Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo
de Fabrício Veliq,
protestante,
é mestre e doutorando em
teologia
pela Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE),
doutorando
em teologia na Katholieke Universiteit Leuven - Bélgica,
formado
em matemática e graduando em filosofia pela UFMG
Pois digo a vós que se não
exceder de vós a justiça mais do que a dos escribas e fariseus, de modo nenhum
entrareis no Reino dos Céus. (Mt 5,20)
‘Esse versículo, que se encontra nos ditos chamados
Sermão do Monte na narrativa evangélica de Mateus, se mostra extremamente
interessante. Porém, para compreendê-lo é necessário ter em mente o contexto do
que representava o farisaísmo na época de Jesus. Os fariseus, nesse período,
eram os responsáveis por garantir que as leis de seu povo fossem seguidas por
todo aquele que se dizia servo de Deus. Esse prestígio alcançado tem muito a
ver com toda a luta em favor da ortodoxia judaica que se estabeleceu desde a
época em que Israel foi dominado pelo Império Grego e que pode ser lido nos
livros de I e II Macabeus. Os fariseus e seu amor pela Torá foram os grandes
responsáveis pelo estabelecimento do Monoteísmo na sociedade de Israel,
principalmente no período conturbado da perseguição Selêucida que ocorreu,
aproximadamente, ente 170 – 160 a.C.
Com isso em mente, não é difícil entender o
prestígio que gozavam entre a sociedade judaica no tempo de Jesus. Da mesma
forma, eram exímios cumpridores da Lei de Moisés, de maneira que poderiam ser
vistos pelo povo como exemplo de pessoas justas, ou seja, aquelas que andam de
acordo com a Torá.
Diante disso, é importante entender que Jesus nunca
foi contra os fariseus. Sua luta era contra os fariseus hipócritas, isto é,
pessoas que impunham fardos pesados sobre os ombros das pessoas e não moviam um
dedo para ajudar, como nos diz o texto de Mateus 23. Jesus via, sim, justiça
nos fariseus e nos escribas e tinha por eles grande apreço, até porque discutia
com eles em uma cultura que dizia que somente se discutia com quem se
respeitasse. Dessa forma, o discurso de que Jesus era contra todos os fariseus
e escribas não é verdadeiro.
Ao mesmo tempo, Jesus, ao dizer que a justiça de
seus discípulos deve exceder em muito a desses escribas e fariseus poderia
gerar, a princípio, certo desconcerto na mente dos que o ouviam. Como seria
possível exceder a justiça daqueles que eram considerados como os mais fiéis
seguidores da lei de Moisés?
O que Jesus quer mostrar é que a justiça do Reino
não se baseia no cumprimento de normas pré-estabelecidas que devem ser seguidas
à risca para se garantir alguma benevolência da parte de Deus. Afinal, esse era
o intuito de vários fariseus. Por meio de sua justiça demonstrada no
cumprimento da Lei esperavam alcançar o beneplácito divino e também ser
reconhecido pela sociedade de seu tempo. Nesse sentido, por serem exímios
cumpridores da Lei, vários se consideravam moralmente superiores aos outros e
mais dignos da salvação do que os que não seguiam tão fielmente às instruções
dadas a Moisés. Em outras palavras, era uma justiça que se baseava na Lei e que
visava o reconhecimento por parte da sociedade.
O evangelista Mateus, ao dizer que a justiça que é
esperada para a entrada no Reino é uma que exceda a dos escribas e fariseus,
coloca-nos diante de uma verdade que Paulo já havia desenvolvido de que não é
possível por meio do cumprimento da lei alcançar a graça divina. A justiça do
Reino é uma justiça que se baseia somente na fé e, nesse sentido, há uma
mudança na perspectiva de seu significado. Justo não é mais aquele/a que se
adequa às normas, antes, aquele/a que se volta para Deus e tem sua vida
transformada por meio desse encontro.
Assim, a justiça não é mais algo a ser graduado,
conforme consolidado por todo um sistema farisaico do tempo de Jesus e, muitas
vezes, vivo ainda hoje. Antes, em Jesus, se inaugura um novo tipo de justiça,
que se mostra fruto de um relacionamento e de um encontro com o Pai.
Diante disso, toda tentativa de
estabelecer a entrada no Reino de Deus por meio de atos de justiça se torna sem
sentido para a fé cristã. Muito pelo contrário, ao se reconhecer que a nossa
justiça procede do amor de Deus que nos torna justos, é possível dizer que toda
nossa boa obra deve ser um reflexo desse amor que nos alcançou em primeiro
lugar, sendo somente assim o modo pelo qual nossa justiça excederá em muito a
dos escribas e fariseus.’
Fonte :
* Artigo na íntegra http://domtotal.com/noticia/1262620/2018/05/exceder-a-justica-dos-escribas-e-fariseus/
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