pascal

A Noite Pascal inaugura o Terceiro Dia, o Domingo da Páscoa. Entre todas as noites, é a noite mais misteriosa, deslumbrante e criadora : «Cristo ressuscitou! Em verdade ressuscitou!». Este grito se multiplica e repercute mil vezes entre os que se dão o beijo pascal. Tudo é perdoado, tudo é renovado, tudo é possível, pois nossa carne humana venceu a morte e recebeu já o gérmen da transfiguração na Luz Incriada. Se queremos seguir o caminho do Cristo e lhe dar nossa fé pessoal, não seremos enganados, mas transformados, e não morreremos jamais de uma morte sem saída. O Cristo volta a seu Pai e junto a Ele nos envia o Espírito Santo para nos comunicar as energias divinas, a Vida Nova.

Que esta Páscoa, estes dias de Morte e Ressurreição, esta Festa única entre todas as festas, seja para todos nós um tempo novo e novo espaço. «Este é o dia que o Senhor nos fez, dia de Alegria e de júbilo».’


Fonte :


segunda-feira, 10 de abril de 2017

Perdão e Semana Santa

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Artur da Távola,
advogado, jornalista, radialista, escritor, professor e político


Como é difícil perdoar!

Pouca gente, mesmo entre cristãos, compreende o sentido profundo do perdão. A maioria pensa que é forma de anistia do sentimento, ato interno capaz de compreender o ofensor e desculpá-lo no fundo do coração misericordioso. Este primeiro degrau do perdão já é difícil de ser galgado. E a propósito da Semana Santa, quero dizer o seguinte: O verdadeiro sentido da revolução cristã do perdão, porém, é outro, e bem mais radical: mais que ausência de ódio no coração do ofendido, o perdão é ação de amor na direção do ofensor. O cristianismo é tão revolucionário que exige do ser humano não apenas a grandeza de compreender e desculpar o ofensor, mas a capacidade de amá-lo. Perdoar é per+doar, isto é, ‘doar amor através (per) do ofensor’.


Perdoar é doar amor através do ofensor

Quem doa amor ao ofensor dá-lhe as condições profundas de contrição, compunção, compaixão e arrependimento, os quatro caminhos através dos quais o ser humano pode renascer de si mesmo e das trevas, trocando a morte pela vida. Por ser o gesto mais difícil e elevado, o perdão é a única forma de permitir ao ofensor a entrada de amor no seu coração. Qualquer forma de cobrança, punição e vingança aferra a crueldade do ofensor e, de certa forma, fá-lo sentir-se justificado.

A doação objetiva e concreta de amor poderá não ser eficaz, adiante, porém é a única forma através da qual o ofensor tem a chance de se arrepender sinceramente e reencontrar um caminho que lhe faz falta e é a única maneira de se redimir, crescer como pessoa, transformar-se.

Ser bom, fazer-se seguidor das religiões, sentir-se justo, fraterno, solidário, honesto, tudo isso - embora exija esforços - é relativamente fácil e em geral alimenta o ego. Difícil é perdoar o ofensor, não apenas desculpando-o, mas sendo capaz de o amar na integralidade do seu ser. Por isso, aliás, o cristianismo em essência encontra tanta dificuldade de se implantar entre os homens : exige a descoberta da grandeza humana, da virtude no sentido de exercício da única força capaz de mudar o mundo : o amor real. Não há revolução maior. Quem é capaz?’


Fonte :