*Artigo
de Evaldo D´Assumpção,
médico
e escritor
A
lista é enorme, mas o tempo e o espaço são escassos para apontá-los todos. O
mesmo acontece com as várias denominações comumente utilizadas para definir
àqueles, e àquelas, que ultrapassaram a barreira dos 60 anos : velho, velhote,
ancião, senil, coroa, pé-na-cova, vetusto, longevo, matusalém, macróbio, idoso,
nas formas masculina ou feminina. De todos eles, o termo mais apropriado é 'idoso', 'idosa', pois define melhor o que somos, sem nos qualificar
pejorativamente, a nós que ultrapassamos essa barreira etária. E gosto dele,
porque é também o mais correto. Idoso é a forma haplológica de ‘idadoso’, expressão que une idade – o
tempo de vida que tem uma pessoa – ao sufixo oso, que representa abundância.
Por exemplo: caridoso, é quem tem muita
caridade; bondoso, é aquele com muita bondade. E assim vai. O idadoso – idoso,
em sua forma sintética – é, portanto, aquele que tem maior quantidade de anos
de vida, não se devendo confundir com ‘velho’,
que é o desgastado, carcomido, quase acabado. Afinal, existem muitos jovens que
já são autênticos velhos... Já o termo provecto, que em sua etimologia
representa 'o que impele, que leva para
diante, adiantado, que faz andar', é aceitável e até elogioso pelo que
significa, porém um tanto quanto rebuscado para se usar rotineiramente. Ele
evidencia uma qualidade real, porém nem sempre aplicável a todos os idosos.
Uma
característica a nós atribuída é a ranzinzice, condição que abarca a
impaciência, intolerância, irritabilidade. Mas, a sua predominância ocorre nos
que chamo de 'novos idosos' aqueles e
aquelas que a partir das duas últimas décadas do século passado, passaram dos
60, mas continuam com aparência e energia admiráveis, muitos em plena atividade
laborativa. Nesses 'novos idosos' a
ranzinzice é consequência do orgulho, da vaidade, da prepotência, da soberba e
da intransigência, provocadas por não terem ainda alcançado o que chamo de
terceira maturidade, na qual já se sabe bastante, e por isso mesmo sabe-se que
não se sabe tudo; que ainda podemos bastante, mas que há muito mais coisas que
já não podemos, e muito menos devemos tentar. Sob pena de nos tornarmos
ridículos, além dos sérios riscos de acidentes de menor ou maior gravidade, a
que estamos sujeitos. São os 'novos
idosos' que por quase nada, e com frequência, criam enormes casos, reclamam
de tudo e de todos, e com esse comportamento passam a imagem de ranzinza para
os idosos em geral, estigmatizando os verdadeiros com uma pecha que quase nunca
cabe neles.
Em
defesa dos verdadeiros idosos e idosas do século XXI, defendo a mudança dessa
condição e do seu título respectivo, exclusivamente para os que chegaram e
ultrapassaram os 70 anos de idade. Vou além, incluindo os direitos de
aposentadoria, e os benefícios que hoje são concedidos a qualquer um que
atingiu a juventude estendida dos 60 anos, graças aos avanços da ciência e
novos recursos terapêuticos, preventivos e curativos. E também da cirurgia
plástica...
Reconheço
que, para alguns, as manifestações de ranzinzice são consequências dos anos
vividos, da incapacidade de tolerar certas coisas que, na vida longeva que
tiveram, mas também nos dias atuais, vão acumulando. Reprimidos na expressão
dos seus sentimentos, quando comportamentos demasiadamente liberais batem forte
contra suas convicções sociais, familiares e religiosas, recalcam seus
aborrecimentos, ao invés de se aliviarem expressando-os, ou simplesmente
virando as costas, deixando-os para traz. Com isso acumulam ira sobre ira,
mágoa sobre mágoa, tudo agravado por ocasiões em que são obrigados a dar um
sorriso simpático, ou acolher as besteiras que acabam de ver ou ouvir.
Ultrapassando a barreira do 60, sentem-se liberados para tudo – ou quase
tudo... Chegando aos 70, melhor ainda aos 80, descobrem que, mesmo a
contragosto dos circunstantes, dizer que não gostam de uma coisa da qual
realmente não gostam, é um direito seu. Quando muito, poderão escutar alguém
murmurar : ‘Deixa! Ele já está ficando
gagá!’, ou então chamá-lo de ranzinza... O idoso livre, alegra-se
interiormente por expressar seus sentimentos, ganhando para si, qualidade de
vida e felicidade.
É
claro que não estou aqui defendendo a grosseria, a falta de educação, de
cavalheirismo, de gentileza, de delicadeza especialmente feminina, coisas que definitivamente
não coadunam com idosos de estirpe. Para estes, a manifestação de insatisfação
se faz com elegância, com respeito, coisas que, tendo recebido em sua formação
cuidadosa na infância e juventude, continuam sendo utilizadas, porém de forma
firme e livre, ainda que cortês e sem qualquer agressão, destempero ou
desrespeito. Evitando a fofoca, que não lhes apraz, e os comentários mordazes e
ofensivos, a ironia tosca e contundente. Atitudes que os jovens de hoje quase
não conhecem, pois não lhes ensinaram, e nem eles aprenderam. Com honrosas
exceções, como há exceções nas diferentes categorias de idosos e idosas que
acabo de descrever.’
Fonte
:
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