Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
‘A Lectio
Divina é, junto à liturgia (missa e oração das horas) e ao estudo, um dos meios
para provar e se nutrir da Palavra de Deus. ‘O Evangelho é o Corpo de Cristo’,
escreve o grande doutor da Bíblia, São Jerônimo (345-420).
Nós comemos a carne e bebemos o sangue de Cristo no
mistério da Eucaristia, mas também na leitura das Escrituras.
Por
sua vez, São João Paulo II dizia que ‘o primado da santidade e da oração é
concebível apenas a partir de uma renovada escuta da Palavra de Deus’.
O
objetivo da Lectio Divina não é, portanto, tornar alguém um estudioso, mas
aumentar a sua comunhão com Deus, porque passamos a conhecê-lo melhor,
visitando-o pessoalmente nas Escrituras, onde ele se entrega.
A
Lectio Divina é mais do que ler, mas envolve ler. Não é um estudo muito
intelectual, mas usa a inteligência. Requer fé, para que se possa estabelecer
um diálogo entre Deus e o homem, pois é ao Senhor que falamos quando oramos.
Por onde começar?
Se
estamos dando os primeiros passos na nossa vida de oração, é possível começar
lendo o Novo Testamento, particularmente os Evangelhos.
Podemos
escolher uma passagem do Evangelho da missa do dia ou domingo que está por vir,
ou mesmo fazer a leitura orante de um dos livros da Bíblia.
Quando
já tivermos mais experiência, podemos escolher um tema e fazer uma leitura
transversal. Por exemplo, procurar o que Jesus fala sobre o batismo ou o
observar durante as refeições com os seus discípulos. Em seguida, é possível
comparar e confrontar diferentes passagens do Antigo e do Novo Testamento.
Pode
ser útil usar sempre a mesma Bíblia para poder circular e marcar as passagens
ao passo que nos familiarizamos. Isso nos permitirá também retornar às nossas
passagens preferidas nos dias de secura espiritual.
Finalmente,
antes de começar, é bom lembrar que a Lectio Divina é pessoal, mas não
individual, é feita na Igreja, banhada pela Tradição.
Como praticar a Lectio Divina?
Nas
diferentes práticas, o procedimento permanece o mesmo. Guigues II le Chartreux
resume assim : ‘Busque lendo e encontrarás meditando; peça orando e a porta
se abrirá na contemplação’.
Ele
vê quatro etapas sucessivas, como degraus de uma escada pela qual o homem sobe
e desce entre a Terra e o Céu : leitura, meditação, oração e contemplação.
Vamos lá!
1. Invocar o Espírito Santo
Jesus
nos prometeu e o Espírito Santo nos conduzirá em todas as coisas. Nossa
cooperação é nosso esforço para ler, mas é o Espírito Santo que faz das
Escrituras uma palavra viva.
Podemos
orar assim : ’Vem, Espírito Santo, pai dos pobres, abre e ilumina meu
coração e minha inteligência!’.
Abrir
as Escrituras e lê-las, de acordo com São Jerônimo, é deixar que o Espírito
Santo nos conduza, sem saber de que margem nos aproximaremos.
2. Ler sem pressa
Lemos
o texto escolhido como se fosse a primeira vez, de maneira simples e humilde,
ignorando tudo o que possamos já saber sobre ele, tudo o que lemos ou ouvimos
como comentários. Caso contrário, é também possível ler a passagem selecionada
em voz alta ou copiá-la lentamente.
3. Interessar-se pelo contexto
O
que aconteceu pouco antes? Onde está acontecendo a cena? Jesus está sozinho com
uma pessoa ou ele está na companhia de seus discípulos ou de uma multidão? Que
hora do dia isso está acontecendo? Em que época do ano? Durante uma festa
litúrgica? Se sim, qual? O que isso significa para Israel?
Também
devemos prestar atenção no contexto, nos objetos em palco, etc. Por exemplo :
os seis jarros de casamento de Caná (João 2, 1-11) contêm 80 a 120 litros cada,
não são pequenos jarros!
Ou,
quando Jesus encontra a mulher samaritana perto de um poço (João 4, 1-42),
percebe que em um país quente, um poço é uma riqueza, um ponto de encontro, mas
também que o serviço de retirar a água é penoso.
Finalmente,
não podemos colocar um significado espiritual no texto e esquecer o significado
literal. Por exemplo, quando Jesus fala de ‘uma fonte de água jorrando para
a vida eterna’ (João 4:14). Tome tempo com alguns questionamentos: o que é
uma fonte de água? E de águas vivas? Será que a água é vital?
4. Interessar-se pelas palavras, pelos gestos, e pelo
silêncio
É
necessário estudar não apenas as palavras, mas também os gestos e os silêncios
dos personagens, começando pelos de Jesus. Para quem se adereçam? Quais são os
sentimentos dos protagonistas?
Você
também não deve hesitar em se deixar ser atingido por gestos ou palavras
chocantes ou aparentemente contraditórias. Exemplos : ‘Ao que te ferir numa
face, oferece-lhe também a outra.’ (Lucas 6, 29); ou o pastor que
deixou 99 ovelhas para procurar uma (Lucas 15: 4-7). E aí, uma passagem
conhecida pode se tornar nova!
5. Meditar e contemplar como a Virgem Maria
‘Maria
conservava todas essas palavras, meditando-as no seu coração.’ (Lucas
2:19). Releiamos o texto à luz da Palavra, porque tudo o que Jesus diz e faz é
revelação e dom de sua pessoa e, portanto, do Pai e do Espírito Santo. Tentemos
contemplar a Trindade descoberta através deste texto.
Mas
também meditemos sobre o que esse texto deseja iluminar de forma pessoal, na
nossa vida e nosso relacionamento com Deus. Devemos nos perguntar : o que Deus
está me dizendo hoje? E não : o que Deus diz aos homens em geral e em termos
absolutos?
Porque
‘todo aquele que vem a mim ouve as minhas palavras e as pratica, eu vos
mostrarei a quem é semelhante. É semelhante ao homem que, edificando uma casa,
cavou bem fundo e pôs os alicerces sobre a rocha. As águas transbordaram,
precipitaram-se as torrentes contra aquela casa e não a puderam abalar, porque
ela estava bem construída.’ (Lucas 6, 47-48).
Por
encontrar Deus nas Escrituras, acabamos agindo de acordo com a Sua palavra que
nos molda.
6. Para terminar, a oração
Dom
Chautard chamou a Lectio de ‘provedora de oração’. Para terminá-la, podemos
invocar o Espírito Santo e deixar surgir a oração de adoração, de súplica ou de
ação de graças que ele despertar.
7. Guardar a oração no nosso coração
A
Lectio Divina nos leva a lembrar de Deus pois ‘ruminamos’ suas palavras no
nosso coração : ‘Se alguém me ama, guardará a minha palavra e meu Pai o
amará, e nós viremos a ele e nele faremos nossa morada.’ (João 14,
23). E então, escrever uma passagem no nosso caderno, ou mesmo uma palavra que
falou ao nosso interior pode nos ajudar. Memorizá-la ou copiá-la lentamente, ou
até compartilhar a Palavra com alguém (sem comentar).
Não
devemos desanimar com a aparente secura ou desamparo da Lectio e ousar ficar
com uma pergunta, com palavras contraditórias ou chocantes, e deixa-las passar
sem compreender. O principal é reservar um tempo com Jesus. A oração será
nutrida por todas as expectativas que a Palavra de Deus terá gravado em nós.’
Fonte : *Artigo na íntegra
https://pt.aleteia.org/cp1/2020/01/27/meditacao-e-se-voce-tentasse-a-lectio-divina/
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