Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo da redação da Aleteia
‘O discernimento da vocação
exige o confronto pessoal e a percepção mais profunda de si. Quem se sente
confuso, deve buscar ajuda em pessoas sólidas, que tenham boa formação. Isso
para realizar um trabalho de organização interna, pelo qual se criam as condições
de enxergar mais profundamente dentro de si.
Para o cristão, o discernimento
implica ainda a oração, a relação de intimidade com Deus. Cada pessoa é chamada
(vocação vem do latim ‘vocare’ – chamar) por Deus a ter uma vida
realizada e plena.
Definição
A definição mais simples de
vocação é : chamado. Trata-se de um chamado a um estado de vida. Mas,
primeiramente, é o chamado de Deus despertando para a própria vida.
Tomar consciência de que a
vocação é um chamado de Deus à vida deve levar à percepção de como se vive este
chamado, esta vida que lhe foi dada não só como dádiva, mas também como
incumbência; não só como dom, mas como tarefa. Ou seja, como você vai
desenvolver esta vocação, este chamado que recebeu na sua concepção.
Vocação é algo diferente de aptidão.
As aptidões definem, por exemplo, a profissão de uma pessoa. Já a vocação
define um estado de vida. Isso significa que o chamado da vocação ocorre num
nível mais profundo dentro de nós : o existencial. Não é só o psicológico. Ou
seja, ele é mais abrangente, porque compreende um todo : a pessoa em sua
realidade física, psíquica e espiritual.
Hoje as pessoas têm muita
dificuldade de perceber a sua vocação fundamental, ou seja, se vão se casar ou
ser consagradas. Isso porque elas têm dificuldade de se perceber na sua própria
vida, na sua própria existência. Sendo assim, fica ainda mais difícil perceber
como vão se desenvolver.
Por exemplo, se a pessoa quer
discernir se o chamado dela é viver a vida celibatária, ela tem de conhecer a
sua realidade física, enquanto necessidades, enquanto manifestações.
É preciso também ter
consciência da realidade psicológica, no sentido do seu desenvolvimento, ou
seja, se existe o chamado a querer viver um relacionamento específico com
alguém, ou o chamado a viver a afetividade de uma forma geral, na partilha com
todos.
Confrontação
O sentido espiritual é outro
elemento. Em Mateus 19, lemos : ‘aqueles que se tornaram eunucos livremente
por causa do Reino’. Isso quer dizer que, por causa do Reino, no sentido
mais profundo, espiritual, quer-se viver a vida exclusiva de intimidade, de
amor e de serviço a Deus. Quem está nessa condição vai abraçar a vida
consagrada. Já para a vida conjugal, é necessário o discernimento para ver se
existe a disposição interior de dividir a sua vida com alguém, de forma
exclusiva.
O discernimento sincero da
vocação só acontece a partir do momento em que a pessoa se dispõe a se
confrontar. O ser humano só se conhece quando se confronta. Quando não há essa
confrontação, acaba-se correndo o risco de se enganar e se iludir. Para o
cristão, a oração é algo fundamental nesse processo.
A confrontação implica estar
atento no seu dia-a-dia, dando passos concretos em direção àquilo que, em
princípio, se sente chamado. Ou seja, é preciso enfrentar as realidades que
existem dentro de nós. Porque a partir do momento em que há o confronto e o
enfrentamento interior, vai-se descobrindo se tem ou não a disposição interna
para viver aquela realidade.
Para se criar de forma
confiável o espaço do confronto pessoal no discernimento vocacional, é
necessário buscar o conhecimento em pessoas sólidas, que tenham boa formação. E
também realizar um trabalho pessoal.
Se a pessoa percebe que precisa
de orientação, deve ir atrás disso. Se percebe que precisa de um trabalho para
se organizar internamente, que o faça. Isso para aprender a lidar com algumas
questões que muitas vezes são simples de ser organizadas. E a partir do momento
em que há uma organização interna, criam-se as condições para enxergar mais
profundamente dentro de si.
Amadurecimento
É preciso dar passos efetivos,
concretos, em busca, na direção do discernimento. E não achar simplesmente : ‘ok,
eu quero ser padre, ou, eu quero me casar, agora deixa eu ver o que vai
acontecer’. Não. Tem de lutar. É um processo inclusive de luta.
O amadurecimento vai
acontecendo ao longo da minha vida exatamente na proporção em que eu me coloco
nessa vida, à medida que eu vou me lançando nessa vida. Privar-se, seja por não
querer sofrer, ou por achar que será muito difícil, detém o amadurecimento. As
pessoas brecam o seu desenvolvimento quando dizem : ‘não, não quero mexer
nisso’, ‘isso vai ser muito difícil’…
Para o cristão e para aqueles
que estão discernindo a vocação à vida consagrada, a oração é um pano de fundo
muito importante. Ela permeia o sucesso da vocação. É preciso colocar-se diante
de Deus, em uma relação diária de intimidade, com coragem de perguntar o que
Ele quer para nossa vida. Só assim as coisas se clareiam. A relação diária de
intimidade com Deus é o que sustenta a vida consagrada.
A vocação nunca deve ser
imposta. Quem está ao lado deve acompanhar, respeitando muito. Impor a vocação
tende a gerar frustrações. Já a realização da vocação é uma forma muito
garantida de ser feliz.
Quem acompanha alguém que
esteja discernindo a sua vocação deve atuar como um sinalizador, ajudando nesse
processo, mas absolutamente sem impor nada. Nunca dizer : ‘olha, eu acho que
a sua vocação é esta; pode ir tranquilo que eu tenho certeza que a sua vocação
é ser padre!’ De jeito nenhum. Você tem de ir vendo os sinais e, à medida
que a pessoa vai emitindo aqueles sinais, você pode ajudá-la a perceber isso
mais claramente, e o que ela pode fazer, o direcionamento que pode dar àquilo
que está despontando dentro dela.
Problema da imposição
Impor a vocação gera pessoas
frustradas. É tão arrasador você impor um destino a alguém, seja uma vocação a
um estado de vida, seja uma profissão. Eu conheci um rapaz que o pai o obrigou
a fazer uma faculdade de Administração de Empresas. Ele era músico e queria fazer
uma faculdade de música. Mas aí o pai o obrigou. Ele fez. No dia da formatura
ele entregou o diploma ao pai e disse : ‘este aqui é seu; agora eu vou fazer
o que eu quero’. E realmente foi e fez. Hoje ele vive da música.
Quem vive um momento de
confusão e incerteza deve buscar ajuda profissional. Se a pessoa não percebe a
si mesma, como é que vai perceber a sua vocação, as suas aptidões? Fica bem
difícil. Por isso, se você quer fazer um caminho sério, se você quer realmente
descobrir o seu chamado, as suas aptidões, se você não está tendo clareza, mas
dificuldades, que não tenha medo de buscar ajuda. Não tome isso como um
problema, mas como um desafio, independente da idade.
Hoje, por exemplo, há uma
grande confusão com o mundo virtual. Criam-se outros ‘eus’, os ‘eus’
virtuais. Isso pode confundir ainda mais na busca, especialmente quando o ‘eu’
virtual não tem nada a ver com o ‘eu’ real.
Realizar a própria vocação é
uma dimensão fundamental da vida. Quando uma pessoa realiza sua vocação, ela
realiza o sentido da vida. É alguém que vai estar sempre ali de bem com a vida,
feliz. Não se diz que o que o ser humano mais busca é a felicidade? Então, é
uma forma muito garantida de ser feliz. Muito garantida.’
Fonte : *Artigo
na íntegra https://pt.aleteia.org/2021/07/11/como-discernir-a-minha-vocacao/?fbclid=IwAR2tQlHM53QHJUEQ1JySwe1ip2vd8l54TINSiyhMpDiRd6tWtA5aocQ7pYY
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