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terça-feira, 9 de agosto de 2022

O Papa critica as “monstruosas deformações” da liturgia

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

*Artigo de Francisco Vêneto,

jornalista

 

‘O Papa Francisco criticou as ‘monstruosas deformações’ da liturgia ao longo das últimas décadas. Ele tocou no assunto durante o encontro que manteve com 15 jesuítas em Quebec, durante a sua recente viagem ao Canadá.

Segundo a revista Civiltà Cattolica, editada pelos próprios jesuítas na Itália, Francisco respondeu a várias perguntas dos seus companheiros de congregação religiosa. Uma delas dizia respeito à importância da liturgia.

O Papa respondeu :

Quando há conflito, a liturgia é sempre maltratada. Na América Latina, há trinta anos, ocorreram monstruosas deformações litúrgicas. Depois caíram no extremo oposto, com a embriaguez retrogradista do antigo. Foi criada uma divisão na Igreja’.

Francisco tem criticado tanto a dessacralização da liturgia quanto o que considera uma tentativa igualmente danosa de priorizar as formas sobre o significado. Durante o voo de retorno do Canadá, por exemplo, ele afirmou que o ‘atraso’ é diferente da ‘tradição’ – e até mesmo contrário a ela.

Ainda durante o encontro com os jesuítas, conforme relatado pela Civiltà Cattolica, Francisco falou das suas medidas a respeito :

Minha ação neste campo tentou seguir a linha adotada por João Paulo II e Bento XVI, que haviam permitido o rito antigo e haviam solicitado uma verificação posterior. A verificação mais recente deixou claro que havia uma necessidade de disciplinar a questão e evitar que ela fosse um fato de moda, mas que permanecesse uma questão pastoral’.

No tocante à mencionada verificação, o Papa se refere ao motu proprio Traditionis custodes, que publicou em julho de 2021 e por cujo meio limitou a celebração da missa tradicional em latim. Neste último 29 de junho, ele publicou também a carta apostólica Desiderio desideravi, que trata da formação litúrgica do povo de Deus.

Em sua conversa com os jesuítas em Quebec, o Papa finalizou a respeito das deformações da liturgia :

Virão estudos que aperfeiçoarão a reflexão sobre uma questão tão importante. A liturgia é o louvor público do povo de Deus’.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://pt.aleteia.org/2022/08/08/o-papa-critica-as-monstruosas-deformacoes-da-liturgia/

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Antigas igrejas de madeira unem Eslováquia e Ucrânia

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)



‘São mais de 40 os locais de culto construídos totalmente com madeira entre os séculos XVIII e XIX na Eslováquia. Um projeto além-fronteiras visa a restauração e a valorização das obras.

Importância histórica e arquitetônica, mas ‘não devemos esquecer a verdadeira razão por qual foram construídos : louvar a Deus e iluminar a fé viva da população local’, explicam os promotores do projeto.

A maior parte das igrejas é de rito oriental, conservadas com amor e respeito nas várias regiões da Eslováquia. O projeto de cada construção é único e original. O que elas têm em comum e as tornam preciosas é a forma como foram construídas : todo o material utilizado para a construção é de madeira, incluídos os pregos.

Oito destas igrejas, situadas aos pés do lado eslovaco dos Montes Cárpatos, foram inscritas na lista do Patrimônio Mundial da Unesco. Outras quatro - construídas em pequenos vilarejos de Tročany, Fricka, Prikra e Vysny Komarnik - foram recentemente reconstruídas no âmbito da colaboração além-fronteiras entre a Eslováquia e a Ucrânia. O projeto ‘Tutela e preservação do patrimônio comum’ envolve 11 organizações no processo de restauração.


Obras do homem e obras de Deus

Podemos olhar estas igrejas de um ponto de vista histórico ou arquitetônico e admirá-las, mas não devemos esquecer a verdadeira razão pela qual foram construídas : louvar a Deus e iluminar a fé viva da população local. Muitas igrejas de madeira são usadas ainda hoje como local de culto’ explicam os promotores do projeto da Arquidiocese Greco-católica de Presov.

Uma das igrejas recentemente restauradas, a de São Lucas, em Tročany, foi construída em 1739. O Arcebispo greco-católico de Presov, Jan Babjak, a consagrou pessoalmente depois da recente restauração, focalizando a sua homilia na fé em Deus e na sua generosidade, ‘que demonstra também sob a forma de uma bênção pelas pessoas que criam as grandes obras arquitetônicas, assim como por aqueles que se reúnem no seu interior para rezar’.


Miséria humana, confiança em Deus

Todas as igrejas de madeira têm o seu interior subdividido em três seções fundamentais : pórtico, nave e santuário.

Um típico elemento fundamental da construção é a iconostasis, que por um lado divide a nave e o santuário e por outro, une simbolicamente dois mundos : a terra e o céu.

Na realidade trata-se de uma ‘parede’ construída por diversas filas de ícones, visualizadas segundo o exato cânone litúrgico’, explica o museólogo Mikulas Jacecko.

Segundo o site oficial da ONG Petra, instituída pela Igreja Greco-católica em Presov (www.drevenechramy.sk), as igrejas de madeira ‘refletem perfeitamente a fragilidade e a miséria do homem, mas por outro lado refletem também a confiança inabalável e inquebrantável em Deus, que é muitas vezes a nossa única e última esperança na vida’.


‘Uma bela herança de nossos pais’

Como explicam os historiadores, as pessoas que viviam próximo da fronteira eslovaca-ucraniana, há duzentos ou trezentos anos eram muito pobres. Mesmo assim, desejavam louvar o Senhor quanto mais pudessem. A madeira era o único material disponível de baixo custo para a construção, e a população local não poderia ter imaginado na época, que aquilo que parecia ser ‘defeito’, se transformaria em uma característica única e preciosa de nosso tempo.

Estes ‘momentos históricos e culturais merecem a nossa proteção e o nosso cuidado, para que possamos entregá-los como um dom e uma bela herança dos nossos pais às próximas gerações’, considera Mikulas Jacecko.

Contemporaneamente à restauração das igrejas em madeira original, outro projeto está em andamento há diversos anos : a criação de um museu a céu aberto das miniaturas em escala 1:10 de todas as igrejas em madeira construídas na Eslováquia. Está situado em Lutina e o progresso dos trabalhos pode ser acompanhado no site www.miniskanzen.sk.’


Fonte :

terça-feira, 17 de maio de 2016

Virgem de Madhu, conselheira da paz

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Fernando Félix, 
Jornalista


Todos os anos, centenas de milhares de cingaleses vão em peregrinação ao santuário mariano de Madhu, o templo católico mais importante do Sri Lanka. Ali vão católicos, hindus e muçulmanos, porque é símbolo da paz nacional e pessoal reconquistadas.


‘Quando, em 2015, o Papa Francisco peregrinou ao santuário mariano de Madhu, no Sri Lanka, sublinhou que Nossa Senhora do Bom Conselho ali venerada guia o país para a reconciliação total. Durante a celebração rezou-se uma oração em várias línguas pedindo a consolidação da paz, por intercessão da Mãe que ali e desde ali tem sido companheira das famílias perseguidas por questões religiosas e afligidas pela guerra civil.


Nossa Senhora companheira na perseguição

O Santuário de Nossa Senhora de Madhu está situado na cidade de Madhu, que fica a 250 quilômetros ao norte da capital, Colombo. A região é habitada sobretudo pelo povo tâmil. O santuário faz parte da diocese de Mannar, formada por 34 paróquias servidas por 55 sacerdotes.

As origens do Santuário de Nossa Senhora de Madhu remontam a 1544. Nesse ano, o rei Jaffna mandou massacrar 600 cristãos de Mannar. Eram o fruto da ação evangelizadora dos portugueses chegados, em 1505, à ilha de Ceilão (assim se chamava, na época, o Sri Lanka). O monarca temia a expansão da influência portuguesa. Os fiéis que conseguiram escapar à chacina erigiram no mato nas proximidades de Madhu um pequeno lugar de oração. Ali erigiram a estátua de Nossa Senhora do Bom Conselho.

Em 1583, os cristãos sofreram nova perseguição. Os que se puderam proteger da fúria construíram uma igreja em Mantai, na península de Jaffna, que foi casa da estátua de Nossa Senhora de Madhu até meados do século XVII.

Em 1656, os holandeses calvinistas que desembarcaram em Ceilão aliados ao monarca, empreenderam uma violenta perseguição aos católicos. Durante catorze anos, trinta famílias católicas foram de aldeia em aldeia à procura de refúgio, levando consigo a estátua de Nossa Senhora e, em 1670, estabeleceram-na, definitivamente, em Maruthamadhu, no lugar onde se ergue atualmente o santuário. Outros católicos juntaram-se às vinte famílias. Entre eles havia uma mulher portuguesa, chamada Helena, que providenciou a construção da primeira igreja dedicada a Nossa Senhora de Madhu no interior da selva. A partir de então, difundiu-se por toda a ilha a fama de Nossa Senhora de Madhu, como curadora e protetora, em particular das mordeduras de serpentes.

A chegada ao Ceilão, em 1687, de S. José Vaz, sacerdote nascido em Goa, então território português, fez com que o catolicismo reflorescesse. E Madhu tornou-se, em 1706, um centro missionário.

Em 1872 – mais de trezentos anos depois da chacina dos primeiros cristãos de Madhu – foi colocada a primeira pedra da atual igreja do santuário. O local tornou-se lugar de oração respeitado e frequentado por fiéis católicos e também de outras religiões do Sri Lanka, prestando respeitosos tributos à Mãe Maria. O Vaticano reconheceu o seu valor e, em 1924, a estátua da Virgem de Madhu foi coroada pelo legado pontifício em nome do Papa Pio XI e, em 1944, a igreja foi consagrada.


Nossa Senhora refúgio na guerra

Durante a guerra civil do Sri Lanka – de 1983 a 2009 –, a zona do santuário não foi poupada aos combates entre os rebeldes tâmiles e as forças governamentais. Mas os bispos do país conseguiram fazer de Madhu uma zona desmilitarizada, garantindo a segurança dos peregrinos e dos numerosos refugiados que acorreram a essa área, fugindo da guerra. Com efeito, a partir de 1990, os 160 hectares dos terrenos do santuário acolheram milhares de deslocados, convertendo-se em campo de refugiados, reconhecido como tal pelas partes em conflito. No entanto, isso não impediu os massacres ocorridos ali, como o de Novembro de 1999.

Ao longo de 2001, a imagem de Nossa Senhora de Madhu foi levada em peregrinação a todos os cantos do país. Foi uma peregrinação penitencial. Três anos depois, começaram as negociações de paz que se concluíram em 2009, com a paz definitiva. Por isso, os Cingaleses vêem em Nossa Senhora de Madhu um símbolo de paz.


As peregrinações

A festa oficial de Nossa Senhora de Madhu é a 2 de Julho. Todavia, a celebração que atrai mais multidões é a Festa da Assunção a 15 de Agosto. Nesta data, a imagem é levada em procissão. E nesta prática evoca-se uma crença nascida durante a guerra civil. Dizia o povo que se a coroa de Nossa Senhora de Madhu caísse durante a procissão, isso significaria que a luta iria continuar.

Há uma série de outras lendas associadas ao santuário de Madhu, sobretudo relacionadas com as serpentes. Diz-se que, quando S. José Vaz chegou a Madhu, as cobras fugiram da área, retornando somente quando Nossa Senhora foi levada para longe, por razões de segurança, durante a guerra civil. E que, quando Nossa Senhora de Madhu regressou, as cobras foram expulsas mais uma vez.

Na entrada da igreja, num grande letreiro está escrito «ave-maria» em português, cingalês e tâmil. No espaço circundante da igreja existe uma via-sacra.

No interior da igreja, os peregrinos, de pé ou de joelhos, aproximam-se de Nossa Senhora, apresentam-lhe as suas intenções e oferecem-lhe flores – uma prática também característica do culto em templos budistas e hindus.

No piso abre-se um poço no local onde S. José Vaz celebrou missa. São-lhe atribuídas propriedades curativas, e as suas águas são usadas, principalmente, como antídoto para as mordeduras de serpentes. Outras tradições relacionadas com o terreno do santuário de Madhu são misturar porções do solo com o cimento das fundações das casas católicas, ou dissolver terra na água que os peregrinos tomam.

Ao longo do ano, os peregrinos vão, habitualmente, por vários dias, e ficam hospedados em albergues especialmente reservados para eles. Nas peregrinações, o álcool é proibido, assim como as danças e qualquer tipo de convívio popular. Os peregrinos costumam adquirir medalhas, escapulários e imagens de Nossa Senhora de Madhu, que um padre abençoa.’


Fonte :
* Artigo na íntegra

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Santos Anjos da Guarda

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)



  
A Liturgia das Horas e a reflexão no dia dos Santos Anjos da Guarda :

Ofício das Leituras

Segunda leitura
Dos Sermões de São Bernardo, abade
(Sermo 12 in psalmum Qui habitat, 3.6-8: Opera omnia,
Edit.Cisterc. 4[1966]458-462)    (Séc.XII)

Eles te guardem em todos os teus caminhos
A teu respeito ordenou a seus anjos que te guardem em todos os teus caminhos (Sl 90,11). Louvem o Senhor por sua misericórdia e suas maravilhas para com os filhos dos homens. Louvem e proclamem às nações que o Senhor agiu de modo magnífico a favor deles. Senhor, que é o homem para que assim o conheças? Ou por que inclinas para ele teu coração? Aproximas dele teu coração, enches-te de solicitude por sua causa, cuidas dele. Enfim, a ele envias o teu Unigênito, infundes o teu Espírito, prometes até a visão de tua face. E para que nas alturas nada falte no serviço a nosso favor, envias os teus santos espíritos a servir-nos, confias-lhes nossa guarda, ordenas que se tornem nossos pedagogos.

A teu respeito, ordenou a seus anjos que te guardem em todos os teus caminhos. Esta palavra quanta reverência deve despertar em ti, aumentar a gratidão, dar confiança. Reverência pela presença, gratidão pela benevolência, confiança pela proteção. Estão aqui, portanto, e estão junto de ti, não apenas contigo, mas em teu favor. Estão aqui para proteger, para te serem úteis. Na verdade, embora enviados por Deus, não nos é lícito ser ingratos para com eles, que com tanto amor lhe obedecem e em tamanhas necessidades nos auxiliam.

Sejamos-lhes fiéis, sejamos gratos a tão grandes protetores; paguemos-lhes com amor; honremo-los tanto quanto pudermos, quanto devemos. Prestemos, no entanto, todo o nosso amor e nossa honra àquele que é tudo para nós e para eles; de quem recebemos poder amar e honrar, de quem merecemos ser amados e honrados.

Assim, irmãos, nele amemos com ternura seus anjos como futuros co-herdeiros nossos, e enquanto esperamos nossos intendentes e tutores dados pelo Pai como nossos guias. Porque agora somos filhos de Deus, embora não se veja, pois ainda estamos sob tutela quais meninos que em nada diferem dos servos.

Aliás, mesmo assim tão pequeninos e restando-nos ainda uma tão longa, e não só tão longa, mas ainda tão perigosa caminhada, que temos a temer com tão poderosos protetores? Eles não podem ser vencidos, nem seduzidos, e ainda menos seduzir, aqueles que nos guardam em todos os nossos caminhos. São fiéis, são prudentes, são fortes; por que trememos de medo? Basta que os sigamos, unamo-nos a eles e habitaremos sob a proteção do Deus do céu.


Fonte :
‘In Liturgia das Horas IV’, 1335, 1336
  

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Santo Agostinho de Hipona (Capítulo 4 de 5)

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB) 


4. Obras
 
            Santo Agostinho é o Padre da Igreja que deixou o maior número de obras, e hoje pretendo falar delas brevemente. Alguns dos escritos agostinianos são de importância fundamental, e não só para a história do Cristianismo, mas para a formação de toda a cultura ocidental : o exemplo mais claro são as Confessiones, sem dúvida um dos livros da antiguidade cristã ainda hoje muito lido. Como diversos padres da Igreja dos primeiros séculos, mas em medida incomparavelmente mais ampla, também o bispo de Hipona exerceu de fato uma influencia alargada e persistente, como é demonstrado pela superabundante tradição manuscrita das suas obras, que deveras são numerosíssimas.
 
            Ele mesmo as passou em revista alguns antes de morrer nas Retractationes e pouco depois da sua morte elas foram cuidadosamente registradas no Indiculus (‘elenco’), acrescentado pelo amigo fiel Possídio à biografia de Santo Agostinho, Vita Augustini. O elenco das obras de Agostinho foi realizado com a intenção explícita de salvaguardar a sua memória enquanto a invasão vândala se expandia em toda a África romana, e conta mil e trinta escritos enumerados pelo seu autor, com outros ‘que não podem ser numerados, porque não os enumerou’. Bispo de uma cidade próxima, Possídio ditava estas palavras precisamente a Hipona, onde se tinha refugiado e assistira à morte do amigo e quase certamente se baseava no catálogo da biblioteca pessoal de Agostinho. Hoje, são mais de trezentas as cartas de bispo de Hipona que sobreviveram e quase seiscentas as homilias, mas elas eram muitas mais, talvez até entre as três mil e as quatro mil, fruto de quarenta anos de pregações do antigo reitor que tinha decidido seguir Jesus e falar já não aos grandes da corte imperial, mas à simples população de Hipona.
 
            Ainda em anos recentes, as descobertas de um grupo de cartas e de algumas homilias enriqueceram o nosso conhecimento deste grande Padre da Igreja. ‘Muitos livros’, escreve Possídio, ‘foram por ele compostos e publicados, muitas pregações foram feitas na igreja, transcritas e corrigidas, quer para contestar os diversos hereges quer para interpretar as sagradas Escrituras dos santos filhos da Igreja. Estas obras, ressalta o bispo amigo, são tantas que dificilmente um estudioso tem a possibilidade de as ler e aprender a conhece-las.’ (Vita Augustini, 18,9)
 
            Entre a produção literária de Agostinho, portanto, mais de mil publicações subdivididas em escritos filosóficos, apologéticos, doutrinais, morais, monásticos, exegéticos, anti-hereges, além, precisamente, das obras excecionais de grande alcance teológico e filosófico. Antes de tudo, é preciso recordar as já mencionadas Confessiones, escritas em treze livros entre 397 e 400 para louvor de Deus. Elas são uma espécie de autobiografia na forma de um diálogo com Deus. Este gênero literário reflete precisamente a vida de Santo Agostinho, que era uma vida não fechada em si, dispersa em tantas coisas, mas vivida substancialmente como diálogo com Deus, e assim uma vida com os outros. Já o título Confessiones indica a especificidade desta autobiografia. Esta palavra confessiones no latim cristão, desenvolvido pela tradição dos Salmos, tem dois significados que contudo se entrelaçam. Confessiones indica, em primeiro lugar, a confissão das próprias debilidades, da miséria dos pecados; mas, ao mesmo tempo, confessiones significa louvor a Deus, reconhecimento a Deus. Ver a própria miséria na luz de Deus torna-se louvor a Deus e agradecimento porque Deus nos ama e nos aceita, nos transforma e nos eleva para Si mesmo. Sobre estas Confessiones, que tiveram grande êxito já durante a vida de Santo Agostinho, ele mesmo escreveu : ‘Elas exerceram sobre mim tal ação enquanto as escrevia e ainda exercem quando as releio. Estas obras são do agrado de muitos irmãos’ (Retractaciones, II, 6) : e devo dizer que também eu sou um destes ‘irmãos’. E graças às Confessiones, podemos seguir passo a passo o caminho interior deste homem extraordinário e apaixonado por Deus. Menos conhecidas mas igualmente originais e muito importantes são, outrossim, as Retractationes, compostas em dois livros por volta do ano 427, nas quais Santo Agostinho já idoso realiza uma obra de ‘revisão’ (retractatio) de toda a sua obra escrita, deixando assim um documento literário singular e extremamente precioso, mas também um ensinamento de sinceridade e de humildade intelectual.           
 
            O De civitate Dei, obra imponente e decisiva para o desenvolvimento do pensamento político ocidental e para a teologia cristã da história, foi escrito de 413 a 426, em vinte e dois livros. A ocasião era o saque de Roma, levado a cabo pelos Godos em 410. Numerosos pagãos ainda vivos, mas também muitos cristãos, disseram : Roma caiu e agora o Deus cristão e os Apóstolos já não podem proteger a cidade. Durante a presença das divindades pagãs, Roma era caput mundi, a grande capital, e ninguém podia pensar que teria caído nas mãos dos inimigos. Agora, com o Deus cristão, esta grande cidade já não parecia segura. Portanto, o Deus dos cristãos já não protegia, não podia ser o Deus ao qual confiar-se. Nesta objeção, que tocava profundamente também o coração dos cristãos, Santo Agostinho responde com esta obra grandiosa, o De civitate Dei, esclarecendo o que devemos ou não esperar de Deus, qual é a relação entre o campo político e o campo da fé da Igreja. Também nos dias de hoje este livro é uma fonte para definir bem a verdadeira laicidade e a competência da Igreja, a grande e verdadeira esperança que a fé nos proporciona.
 
            Este livro excelso é uma apresentação da história da humanidade governada pela Providencia Divina, mas atualmente dividida por dois amores. E este é o desígnio fundamental, a sua interpretação da história, que é a luta entre dois amores. E este é o desígnio fundamental, a sua interpretação da história, que é a luta entre dois amores : o amor a si mesmo, ‘até à indiferença por Deus’, e o amor a Deus, ‘até à indiferença por sim mesmo’ (De civitate Dei, XIV, 28), à plena liberdade de si próprio pelos outros, na luz de Deus. Portanto, este talvez seja o maior livro de Santo Agostinho, de uma importância permanente. Igualmente importante é o De Trinitate, obra em quinze li vros no núcleo principal da fé cristã, a fé no Deus trinitário, escrita em dois tempos : entre 399 e 412, os primeiros doze livros, publicados sem o conhecimento de Agostinho, que por volta de 420 os completou e reviu a obra inteira. Aqui, ele reflete sobre o rosto de Deus e procura compreender este mistério do Deus que é singular, o único criador do mundo, de todos nós e, todavia, que precisamente este Deus único é trinitário, um círculo de amor. Procura compreender o mistério insondável : exatamente o ser trinitário, em três Pessoas, é a mais real e mais profunda unidade do único Deus. O De doctrina Christiana é, no entanto, uma verdadeira e própria análise, ao próprio Cristianismo, que teve uma importância determinante na formação da cultura ocidental.
           
            Apesar de toda a sua humildade, Agostinho certamente estava consciente da sua estatura intelectual. Mas para ele, mais importante do que realizar grandes obras de elevado significado teológico, era transmitir a mensagem aos simples. Esta sua intenção mais profunda, que orientou toda a sua vida, manifesta-se numa carta escrita ao colega Evódio, na qual comunica a decisão de suspender momentaneamente o ditado dos livros do De Trinitate, ‘porque são demasiado cansativos e na minha opinião podem ser entendidos por poucos; por isso, são mais urgentes os textos que, esperamos, venham a ser mais úteis para muitos’ (Epistulae, 169,1,1). Portanto, para ele era mais útil comunicar a fé de modo compreensível para todos do que escrever grandes obras teológicas. A responsabilidade profundamente sentida em relação à divulgação da mensagem cristã é sentida também na origem de escritos como De catechizandis rudibus, uma teoria e também uma prática da catequese, ou o Psalmus contra partem Donati. Os donatistas eram o grande problema da África de Santo Agostinho, um cisma intencionalmente africano. Eles afirmavam : a verdadeira cristandade é africana. Opunham-se à unidade da Igreja. Contra este cisma, o grande bispo lutou durante toda a sua vida, procurando convencer os donatistas que somente na unidade também a africanidade pode ser verdadeira. E para se fazer compreender pelos mais simples, que não conseguiam entender o latim erudito do reitor, disse : devo escrever também com erros gramaticais, num latim muito simplificado. E fê-lo sobretudo neste Psalmus, uma espécie de poesia simples contra os donatistas, para ajudar todas as pessoas a compreenderem que unicamente na unidade da Igreja se realiza para todos realmente a nossa relação com Deus e aumenta a paz no mundo.
 
            Nesta produção destinada a um publico mais vasto reveste uma importância particular o número de homilias, muitas vezes pronunciadas ‘de modo improvisado’, transcrita pelas taquígrafos durante a pregação e imediatamente postas em circulação. Entre elas, sobressaem as lindas Enarrationes in Psalmos, muito lidas na Idade Média. Precisamente a prática de publicação dos milhares de homilias de Agostinho, muitas vezes sem o controle do autor, era sua difusão e sucessiva dispersão, mas também a sua vitalidade. Com efeito, imediatamente as pregações do bispo de Hipona tornavam-se, pela fama do seu autor, textos muito procurados e serviam também para outros bispos e sacerdotes como modelos, adequados a contextos sempre novos.
 
            A tradição iconográfica, já num afresco lateranense que remonta ao século VI, representa Santo Agostinho com um livro na mão, sem dúvida para expressar a sua produção literária que influenciou em grande medida a mentalidade e o pensamentos cristãos, mas para exprimir também o seu amor pelos livros, pela leitura e pelo conhecimento da grande cultura precedente. Quando faleceu nada deixou, narra Possídio, mas ‘recomendava sempre que se conservasse diligentemente para a posteridade a biblioteca da igreja com todos os códices’, sobretudo o das suas obras. Nelas, sublinha Possídio, Agostinho está ‘sempre vivo’e beneficia quem lê os seus escritos não obstante, conclui ele, ‘na minha opinião puderam tirar mais proveito do seu contato aqueles que o conseguiram ver e ouvir, quando falava pessoalmente nas igrejas, e sobretudo aqueles que tiveram experiência da sua vida quotidiana no meio do povo’ (Vita Augustini, 31). Sim, também para nós teria sido muito bom poder ouvi-lo pessoalmente. Todavia, ele está deveras vivo nos seus escritos, está presente em nós e assim sentimos também a vitalidade permanente da fé, à qual ele entregou toda a sua vida.
 
(20 de fevereiro de 2008)