*Artigo
de Evaldo D´Assumpção,
médico
e escritor
‘Os Vândalos eram
uma tribo de origem germânica, que durante o século V invadiu o Império Romano
e instalou-se em Cartago, no norte da África. No ano 455 atacaram e saquearam
Roma, ali destruindo importantíssimas obras de arte que se perderam para
sempre. Inspirado nesse brutal acontecimento, surgiu o nome ‘vandalismo’ para definir as ações
irracionais de depredação de bens públicos ou privados, pelo simples prazer de
destruir. Esse termo foi usado pela primeira vez em 1794, pelo bispo Henri
Grégoire da comuna francesa de Blois, às margens do rio Loire, para denunciar a
destruição de monumentos, pinturas e livros durante a Revolução Francesa. E
firmou-se na história pelo envolvimento do pintor Coubert (1871), liderando a
destruição da Coluna Vendôme, em Paris, que considerava símbolo da detestada
autoridade napoleônica. Foi possível reconstruí-la posteriormente, sendo hoje
um dos marcos da capital francesa.
Séculos se
passaram, a humanidade progride admiravelmente em alguns aspectos, mas
frequentemente comporta-se como os Vândalos do século V. Na segunda guerra
mundial, obras históricas de arte forma roubadas ou destruídas pelos nazistas
de museus europeus. Já em pleno século XXI, assistiu-se a destruição das
estátuas de Buda do século IV, pelos talibãs, em 2001, e a destruição da parte
antiga de Palmira, cidade síria fundada no período Neolítico, e violentada em
2015 pelos bárbaros do Exército Islâmico.
Mas os novos
vândalos continuam em atividade, também em território brasileiro. Basta
caminhar pelas capitais e cidades do interior, para encontrarmos monumentos e
construções históricas vandalizadas por grafiteiros, parcialmente destruídas
por arruaceiros, tudo sob o olhar complacente de nossas autoridades que falam
muito, mas agem pouco, e com tal brandura que cada ação destrutiva realizada
impunimente se torna um incentivo aos novos bárbaros, que numa prática imbecil
de emulação, suja mais, destrói mais, para superar os bandos rivais, em busca
de sórdidas vanglórias.
Nem as
propriedades privadas ficam livres desses depredadores. Carros são arranhados,
suas peças externas são arrancadas, casas são mutiladas, lugar algum está a
salvo desses bandidos. O mais deplorável é verificar que nem sempre se trata de
gente ignorante, de baixo nível cultural ou econômico, sendo, com frequência
identificadas como pessoas cujo estado social e cultural fazia supor que jamais
fossem capazes de tais barbáries. Basta entrar em campus universitários para
descobrir, em suas diversas instalações, a ação nefasta desses indivíduos.
Banheiros imundos, instalações hidráulicas quebradas, paredes rabiscadas,
equipamentos roubados, nos levando a questionar que profissionais estão sendo
formados em nossas universidades.
Com os desmandos
políticos que arrasam o país de ponta a ponta, surgem os mais do que justos
movimentos populares de protesto, que reúnem milhares de pessoas nas ruas e
praças denunciando, em alta voz, a corrupção instalada nos diferentes poderes
da nação. Os que legitimamente participam desses movimentos, os conduzem com
objetividade, seriedade e respeito aos direitos alheios. Contudo, a eles se
misturam os vândalos, que na covardia que os caracteriza, escondem-se sob máscaras
para ocultá-los com suas intenções malévolas.
Aproveitando-se
das multidões, partem para as depredações, quebram vitrines, arrombam lojas,
saqueiam-nas, tal e qual fizeram os Vândalos da história, nas ruas de Roma.
Instrumentalizados e manipulados por grupos políticos que pouco se importam com
a crise econômica e administrativa que assola o Brasil, tentam ampliar o caos e
dele tirar proveito pessoal, roubando a varejo, enquanto seus mentores
disfarçam seus roubos no atacado.
O vandalismo não
tem limites. É praga daninha que contamina tudo em redor. Os estádios de
futebol, lugar de diversão para a grande maioria dos brasileiros, hoje são
campos de batalha onde só os temerários ou os apaixonados pelos seus clubes, se
arriscam ir. Os bárbaros se infiltram entre eles, disfarçados em torcidas
organizadas, e aproveitam as circunstâncias para extravasar sua imbecilidade
sanguinária. O resultado se vê na mídia do dia seguinte, com os graves
prejuízos para os clubes, torcedores gravemente feridos e até mortos, e como em
todas as demais situações, muita revolta, muito pranto, mas nenhuma justiça,
nenhuma punição exemplar. Afinal, vivemos hoje os tempos aziagos do ‘é proibido proibir’, da cômoda presunção
da inocência de todos, dos defensores de porta de distrito, sempre ágeis em
tirar proveito pecuniário do vandalismo que nada nem a ninguém respeita.
Tudo isso me faz
lembrar do colégio Loyola, que me ensinou, e a meus colegas, respeito aos pais,
aos professores, às outras pessoas, e à coisa pública, mas também o latim, com
o protesto de Cícero contra Catilina, no senado romano (séc. I aC) : ‘Quousque tandem, Catilina, abutere patientia
nostra?’ (Até quando, Catilina,
abusarás da nossa paciência?).’
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