Mostrando postagens com marcador Bento XV. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Bento XV. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

'Maximum illud': a Igreja não é estrangeira para nenhum povo


 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 Resultado de imagem para igreja católica + estrangeiro
*Artigo da Radio Vaticano


‘A história conhece Bento XV (papa de 1914 a 1922) como o papa que chamou a guerra de ‘massacre inútil’. Célebre expressão com a qual definiu dolorosamente o absurdo da Primeira Guerra Mundial, depois de muitos apelos à paz e esforços para mediação. Mas Bento XV pode também, como todo direito, ser recordado como o ‘Papa das Missões’, pois graças às suas inúmeras iniciativas que o anúncio do Evangelho retomou um impulso já durante a guerra e principalmente depois do desastre bélico. A ação de Bento XV levou as Igrejas locais, divididas e agravadas pelos sentimentos nacionalistas fomentados pelo conflito, a recuperarem em uma visão universal, e com novo dinamismo, o mandato de Jesus aos discípulos : ‘Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda a criatura’.

Grande visão

A Carta Maximum illud, assinada em 30 de novembro de 1919, é o instrumento com o qual o papa se serve para abrir novos horizontes. Na realidade, o terreno sobre o qual amadurecem as páginas do documento, revelam a capacidade de ver e providenciar à Orbe sem sair da Urbe. As provas são a instituição do Dia Mundial do Migrante e Refugiado (1915) e a criação da Congregação para as Igrejas Orientais (1917).

Missões além das fronteiras

Alguns estudos ligam a criação da Carta Apostólica a situação do início do século 20 quando aumentavam os riscos, na Europa e na Ásia, de expulsão dos missionários que estavam em campo. Mais uma vez o motivo é o nacionalismo que se espalha, por isso, por exemplo, os missionários alemães tornam-se pessoas indesejáveis na Inglaterra. Ou são os sentimentos anti-colonialistas que, principalmente no Oriente, acreditam que a ação missionária sirva os interesses das potências ocidentais e portanto é uma presença a ser erradicada. Propaganda Fide conserva numerosas correspondências da época que contam o quanto era grande a preocupação neste sentido. Preocupação que Bento XV conhece muito bem.

Recordai-vos que não deveis difundir o reino dos homens, mas o de Cristo; não vos compete aumentar o numero de cidadãos para a pátria terrena, mas para a pátria celeste’.

Carta profética

Em 2017 o papa Francisco destacou que a Carta que nasceu deste e outros pensamentos tem um ‘espírito profético e franqueza evangélica’ bem mais amplas do que as contingências nas quais foi concebida. No início do texto Bento XV cita o nome de alguns grandes apóstolos que levaram o Evangelho nos continentes e não esconde uma certa surpresa em constatar que ‘apesar dos exemplos de fortaleza’, o número dos batizados não somariam ‘um bilhão’. Por isso, decide articular o documento em três partes. Na primeira dirige-se aos que têm a responsabilidade principal do anúncio : os bispos, os vigários apostólicos, os superiores religiosos. O papa estimula-os ao ‘zelo exemplar’ para que todos seus colaboradores percebam uma proximidade cheia de ‘bondade e caridade’. Ao contrário, desonra o comportamento dos que considerassem a missão que lhe fora confiada ‘como propriedade exclusiva, com inveja que outros a toquem’.

Casa de todos os povos

Na segunda parte, Bento XV recorda, com particular sagacidade, que o missionário deve ter no coração principalmente o ‘bem espiritual’ das pessoas às quais anuncia Cristo, porque, sustenta, as populações que não conhecem o Evangelho identificam perfeitamente a presença de interesses que não sejam apostólicos. Por fim, na terceira parte, o papa da Igreja pede aos simples fiéis o apoio da oração, a única verdadeira coluna de toda a experiência de missão. Mas toda a Carta poderia  ser sintetizada em uma frase, válida para todas as épocas, como revelou o papa Francisco :

‘A Igreja de Deus é universal, e portanto não é estrangeira para nenhum povo’.’


Fonte :

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Papa da paz x Cruzada contemporânea


Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Mirticeli Dias de Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja



O italiano Giacomo Paolo Giovanni - Bento XV - condenou a primeira guerra mundial classificando-a como ‘un inutile strage’ - massacre inútil - em sua encíclica Ad Beatissimi Apostolorum, de 1914. Os vários apelos que esse pontífice fez pela paz, em um momento em que a mentalidade militarista também penetrava nos ambientes católicos, soou como uma afronta para muitos que viam na guerra algo necessário. Em muitos momentos, ele foi uma voz no deserto, sendo rejeitado por várias figuras da alta diplomacia vaticana e por parte dos bispos que se deixaram seduzir pela propaganda nacionalista, como no caso da Áustria. Enquanto a encíclica, por determinação do papa, chegava a todas as conferências episcopais com um apelo para o fim dos combates, os bispos austríacos convidavam os fiéis a rezar e a torcer pela ‘vitória da pátria’.

De acordo com o professor Andreas Gottsmann, presidente do Instituto Histórico Austríaco de Roma, as organizações juvenis católicas na Áustria (Schützenkorps, Jugendwehr) introduziram, logo depois do início da guerra, uma educação pré-militar para os rapazes de fé católica, além de sustentarem e favorecerem a educação militar nos países e nas paróquias através de organizações paramilitares. Por isso, segundo ele, a primeira guerra mundial pode ser considerada ‘o pecado original do século XX’ porque levou a uma quase completa militarização da sociedade. A conferência episcopal austríaca, por sua vez, defendia esta nova política de militarização e as ‘boas intenções’ que levavam essas associações católicas a dar uma contribuição pela defesa da pátria.

Os bispos viam que o conflito servia para resgatar a importância dos mandamentos divinos que, à altura, não eram mais respeitados. No caso, em muitos dos escritos da conferência episcopal, a guerra é tratada como uma purificadora, quase como uma catástrofe natural, necessária e positiva, uma vez que consentia um novo início. Os bispos interpretavam os sucessos militares dos poderes centrais como um sinal divino e a justificativa para a guerra’, ressaltou Gottsmann.

No presente, Papa Francisco é um dos que intuiu - reportando-se aos erros dos religiosos que se deixam seduzir por essa mentalidade no século passado -, sobre os riscos não só da política em prol do armamento de civis, mas da ideologia que se constrói em torno dela. Como Bento XV e João XXIII, que lutaram incessantemente pelo fim dos conflitos em períodos distintos, o papa argentino tem a coragem de lutar contra uma corrente de pensamento que esvazia a verdadeira proposta do cristianismo e transforma o discurso religioso em baluarte de cruzadas contemporâneas.’


Fonte :