*Artigo de Frei Patrício Sciadini,
OCD,
Provincial dos carmelitas descalços no Egito
‘O V
Centenário do nascimento de Santa Teresa d’Ávila, fundadora das carmelitas descalças e
dos carmelitas descalços, coloca em discussão tanto nossa maneira de pensar
como de viver. Hoje gostaria de
evidenciar um aspecto do momento atual, onde a Igreja, mãe e mestra, se
encontra com uma certa dificuldade e que Teresa pode oferecer uma luz e um
caminho novo e corajoso : a clausura. O que nós entendemos quando falamos
de monjas de clausura ou de Carmelitas Descalças, fundadas por Santa Teresa
d’Ávila, naquela manhã quente e esplendida do 14 de agosto de 1562? A fundação
de São José foi preparada no silêncio, às escondidas. O povo de Ávila acordou
com as badaladas do sino do pequenino mosteiro e ficou assustado, preocupado
por ter que manter economicamente um outro mosteiro e outras monjas. Tentou-se
todo o possível para fechar o mosteiro, mas não teve jeito. O bispo Dom Álvaro
estava de acordo e especialmente Teresa era uma ‘cabeça dura’, que não desanimava diante de coisas deste tipo.
Quando
nós falamos hoje de clausura entendemos monjas contemplativas que decidem
separarem-se do mundo, para viver uma maior intimidade com Deus, e que querem
abraçar, com a oração, todas as necessidades da Igreja e serem uma presença
viva, atuante, dentro da comunidade, não pelas formas de apostolado, nem pelas
obras, mas sim pela oração e uma intensa
vida espiritual. Se fala de clausura papal. Não podem sair a não ser por
determinados motivos e normas. E se obrigam a uma vida de sacrifício, de
distância do mundo e etc dos etceteras. Tudo bem. Nada contra isto. Mas como
Teresa soube ‘administrar tudo isto’,
como ela e suas monjas souberam viver a clausura naquele tempo? E como deveria
ser vivida hoje?
Não
é caso de perder-nos em estéreis discussões sobre isto, tanto mais que eu não
sou monja de clausura, mas sim ver como Teresa amou intensamente a clausura
como ‘recanto de solidão’ para estar
na escuta de Deus e viver, como dizia o seu filho e mestre espiritual João da
Cruz, ‘a solidão sonora e música
silenciosa’. Mas ao mesmo tempo o seu zelo pela missionaridade a levou
muitíssima vezes a ‘sair da clausura’
para levar a presença de Cristo e do Carmelo no coração das cidades. Isto
podemos comprová-lo olhando ‘o entusiasmo
e uma certa ânsia de fundar mosteiros a toque de caixa’, em 20 anos, isto é
de 1562 ao 1582. Teresa fundou quase 20 mosteiros de monjas e 13 de frades. Um
ritmo impressionante, uma atividade que poderíamos chamar ‘frenética’, e projetou um Carmelo em Madri, mesmo que nunca
conseguiu realizar.
Às
vezes Teresa tinha que sair da clausura para consolar princesas depressivas ou
jovens princesas como a de Alba de Tormes, que estava prestes a dar a luz, que
queria a presença da madre Teresa. Ela chegará mais tarde para morrer em Alba
de Tormes. Foi convidada a sair da clausura pelos Superiores sem motivos
sérios, e hoje diríamos inúteis, mas Teresa é obediente e se coloca em caminho,
com dificuldades e vai. Sabe como se relacionar com bispos e convencê-los a
aceitar e apoiar as fundações, como a de Burgos e de Sevilha.
A clausura de Teresa foi muitas vezes as ruas
e as viagens, ou o seu ‘Carmelo
itinerante’, em carruagem, onde nunca faltava o famoso sino, para chamar e
marcar os horários das orações, do silêncio, da recreação. E convidava aos
cocheiros a fazer silêncio e, se obedeciam, dava para eles uma boa porção de
comida. Viveu a clausura com uma certa ‘elasticidade
e liberdade interior’ e se sentiu bem. Mais tarde, depois de sua morte,
vieram superiores, como o Padre Doria, que amará mais a lei que a pessoa
humana. A clausura para Teresa não é mais importante que a missão, e nem a
pessoa humana. Ela era uma mulher livre e a sua liberdade a viveu a com uma
atenção às leis, à obediência à Igreja, mas também às necessidades do seu
tempo.
O
que diria Teresa de Ávila da clausura de hoje? Vamos deixar para um próximo
artigo, que o meu espaço terminou. Mas creio que é necessário ter uma visão de
clausura, de contemplação, que seja ao mesmo tempo um estilo de vida, com
normas jurídicas, mas com uma visão do que diz Jesus : ‘não é o homem que é feito para os sábado, mas o sábado para o homem’.
Nasce sem dúvida uma nova reflexão sobre este tema tão importante ao se colocar
em discussão, a clausura. Mas será que se rompe a clausura só saindo do
mosteiro? Creio que os meios de comunicação, se não bem usados, são um meio não
para conservar o silêncio e solidão, para uma maior intimidade com Deus, mas
para fazer entrar o mundo e a ‘mundanização’
nos conventos de clausura e nos corações dos contemplativos e dos consagrados.
Teresa
de Ávila teria bem usado os meios de comunicação de hoje, seja a internet,
WatsApp, twiter, como a seu tempo soube bem usar a comunicação mediante livros, cartas e
encontros, e como ‘andarilha de Deus’,
pelos caminhos da Espanha e comunicou o evangelho e a oração com todos os meios
e forças e capacidade, que Deus lhe deu.
Teresa é a cantora da liberdade sadia, forte, divina e humana. Soube voar e
bem, de um lado ao outro, para anunciar o seu amor a Jesus e à Igreja, na
escuta de Deus e da Igreja. Podemos estar em ‘clausura’ e ter o coração como um aeroporto ou rodoviária, de vai e
vem. E podemos ir pelo mundo com o coração cheio de Deus e viver um ‘clausura de amor’, onde o mundo não pode
perturbar-nos. ‘Onde está o teu tesouro
aí está o teu coração’’.
Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www.zenit.org/pt/articles/santa-teresa-monja-de-clausura-pelos-caminhos-de-espanha
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