Páginas

sexta-feira, 19 de dezembro de 2025

'A universalidade da salvação' – Terceira Pregação do Advento de 2025

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Tiziana Campisi


A luz que desmascara

‘O frade menor capuchinho propôs uma reflexão sobre a manifestação universal da salvação, sobre Cristo, a verdadeira luz, que é capaz de iluminar, esclarecer e orientar toda a complexidade da experiência humana, que não apaga as perguntas, os desejos e as buscas humanas, mas os coloca em relação, os purifica e os conduz a um significado mais pleno. Luz que o mundo não abraçou porque os homens amaram mais as trevas. O problema, explicou o padre Pasolini, é nossa disponibilidade em acolher a luz, que é necessária e bonita, mas também exigente : desmascara ficções, expõe contradições, obriga a reconhecer o que preferiríamos não ver, e por isso a evitamos.

No entanto, observou o religioso, Jesus não contrapõe quem pratica o mal a quem pratica o bem, mas quem pratica o mal a quem vive a verdade. Isso significa que, para acolher a luz da Encarnação, não é preciso já ser bom ou perfeito, mas começar a tornar a verdade uma realidade na própria vida, ou seja, parar de se esconder e aceitar ser visto por quem se é, porque Deus está mais interessado em nossa verdade do que na bondade de fachada.

Igreja, comunidade que vive a luz de Cristo

Para a Igreja, isso significa iniciar um caminho de maior verdade, o que significa não exibir uma pureza moral ou reivindicar uma coerência impecável, mas apresentar-se com sinceridade e reconhecer resistências e fragilidades. Porque o mundo não espera uma instituição sem fissuras, nem mais um discurso indicando o que deve ser feito, disse o padre Pasolini, mas precisa encontrar uma comunidade que, apesar de suas imperfeições e contradições, viva verdadeiramente à luz de Cristo e não tem medo de se mostrar como é. Os Reis Magos, por exemplo, demonstraram uma maneira singular de serem verdadeiros ao trilharem o caminho do Senhor, explicou o religioso. Eles partiram de longe, mostrando que para acolher a luz do Natal, é necessário um certo distanciamento, para enxergar melhor as coisas : com um olhar mais livre, mais profundo, mais capaz de surpreender. Em vez disso, o hábito de olhar a realidade de perto demais nos torna prisioneiros de julgamentos previsíveis e interpretações excessivamente consolidadas, e isso também acontece com aqueles que vivem permanentemente no centro da vida eclesial e comporta responsabilidades, observou o pregador da Casa Pontifícia, porque a familiaridade cotidiana com funções, estruturas, decisões e emergências pode, com o tempo, estreitar o olhar e, assim, corre-se o risco de não reconhecer os novos sinais pelos quais Deus se faz presente na vida do mundo.

Os caminhos inesperados de Deus

Se o Natal celebra a entrada da luz no mundo, a Epifania destaca que essa luz não se impõe, mas se deixa reconhecer, manifesta-se numa história ainda marcada pela escuridão e pela busca, e é uma presença que se oferece a quem está disposto a se mover. Nem todos a veem da mesma maneira e a reconhecem ao mesmo tempo, porque a luz de Cristo se deixa encontrar por quem aceita sair de si mesmo, quem se coloca a caminho, quem busca, enfatizou o frei capuchinho, acrescentando que isso também é verdade para o caminho da Igreja, já que nem tudo o que é verdadeiro se mostra imediatamente claro, nem o que é evangélico é imediatamente eficaz. E, às vezes, a verdade exige ser seguida mesmo antes de ser plenamente compreendida.

A este respeito, o Padre Pasolini citou a experiência dos Magos, que não avançaram apoiados por certezas consolidadas, mas por uma estrela frágil, porém suficiente para guiá-los em sua viagem. Os sábios que vieram do Oriente para Belém ensinam essencialmente que para encontrar o rosto de Deus feito homem, é preciso colocar-se a caminho, e isso, enfatizou o pregador da Casa Pontifícia, se aplica a todo fiel, e especialmente a quem têm a responsabilidade de proteger, guiar e discernir. Sem um desejo que permanece vivo, mesmo as mais elevadas formas de serviço correm o risco de se tornarem repetitivas, autorreferenciais, incapazes de surpreender. A estrela que guiou os Magos, para o padre Pasolini, é também o sinal das discretas lembranças com as quais Deus continua a se fazer presente na história, e assim, aqueles sábios que não conhecem as Escrituras de Israel, mas leem os céus, lembram que Deus também fala por meios inesperados, experiências periféricas, perguntas que surgem do contato com a realidade e aguardam para serem ouvidas.

Imobilidade

Mas outro aspecto importante que emerge da história dos Magos é a atitude de busca : não se importar, não se colocar em movimento, pode levar a acomodação em uma posição que parece reconfortante, baseada em certezas e hábitos consolidados, mas que com o tempo corre o risco de se tornar uma forma de imobilidade interior, que lentamente isola, muitas vezes sem que percebamos. É o que acontece com Herodes, ele parece atento : questiona, calcula, planeja, mas não parte para Belém, não aceita o risco e a surpresa do que poderia acontecer e delega a tarefa de ir aos Magos, reservando-se o direito de ser informado sobre os acontecimentos. É a atitude de quem quer saber tudo sem se expor, permanecendo protegido das consequências de um envolvimento real, afirmou o frade franciscano, alertando contra uma abundância de conhecimento que carece de envolvimento real. Sabemos muitas coisas, mas permanecemos distantes. Observamos a realidade sem nos deixarmos tocar, protegidos por uma posição que nos protege do imprevisto. Acontece, então, que na Igreja se pode conhecer bem a doutrina, preservar a tradição, celebrar a liturgia com zelo e, ainda assim, permanecer parados. Como os escribas de Jerusalém, também nós podemos saber onde o Senhor continua se fazendo presente — nas periferias, entre os pobres, nas feridas da história — sem encontrar a força ou a coragem para seguir nessa direção, advertiu o pregador da Casa Pontifícia.

A coragem de se levantar

Em síntese, para encontrar Deus, o primeiro passo é sempre se levantar : sair de nossos refúgios interiores, de nossas certezas, nossa visão consolidada das coisas, insistiu o padre Pasolini, especificando que levantar-se exige coragem. Significa abandonar o estilo de vida sedentário que nos protege, mas nos imobiliza, aceitar o cansaço do caminho, expor-se à incerteza do que ainda não está claro. Como fizeram os Reis Magos, deixando sua terra natal e cruzando distâncias sem garantias, guiados apenas por um sinal tênue e discreto, sem saber o que encontrariam, mas confiando na luz que os precedia. Isso é o que significa esperar.

O padre Pasolini também destacou o abaixamento humilde dos Reis Magos. Ao chegarem a Belém, adoraram o Menino, se colocaram a caminho, buscaram e se abriram ao mistério : Levantar-se e depois ajoelhar-se : este é o movimento da fé. Levantar-se para sair de si, não para colocar-se no centro. E depois se abaixar, porque se percebe que o que encontramos está além do nosso controle. Para o pregador da Casa Pontifícia, isso vale na relação com Deus, nas relações cotidianas — quando o outro nos surpreende, nos decepciona ou nos transforma — e é preciso parar de impor nosso próprio ponto de vista e aprender a verdadeiramente escutar. E, ampliando a perspectiva, vale também para a Igreja, que é chamada a se mover, a sair, a encontrar pessoas e situações que lhe são distantes, e também a saber parar, abaixar o olhar, a reconhecer que nem tudo lhe pertence nem pode ser controlado. Então, o dom da salvação pode se tornar universal se a Igreja aceitar em deixar de lado suas próprias certezas e olhar com respeito para a vida dos outros, reconhecendo que mesmo ali, muitas vezes de maneiras inesperadas, algo da luz de Cristo pode emergir.

A verdadeira luz do Natal

Um último aspecto sobre o qual o pregador da Casa Pontifícia convidou a refletir foi que se Deus escolheu habitar nossa carne, então cada vida humana carrega em si uma luz, uma vocação, um valor que não pode ser apagado. Isso nos leva a concluir que não viemos ao mundo apenas para sobreviver ou atravessar o tempo da melhor maneira possível, mas para ter acesso a uma vida maior : a de filhos de Deus. Assim, a tarefa da Igreja é oferecer a luz de Cristo ao mundo. Não como algo a impor ou defender, mas como uma presença a oferecer, deixando que todos se aproximem. Portanto, sob essa perspectiva, a missão não consiste em forçar o encontro, mas em torná-lo possível, concluiu o padre Pasolini. Uma Igreja que oferece a presença de Cristo a todos não se apropria de sua luz, mas a reflete. Não se coloca no centro para dominar, mas para atrair, tornando-se, portanto, um espaço de encontro, onde cada pessoa pode reconhecer Cristo e, diante dele, redescobrir o sentido de sua vida. A perspectiva sobre os hábitos missionários deve, portanto, mudar : muitas vezes se pensa que evangelizar significa levar algo que falta, preencher um vazio, corrigir um erro, mas a Epifania aponta para outro caminho, que é o de ajudar o outro a reconhecer a luz que já habita nele, a dignidade que já possui, os dons que já possui. Portanto, a catolicidade da Igreja consiste em guardar Cristo para oferecê-lo a todos, com a confiança de que a beleza, a bondade e a verdade já estão presentes em cada pessoa, chamada à plenitude e a encontrar nele o seu pleno significado. Em conclusão, para o pregador da Casa Pontifícia, a verdadeira luz do Natal 'ilumina cada homem' precisamente porque é capaz de revelar a cada um a própria verdade, a própria vocação, a própria semelhança com Deus.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2025-12/pasolini-pregacao-advento-luz-deus-magos-igreja.html 

quarta-feira, 17 de dezembro de 2025

A tradição contemplativa

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Kim Nataraja


‘O fato de a meditação, a oração contemplativa, ser autenticamente cristã também pode ser constatado pelo fato de que, em muitas tradições cristãs, a oração silenciosa constitui o centro da adoração. Na tradição carmelita, Santa Teresa de Ávila foi muito influenciada, nos primeiros vinte anos de sua jornada espiritual, por um livro devocional popular da época chamado ‘Terceiro Alfabeto Espiritual’, de Francisco de Osuna, um monge franciscano, que recomendava a oração pela repetição de uma frase espiritual. Com ele como guia, ela foi conduzida da oração discursiva para o que chamou de ‘oração da quietude’ e até mesmo para a ‘oração da união’. Essas formas de oração são caracterizadas por uma crescente profundidade de silêncio e quietude interior. É uma maneira de abrir o coração a Deus na oração.

A ‘Oração de Jesus’, que se tornou conhecida no Ocidente no século XIX através do encantador livro ‘Relatos de um peregrino russo’, de autor anônimo, foi uma continuação da tradição de oração na Igreja Ortodoxa Oriental conhecida como ‘Oração do Coração’. Novamente, a ênfase está na repetição de uma frase de oração que leva ao silêncio interior e à solidão. Tanto essa tradição quanto aquela que John Main redescobriu para nós nos escritos de João Cassiano baseiam-se nos ensinamentos dos Padres do Deserto, em particular Evágrio Pôntico, que foi uma importante fonte e inspiração para ambas.

Na Inglaterra do século XIV, foi a obra ‘A Nuvem do Não-saber’, também de autor anônimo, que recomendou a mesma forma de oração. O autor enfatiza ‘perfurar o coração de Deus com um dardo flamejante de amor’. Para isso, precisamos concentrar todo o nosso amor e atenção em uma única palavra. Ele sugere que escolhamos uma palavra monossilábica como ‘Deus’ ou ‘Amor’, que expresse a intenção do nosso coração. O movimento da ‘Oração Centrada’ de Thomas Keating se inspira neste livro. O autor de ‘A Nuvem do Não-saber’ expressa o que está por trás de todos os ensinamentos da tradição mística cristã, ou seja, precisamos nos desapegar dos pensamentos, concentrando-nos em nossa palavra : ‘Fixe-a em sua mente para que permaneça lá, aconteça o que acontecer’. Ou, como John Main sempre dizia : ‘Apenas diga a sua palavra ’. 

Todos os guias espirituais mencionados fazem parte do que é conhecido como a tradição mística da ‘via negativa’, na qual Deus é incognoscível e inexprimível às nossas limitadas capacidades racionais. Portanto, precisamos nos desapegar do pensamento, de todos os pensamentos, sejam eles mundanos ou espirituais, para nos abrirmos mais a Ele e escutarmos profundamente a ‘voz mansa e delicada’. A ênfase está no Amor, em repetir a oração com amor e fidelidade. As diferenças em nossa época entre, por exemplo, a Tradição Carmelita, a ‘Oração Centrante’ e a ‘Comunidade Mundial para a Meditação Cristã’ são muito menores do que as correspondências entre as nossas respectivas formas de oração. Podemos nos inspirar em fontes diferentes, mas todos estamos empenhados em reconectar as pessoas no caminho espiritual com uma forma autêntica de oração que conduz ao silêncio e à consciência da Presença de Deus em nossos corações.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.wccm.org.br/ensinamento-semanal/a-tradicao-contemplativa-2/


segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

Papa: arqueologia cristã, vocação e forma de amor pela Igreja e pela humanidade

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Benedetta Capelli


‘Escavar, tocar os achados, reencontrar a energia do tempo — mas no trabalho do arqueólogo cristão não há apenas matéria, há também humanidade : as mãos que forjaram os objetos encontrados, ‘as mentes que os conceberam, os corações que os amaram’. Essa é uma das características da arqueologia cristã destacada pelo Papa na Carta Apostólica sobre a importância da arqueologia, publicada no dia 11 de dezembro, por ocasião do centenário do Pontifício Instituto de Arqueologia Cristã.

Leia a Carta Apostólica na integra

Tornar o Mistério visível 

Matéria e mistério : são duas linhas que se cruzam na arqueologia cristã porque ‘o cristianismo — destaca Leão XIV — não nasceu de uma ideia, mas de uma carne’, de um ventre, um corpo, um túmulo. A fé cristã se apoia em ‘eventos concretos, rostos, gestos, palavras pronunciadas em uma língua, em uma época, em um ambiente. É isso que a arqueologia torna evidente, palpável’. O Papa recorda ainda que ‘Deus escolheu falar em uma língua humana, caminhar sobre uma terra, habitar lugares, casas, sinagogas, ruas’. Por isso, em um tempo que recorre à Inteligência Artificial e investiga galáxias, ainda faz sentido continuar a investigar. ‘Não se pode compreender plenamente a teologia cristã — escreve o Papa — sem a inteligência dos lugares e das marcas materiais que testemunham a fé dos primeiros séculos’.

Nada é insignificante

A arqueologia e a teologia se entrelaçam no trabalho do arqueólogo, que deve ter uma sensibilidade especial ao lidar com ‘materiais da fé’. ‘Escavando entre pedras, ruínas, objetos — explica o Pontífice — aprendemos que nada do que foi tocado pela fé é insignificante’. Cada pequena evidência merece atenção, não deve ser descartada. Assim, a arqueologia se torna ‘uma escola de sustentabilidade cultural e ecologia espiritual’, de ‘educação para o respeito pela matéria, pela memória, pela história’. Nada se joga fora, tudo se conserva e se decifra, porque por trás de cada achado há ‘o fôlego de uma época, o sentido de uma fé, o silêncio de uma oração. É um olhar — sublinha o Papa — que pode ensinar muito também à pastoral e à catequese de hoje’.

A arqueologia aliada da teologia

Com o suporte de instrumentos tecnológicos cada vez mais refinados, mesmo materiais considerados irrelevantes podem revelar sentidos profundos. ‘A arqueologia é também uma escola de esperança.’ Leão XIV recorda que, segundo a Constituição Apostólica Veritatis gaudium, a arqueologia, junto com a História da Igreja e a Patrologia, deve integrar as disciplinas fundamentais da formação teológica. A arqueologia não fala apenas de coisas, mas de pessoas; ajuda a compreender ‘como a revelação se encarnou na história, como o Evangelho encontrou palavras e formas dentro das culturas’. Assim, uma teologia que acolhe a arqueologia ‘escuta o corpo da Igreja, interroga suas feridas, lê seus sinais, deixa-se tocar por sua história’. É também uma forma de caridade : ‘um modo de fazer falar os silêncios da história, devolver dignidade a quem foi esquecido, trazer à luz a santidade anônima de tantos fiéis que construíram a Igreja’.

A missão evangelizadora

É também tarefa da arqueologia ajudar a Igreja a guardar viva a memória dos seus inícios, narrar a história da salvação também com imagens, formas e espaços. ‘Em um tempo que frequentemente perde as raízes, a arqueologia — afirma o Papa — torna-se instrumento precioso de uma evangelização que parte da verdade da história para abrir à esperança cristã e à novidade do Espírito.’ Ao olhar para o modo como o Evangelho foi acolhido no passado, a arqueologia impulsiona seu anúncio hoje, ajudando a alcançar os distantes e os jovens que buscam autenticidade. A arqueologia, destaca Leão XIV, é um ‘poderoso instrumento de diálogo; pode construir pontes entre mundos distantes, culturas diferentes, gerações; pode testemunhar que a fé cristã nunca foi uma realidade fechada, mas uma força dinâmica’.

Memória viva e reconciliada

Outra força da arqueologia é fazer perceber o vigor de uma existência que atravessa os séculos, ultrapassa a matéria e possui relevância específica na teologia da Revelação. Ela ilumina textos com testemunhos materiais, interroga fontes, completa-as e abre novas questões. Assim, uma teologia fiel à Revelação ‘deve — para o Papa — permanecer aberta à complexidade da história’, feita de desafios, conflitos, momentos de luz e escuridão. Cada aprofundamento do mistério da Igreja é um retorno às origens : não um culto ao passado, mas ‘memória viva’, ‘capacidade de fazer o passado falar ao presente’, discernindo o que o Espírito Santo suscitou na história. Isso gera ‘uma memória reconciliada’, capaz de reconhecer pluralidade e unidade na diversidade, tornando-se ‘lugar de escuta, espaço de diálogo, instrumento de discernimento’.

Não um saber elitista

O Papa recorda que o Pontifício Instituto de Arqueologia Cristã foi fundado em 1925 por Pio XI, no Jubileu da Paz; agora o centenário ocorre no Jubileu da Esperança — coincidência que abre horizontes para uma humanidade ferida por guerras. A fundação ocorreu em clima incerto, mas com coragem e visão. Ser fiel ao espírito fundador significa não fechar-se em um saber elitista, mas ‘compartilhar, divulgar, envolver’. Essencial, portanto, a comunhão com outras instituições dedicadas à arqueologia, como a Pontifícia Academia Romana de Arqueologia, a Pontifícia Comissão de Arqueologia Sacra e a Pontifícia Academia Cultorum Martyrum. Também com o Oriente cristão a arqueologia é terreno fecundo : catacumbas comuns, igrejas compartilhadas, práticas litúrgicas análogas, martirológios convergentes — patrimônios que devem ser valorizados conjuntamente.

Ministério de esperança

‘A Igreja é chamada a educar para a memória, e a arqueologia cristã é um dos seus instrumentos mais nobres. Não para refugiar-se no passado, mas para habitar o presente com consciência, construindo o futuro com raízes.’ A arqueologia, portanto, ‘é um ministério de esperança’, porque mostra que ‘a fé resistiu às perseguições, às crises, às mudanças’, renovando-se, reinventando-se, florescendo. ‘O Evangelho sempre teve uma força geradora’, e a esperança jamais falhou. Por fim, o Papa exorta à continuidade desse trabalho precioso, rigoroso, transmitido com paixão. ‘A arqueologia cristã é um serviço, uma vocação, uma forma de amor pela Igreja e pela humanidade. Sede fiéis ao sentido profundo do vosso compromisso : tornar visível o Verbo da vida, testemunhar que Deus se fez carne, que a salvação deixou marcas, que o Mistério se fez narrativa histórica.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2025-12/papa-leao-xiv-carta-apostolica-arqueologia-crista-11-12-2025.html

sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

'Reconstruir a Casa do Senhor. Uma Igreja sem contraposições' – Segunda Pregação do Advento de 2025

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Isabella Piro



De que unidade devemos dar testemunho? E como oferecer ao mundo uma comunhão crível que não seja, genericamente, fraternidade? Estas foram as principais questões propostas na segunda de três meditações do Advento proferidas pelo Pe. Roberto Pasolini, pregador da Casa Pontifícia. O frade menor capuchinho propôs-as a Leão XIV e aos seus colaboradores da Cúria Romana na manhã desta sexta-feira, 12 de dezembro, na Sala Paulo VI. O tema escolhido para as três reflexões é: ""Aguardando e apressando a vinda do dia de Deus".


A Torre de Babel e o medo da dispersão

 

Após a primeira meditação de 5 de dezembro, dedicada à "Parusia do Senhor", nesta sexta-feira o Pe. Pasolini articulou sua reflexão em torno de três imagens: a Torre de Babel, o Pentecostes e a reconstrução do Templo de Jerusalém. A primeira imagem — a de uma cidade fortificada e uma torre imponente — é o emblema de uma família humana que, após o dilúvio, busca exorcizar "o medo da dispersão". Mas tal projeto esconde "uma lógica mortal", já que a unidade é buscada "não pela reconciliação das diferenças, mas pela uniformidade".

 

O pensamento único do totalitarismo do Século XX

 

"É o sonho de um mundo onde ninguém é diferente, ninguém corre risco, tudo é previsível", observou o padre Pasolini, tanto que a torre é construída não com pedras irregulares, mas com tijolos idênticos entre eles. O resultado é, sim, a unanimidade, mas uma unanimidade aparente e ilusória, porque "é alcançada ao custo da eliminação das vozes individuais".

A partir daí, o pensamento do pregador volta-se para os tempos modernos e contemporâneos, nomeadamente, para os totalitarismos do século XX que impuseram o "pensamento único", silenciando e perseguindo a dissidência. Mas "cada vez que a unidade é construída suprimindo as diferenças - acrescentou - o resultado não é a comunhão, mas a morte".

 

O consenso rápido das redes sociais e da IA

 

Também hoje, "na era das redes sociais e da inteligência artificial", os riscos da padronização não faltam, antes pelo contrário; surgem em novas formas, em que os algoritmos criam "bolhas de informação" unívocas, esquemas previsíveis que reduzem a complexidade humana em um padrão, plataformas que visam o consenso rápido, penalizando a "dissidência reflexiva".

Trata-se de uma tentação que "não poupa sequer a Igreja", explicou o capuchinho, recordando as muitas vezes ao longo da história em que a unidade da fé foi confundida com uniformidade, em detrimento do "ritmo lento da comunhão que não teme o confronto e não apaga as nuances".


A diferença é a gramática da existência

 

Um mundo construído sobre a utopia de cópias idênticas, continuou o sacerdote, "é a antítese da criação", porque "Deus cria separando, distinguindo, diferenciando" a luz das trevas, as águas da terra, o dia da noite. Nesse sentido, "a diferença é a própria gramática da existência", e rejeitá-la significa inverter "o impulso criador" em busca de uma falsa segurança que é, na verdade, "uma rejeição da liberdade".

 

Deus restaura a dignidade às singularidades

 

A confusão de línguas com que Deus responde à Torre de Babel, portanto, não é uma punição, mas sim "uma cura", enfatizou o pregador da Casa Pontifícia: o Senhor "restitui a dignidade às singularidades", dando novamente à humanidade "o bem mais precioso", ou seja, "a possibilidade de não sermos todos iguais". Porque "não existe comunhão sem diferença".

 

Pentecostes, emblema da comunhão

 

A segunda imagem é a de Pentecostes, o emblema da comunhão apesar da ausência de uniformidade. Os apóstolos falam a sua própria língua, e os ouvintes a compreendem na sua, porque "a diversidade permanece, mas não divide"; as diferenças não são eliminadas para criar unidade, mas transformadas "no tecido de uma comunhão mais ampla".

 

A renovação da Igreja, uma necessidade perene

 

O padre Pasolini ilustrou então a terceira imagem: o Templo de Jerusalém, destruído e reconstruído muitas vezes. Cada reconstrução, explicou ele, "nunca pode ser um caminho linear", porque a compô-la serão "entusiasmos e lágrimas, novos impulsos e arrependimentos profundos". Tudo isso é "um precioso compêndio" para compreender "a perene necessidade" de renovação da Igreja, bem encarnada por São Francisco de Assis.

A Igreja, de fato, é chamada a permitir-se ser continuamente reconstruída para revelar "a beleza do Evangelho", permanecendo fiel a si mesma e, ao mesmo tempo, continuando a "colocar-se a serviço do mundo".

 

Acolher a variedade, não apagá-la

 

Longe de ser "uma necessidade extraordinária", enfatizou o padre Pasolini, a renovação eclesial é "a atitude ordinária" da Igreja fiel ao mandato apostólico e, sobretudo, não é uniformidade, nem "uma obra pacífica". A Igreja que se renova, de fato, é aquela capaz de "acolher a diversidade" e capaz  de "um combate espiritual autêntico", livre dos "atalhos de puro conservadorismo e de inovação acrítica". Porque a comunhão nunca é "um sentimento homogêneo", nem uma recíproca eliminação, mas antes um lugar de "escuta recíproca". Só assim, de fato, "a Igreja pode verdadeiramente voltar a ser o lar de todos".

 

O Concílio Vaticano II e a "Primavera do Espírito"

 

Uma última reflexão do padre Pasolini foi dedicada ao Concílio Vaticano II: sessenta anos após, a grande assembleia , frequentemente descrita como a "primavera do Espírito", emerge quer "um declínio das práticas, dos números e das estruturas históricas da vida cristã" quanto um novo fermento do Espírito, evidenciado pela "centralidade da Palavra de Deus", por um laicato "mais livre e mais missionário", por "um caminho sinodal" que se tornou uma "forma necessária" e por um cristianismo que "floresce em muitas regiões do mundo".

 

Retornar ao coração do Evangelho

 

O declínio, explicou o pregador, torna-se decadência se a Igreja perde a "consciência da própria natureza sacramental e se percebe como uma organização social", reduzindo a fé à ética, a liturgia à performance e a vida cristã a moralismo.

Em vez disso, para além de posições ideológicas, como o tradicionalismo e o progressivo, o declínio pode se tornar "um tempo de graça" no momento em que a Igreja retorna "ao coração do Evangelho", distanciando-se de "estratégias" humanas, de "contraposições que dividem e tornam estéril cada diálogo", bem como de "soluções imediatas e fáceis".

 

A Igreja, dom a ser protegido e serviço

 

Em última análise, concluiu o padre Pasolini, a Igreja não é algo a ser edificado segundo critérios humanos, mas é "um dom a ser recebido, protegido e servido" com gestos humildes, dia após dia, cada um com um fragmento de fidelidade e caridade. O pregador da Casa Pontifícia concluiu então sua reflexão com uma oração ao Senhor para que "o povo dos fiéis possa sempre progredir na construção da Jerusalém celeste".

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2025-12/segunda-pregacao-advento

terça-feira, 9 de dezembro de 2025

Francisco de Assis ensina: quem reza, serve!

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Frei Augusto Luiz Gabriel, ofm


‘A oração sempre ocupou lugar central na vida cristã, não apenas como devoção, mas como fonte que sustenta e inspira todas as escolhas e ações do discípulo. Desde os antigos mestres espirituais, passando pela experiência de Santo Afonso de Ligório, aprendemos que rezar é reconhecer que ‘sem mim nada podeis fazer’ e pedir o dom do Espírito para viver segundo o Evangelho. São Francisco de Assis é testemunha luminosa dessa verdade : sua profunda vida de oração, feita de silêncio, louvor, escuta e entrega, tornou-se ação concreta, serviço humilde, cuidado dos pequenos e reconstrução da vida dos que sofrem. Por isso, a oração cristã não permanece apenas na interioridade; ela abre o coração, purifica a intenção e conduz ao compromisso real com o Reino de Deus.

Orar é elevar a mente e o coração a Deus, confiando inteiramente na sua graça. Não se trata de um gesto isolado de devoção, mas da fonte que orienta toda ação cristã. Desde os antigos mestres, como Hugo de São Vítor, e conforme a tradição bíblica do Livro da Sabedoria, entende-se que a oração é o caminho pelo qual se recebe a sabedoria e o Espírito : ‘Invoquei o Senhor, e veio a mim o espírito da sabedoria.’ Hugo recorda que, sem o auxílio divino, a iniciativa humana é insuficiente. A oração, portanto, é o acesso à filiação divina e nos torna capazes de pedir e viver o dom do Espírito. Santo Afonso reforça essa verdade a partir do mandato de Cristo : ‘Sem mim nada podeis fazer’. A oração não é um adorno religioso, mas a respiração da vida cristã. Quem reza com sinceridade e constância pede, antes de tudo, o dom do Espírito, e desse encontro nascem a fé, a esperança e a caridade autênticas.

A oração genuína, porém, não se limita ao interior : ela transforma e encaminha para o serviço. Enzo Bianchi e a tradição litúrgica lembram que a liturgia é ‘parusia antecipada’, sinal do Reino que já vem ao encontro do povo. O ministro, o celebrante e todo cristão só podem comunicar aquilo que carregam no coração : ‘Se você não estiver evangelizado, não poderá evangelizar; se a Palavra não mora em você, não poderá comunicá-la à assembleia.’ São Carlos Borromeu aconselhava os ministros : ‘Se você administra os sacramentos, medite no que está fazendo. Se celebra a missa, medite no que está oferecendo. Se recita os salmos, medite a quem e do que está falando.’ A regra é clara : a liturgia molda o coração para a caridade; a oração prepara e orienta a ação sacramental e pastoral. Orar e celebrar é preparar-se para servir e levar à vida aquilo que a Palavra e os sacramentos suscitam.

A vida de São Francisco de Assis ilumina essa união inseparável entre contemplação e serviço. Seu Cântico das Criaturas, sua oração diante do crucifixo e sua intimidade com Deus revelam uma espiritualidade que transforma tudo em compaixão e prática solidária. Na prece diante do crucifixo — ‘Altíssimo, glorioso Deus, ilumina as trevas do meu coração. Dá-me fé reta, esperança certa e caridade perfeita. Dá-me, Senhor, senso e discernimento para que eu cumpra o teu santo e verdadeiro mandamento’ — Francisco mostra a prioridade da vida cristã : pedir a graça para viver o Evangelho. Ele viu a criação como ‘um grande coro de onde brota contínua oração’ e fez da atenção aos pobres a consequência necessária dessa experiência contemplativa. Para ele, a oração que não gera partilha não é conforme ao Evangelho : a verdadeira espiritualidade conduz ao encontro dos pequenos, ao cuidado dos leprosos, à partilha do alimento, à presença junto aos marginalizados. A caridade é o fruto visível da alma que reza.

Praticar a fé significa, portanto, transformar a contemplação em gestos cotidianos : cultivar a Palavra, estudá-la, meditá-la, deixá-la moldar o coração; buscar a reconciliação com Deus e com os irmãos; ajudar os necessitados com partilha e presença; oferecer escuta; promover a comunhão. A Eucaristia, centro da vida cristã, recorda esse movimento : alimentar-se do Corpo do Senhor é assumir a responsabilidade de levar alimento e dignidade aos famintos. A espiritualidade franciscana sublinha que solidariedade é prática de amor : viver a destinação universal dos bens, a fraternidade e a partilha como escolhas diárias. ‘O que eu tenho, eu dou’ resume a decisão de não viver para si, mas para quem precisa.

Há, portanto, um caminho claro : a oração nos dá o Espírito; o Espírito fecunda a fé; a fé se traduz em obras de amor. Tal percurso exige humildade — ser sinal pobre de Cristo — e coerência litúrgica : a celebração não é espetáculo, mas gesto formativo que converte. Quem preside, canta ou reza os ofícios deve fazê-lo com atenção e reverência, consciente de que a liturgia possui força evangelizadora quando é vivida em adoração. Ao mesmo tempo, a prática cristã é profética : uma espiritualidade que não promove transformação social nem se compromete com a justiça permanece mutilada. A fé que salva é a que humaniza, denuncia injustiças, reconstrói e liberta.

Concluímos com o mesmo espírito de Francisco, que inspirou gerações : oração e ação são duas faces da mesma vocação. Como escreveu o Poverello pouco antes de morrer : ‘Irmãos, até agora pouco ou nada fizemos; vamos recomeçar!’ Recomeçar na oração, que desarma o ego e prepara o coração; recomeçar na caridade, que torna crível a Palavra de Deus. Orar e praticar é viver a fé como caminho de amor — nas pequenas ações, nas decisões corajosas, na partilha cotidiana — até que o mundo reconheça, em nós, o rosto misericordioso de Deus.

Paz e Bem!

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/francisco-de-assis-ensina-quem-reza-serve.html

domingo, 7 de dezembro de 2025

O terremoto das migrações

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo do Padre Alfredo J. Gonçalves, CS

 

Acompanhamos perplexos uma escalada mundial da violência. Violência intra e intercontinental que se reflete seja nos governos e formas de oposição, seja nos governos locais. Tampouco ficam imunes as mais diversas instâncias e instituições da sociedade. Semelhante avanço da violência vem mexendo de maneira convulsiva com os ‘formigueiros humanos’. Com efeito, o modus vivendi de comunidades originárias, de povos, nações e culturas vem sendo fortemente sacudido ao redor do planeta. Resultado disso é a dispersão dos migrantes, tais como aves de arribação. A chamada transição paradigmática, de que tanto se tem falado, move as placas tectônicas da política econômica em termos nacionais, regionais e internacionais. É inegável que esse movimento subterrâneo provoca terremotos e tsunamis que, novamente, devastam os ‘formigueiros humanos’, colocando em fuga as formigas, aos milhares e milhões.

O modo de vida e a identidade de grupos inteiros são abalados desde a raiz, o que compromete as bases, os valores e os fundamentos tradicionalmente positivos. Migrantes isolados e/ou com suas famílias cruzam e atravessam fronteiras. Com grande dificuldade, atravessam mares, desertos e florestas para bater às portas de territórios diferentes. Chegam, em geral, cansados e abatidos, feridos e fragmentados. Pessoas e famílias se desfiguram e se desintegram pelo caminho, às vezes para não mais se encontrarem na tão sonhada e ansiada reunificação. As ‘formigas’ dificilmente têm a possibilidade de retornar ao formigueiro (abandonado às pressas no caso dos refugiados), para recriar o modus vivendi de seus antepassados. Milhões e milhões de pessoas vagueiam de cá para lá e de lá para cá, na vã tentativa de encontrar um refúgio seguro. Um solo a que se possa dar o nome de pátria parece cada vez mais distante.

Os abalos sísmicos, porém, tendem a desencadear tragédias climáticas sempre mais extremas e catastróficas. Novos formigueiros são abalados e desmantelados. Novas correntes migratórias se põem em marcha. Cresce progressivamente o número de pessoas sem raiz, sem rumo e sem horizonte. Os processos migratórios não se deixam classificar atualmente por uma origem e destino mais ou menos predeterminados, como ocorreu nas chamadas migrações históricas. Enquanto a origem segue sendo a terra natal, evidentemente, o destino se revela cada vez mais incerto, inseguro e inquietante. Nos dias de hoje, prevalecem, ao invés, a indignação e a impotência. Por toda parte. Multiplicam-se os adjetivos e expressões precedidos pelo prefixo negativo ‘in’, equivalente a um ‘não’. Resta uma certa esperança de que quando esse prefixo se acumula, dos subterrâneos emerge dialeticamente um ‘sim’, de acordo com o pensamento filosófico de Hegel.

Do ponto de vista das forças de esquerda, esse novo ‘sim’ consiste em um tremendo e gigantesco ‘não’. O efeito positivo do que podemos chamar mundo moderno ou modernidade reveste-se de uma marca registrada cunhada pela razão, a ciência e a tecnologia, bem como pelo progresso e pela democracia. Neste momento de mudança de época (não apenas época de mudanças), o que resulta da dialética hegeliana representa um ‘sim’ com sabor amargo de ‘não’. Consiste numa tentativa da extrema direita de usar os canais, instrumentos e mecanismos democráticos para instalar um autoritarismo populista que parecia morto e definitivamente enterrado. Não seria exagero falar de um imperialismo da economia globalizada. Imperialismo de mercado e de poder, contemporaneamente centrífugo e centrípeto. Centrífugo quanto à dispersão das unidades de produção e ao consumo generalizado, centrípeto no que diz respeito à tomada de decisões e à formação de megafusões e conglomerados hegemônicos para as fatias mais rentáveis do processo de produção, como petróleo, telecomunicações, aviação, metais preciosos, entre outras.

De tal maneira que, enquanto as nações mais poderosas ensaiam atritos, rivalidades e até mesmo conflitos bélicos (tendo o cuidado de exportar a guerra aberta para os países periféricos), globalmente o mercado se apresenta muito bem articulado. Exemplo : ao mesmo tempo que, do ponto de vista político, se verifica uma disputa cerrada pela hegemonia política e econômica planetária, desde o ponto de vista econômico, Estados Unidos e China seguem com seus acordos comerciais através desses oligopólios de empresas transnacionais. Numa expressão apocalíptica, semelhante ao imperialismo de mercado total, se converte em uma espécie de dragão de sete cabeças (coincidência com o G7?), onde qualquer uma delas pode assumir o controle global. O combate a essa besta fera passa, simultaneamente, por ações locais e por articulações globais. O desafio gigantesco é justamente equilibrar umas e outras.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://migramundo.com/o-terremoto-das-migracoes/