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quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Crises e nova cultura

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG


‘O momento atual se caracteriza pelas crises, cada vez mais evidentes, com consequências reais, para além do mero alarmismo. É real a situação difícil vivenciada por pessoas e setores afetados. As análises comprovam que a gênese dessas crises enfrentadas pela sociedade brasileira tem um histórico que é fruto das escolhas políticas, da eleição equivocada de prioridades sociais e também do tipo de tecido cultural sobre o qual está assentada.

O fato é que há crises e essas trazem consequências de diferentes naturezas. Momento oportuno para se refletir sobre o ensinamento que se aloja no reverso dessa realidade desafiadora. O ponto de partida para essa reflexão é admitir que nenhuma crise é acontecimento súbito. Sua geração é um longo desdobramento que pode revelar preciosas lições no que diz respeito a reações e novas respostas. Um processo capaz de proporcionar aprendizagens relevantes e transformadoras. Seria um grande risco deixar passar em ‘brancas nuvens’ a singular oportunidade de se aprender novas dinâmicas nas relações sociais. São imprescindíveis as atitudes fundamentadas nos princípios dessas lições.

Vista desse modo, a crise torna-se possibilidade de se ingressar em um processo de correção de rumos. Desvencilha a sociedade do perigo de um tratamento cultural da situação com o conhecido ‘jeitinho’ próprio de dissimular os pontos críticos e justificar a manutenção de um sistema que neutraliza ações eficazes para a superação dos desafios.

A hora é oportuna para vencer a desconfiança, o desespero e a desorientação provocados pelas dificuldades. É o momento certo para se exercer a cidadania ao mesmo tempo em que se espera, com justeza, novas configurações na postura dos órgãos governamentais, instâncias públicas de representação e daquelas que, diretamente, prestam serviços ao povo. Não menos exigente é a expectativa quanto às atitudes dos construtores da sociedade, para que ajam norteados por princípios que garantam o bem comum, prezando o crescimento e o desenvolvimento das instâncias responsáveis pela produção e sustentação do equilíbrio social e econômico.

Além dos aspectos que atingem altas esferas e intervenções de caráter sistêmico, vale considerar a crise como oportunidade para uma nova cultura modulada em hábitos e atitudes - reações e respostas a favor daquilo que a própria crise aponta como solução. Mas, assumir outro modo de pensar e agir, no entanto, não é tão fácil assim. Existe uma forte tendência do ser humano ao comodismo, o que o predispõe a manter os mesmos costumes, diferentemente, das pessoas que enfrentam rupturas drásticas da ordem social e econômica provocadas pelas guerras ou catástrofes naturais. Nesse contexto, o estado de penúria impõe a aprendizagem das lições sobre economizar, evitar desperdícios e a adoção de novos hábitos. Essas rupturas e as consequências com força de testemunho funcionam sempre como forte apelo para novas atitudes. Nesses momentos, por exemplo, é comum presenciarmos gestos de pessoas que doam parte de suas fortunas ou de seus altos salários em prol do bem comum. São iniciativas que contribuem para a construção de uma cultura solidária e sustentável.

Condutas como essa, ainda não fazem parte de nossa realidade. Sequer ousamos esperar que, diante das necessidades do governo de atender as demandas do setor educacional, políticos e funcionários do alto escalão aceitem ter os vencimentos reduzidos. O que se vê são atitudes em causa própria, tomadas em todas as instâncias do poder.

A própria superação da crise econômica exige novos parâmetros. É urgente encontrarmos um modelo que não dependa do consumismo. No momento atual, torna-se indispensável um processo de reeducação no consumo que pode começar no momento das refeições diárias diante da discrepância entre a quantidade servida e a necessidade das pessoas. O equilíbrio ao consumir é, sem dúvida, um desafio cultural que precisa entrar agora como legado advindo do tratamento e do enfrentamento da crise.

Não se pode restringir o olhar sobre os expressivos números do contexto econômico nacional ou global - é curioso como são predominantes nos noticiários quantias astronômicas. Torna-se necessário, primeiro, aprender a poupar, a valorizar o próprio dinheiro, a partir de cada centavo, para saber respeitar e exigir respeito ao erário. O propósito não é o de fazer apologia à usura, mas sim de sugerir o princípio da otimização do consumo cultural daquilo que é realmente necessário.  Certamente, se a sociedade aprendesse a superar o desperdício com as crises em curso já haveria uma radical transformação de hábitos com os ganhos incidindo sobre o atendimento às necessidades de outros que hoje estão à margens do mercado. É possível vislumbrar que essa reeducação aponte até mesmo para a correção de critérios morais, pois a cultura da ganância também patrocina a tolerância à corrupção. Que as crises se tornem escolas de aprendizagem e de construção de uma nova cultura.’


Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=5292

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