*Artigo
de Padre José Vieira,
Missionário Comboniano
‘Enternecem-me
as representações africanas do presépio, esculpidas ou pintadas. Singelas,
lineares, às vezes minimalistas, outras vezes com explosões de cor, luz e
movimento como os ícones etíopes da natividade que tanto me fascinam: olhares
enormes, redondos, contemplativos; corpos solenes; mãos esguias, adoradoras;
uma paleta de cores ricas de vida : amarelos, azuis, encarnados, brancos…
Cabeças e asas de anjos a anunciar a grande alegria : nasceu-vos um Salvador!
O presépio é uma
criação plástica de Francisco de Assis. Montou-o pela primeira vez com figuras
de barro em 1223 na floresta de Grécio, no Lácio italiano. Com o andar do
Cristianismo através das muitas culturas, foi ajuntando matizes e materiais
locais que aprofundam o mistério da encarnação : Jesus faz-se homem em cada
raça, é mistério intercultural.
Há um pensar que me vara o coração com um estremecimento apertado :
se, em vez de nascer em Belém da Judeia, Jesus tivesse nascido, por exemplo, em
Bentiu – no Sudão do Sul, Bourem – no Mali, Bongor – no Chade, Blama – na Serra
Leoa, ou no Bailundo – em Angola, que chance teria de chegar à idade adulta?
A infância
africana continua sob céus pesados apesar dos grandes progressos na assistência
sanitária das últimas décadas. A Unicef, a agência da ONU para a infância,
denuncia que no Sahel, no Nordeste da África, a crise alimentar ameaça cerca de
6,4 milhões de crianças de má nutrição aguda, afetando o seu desenvolvimento
integral; que 2,4 milhões de crianças estão a ser atingidas pela crise na
República Centro-Africana; que mais de 2,5 milhões de crianças sofrem de má
nutrição severa aguda na República Democrática do Congo; que a guerra étnica no
Darfur e nos montes Nuba, no Sudão, deixou as crianças vulneráveis às doenças e
à fome, incluindo 1,2 milhões que sofrem de má nutrição aguda.
As estatísticas da
mortalidade infantil são ainda mais tremendas : a Organização Mundial de Saúde
diz que na África 8,1 % das crianças morrem antes de fazerem cinco anos. Em
números redondos, em 2013, faleceram 2,9 milhões de crianças africanas com
menos de cinco anos, um contador implacável de cinco crianças a morrer por cada
minuto que passa.
A ONG Child
Mortality documenta que, na África Subsariana, uma em cada 12 crianças morre
antes dos cinco anos (nos países ricos o rácio é de uma por 147). Por países,
em Angola perecem 15,7% das crianças antes dos cinco anos, no Chade 13,9%, na
Somália 13,7%, na República Centro-Africana 13% e no Mali 11,5%. Portugal tem
uma taxa de mortalidade infantil de 0,4% : morrem quatro crianças por cada mil
nascimentos antes dos cinco anos.
O que é que mata
os bebês africanos? Infecções, pneumonias, diarreias, malária, má nutrição e
outras doenças facilmente tratáveis com medicamentos baratos e vacinas. Mas as
crianças continuam a morrer...
Relacionada com a
natividade africana está também a mortalidade materna. Os números são do Banco
Mundial e da ONU e respeitam ao ano de 2013 : na Serra Leoa, o país com o
índice mais elevado, morrem 1100 mães por 100 mil partos vivos. Segue-se o
Chade com 980, a vizinha República Centro-Africana com 880, o Burundi com 740 e
o Sudão do Sul e a República Democrática do Congo com 730. Em Portugal, a
mortalidade materna é de oito mães por cada 100 mil nascimentos. As mamães morrem de complicações antes, durante e depois do parto,
porque os governos canalizam os recursos para a guerra, descuidando da saúde
pública. Muitas são demasiado jovens para gerar filhos...
O Papa Francisco
escreveu uma frase muito eloquente na exortação apostólica A Alegria do
Evangelho : «Na sua encarnação, o Filho
de Deus convida-nos à revolução da ternura!»
Fonte :
* Artigo na íntegra http://www.alem-mar.org/cgi-bin/quickregister/scripts/redirect.cgi?redirect=EuuAuluEVEetZBXLSR
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